A anarquia do flamenco segundo Israel Galván
É considerado um dos grandes inovadores do flamenco. Apresenta este sábado no Rivoli, no Porto, o espectáculo Fla.Co.Men, em que o seu corpo funciona como um instrumento.
Israel Galván dança desde que se lembra de existir. “Dançava sem motivo porque pensava que dançar era o normal.” Nada é por acaso: é filho de dois bailadores sevilhanos, José Galván e Eugenia de los Reyes, que o puxavam para cima do palco tinha ele apenas dois anos. “Dançava como se fosse um jogo, em vez do futebol”, diz ao PÚBLICO.
Hoje, aos quarenta, é considerado um dos grandes inovadores do flamenco. Este sábado, às 19h, apresenta no Teatro Municipal Rivoli, no Porto, o espectáculo Fla.Co.Men, que lhe tem valido uma digressão intensa pela Europa, do Théâtre de la Ville, em Paris, ao Sadler’s Wells, em Londres (no ano passado passou também pelo Centro Cultural de Belém, em Lisboa).
Fla.Co.Men começou a ser germinado “a partir de um cocktail” de todos os seus espectáculos, explica o bailarino, que, além das criações a solo – que tanto se debruçaram sobre autores como Franz Kafka como olharam para o genocídio de ciganos no Holocausto –, trabalhou também em conjunto com nomes de dentro e de fora do flamenco, como o coreógrafo Akram Khan. Apesar “das pontes com o passado”, Fla.Co.Men abriu “novas portas”. “Abriu um mundo novo e estranho, para mim e para as outras pessoas no projecto”, refere o criador. “Tivemos todos de nos acostumar.”
Israel Galván conduz o flamenco para terrenos mais experimentais, onde uma certa teatralização e uma desconstrução dos vocabulários do flamenco dialogam com as potencialidades percussivas do corpo – dos dedos das mãos aos pés, com o clássico zapateado. O corpo de Galván é um recreio de sons e ritmos, um instrumento por si só. Isso, mais os vários músicos e cantores presentes em palco, fazem de Fla.Co.Men uma peça de dança-concerto. Sem guião. “Quando não há nada numa obra é quando há um montão de coisas”, considera o bailarino.
O que mais lhe interessa é a liberdade para ir criando (“não sei fazer um espectáculo profissional, ele vai-se profissionalizando”) e a “liberdade de movimento”. Israel Galván faz questão de fazer as coisas à sua maneira, mas sem deixar de estabelecer ligações com o passado, sem deixar de se inspirar em bailarinos de flamenco que não ficaram para a história. “O flamenco que conhecemos melhor é mais linear, mais clássico, mas antes o flamenco era burlesco, mais grotesco, com corpos menos formatados, menos profissionais”, diz. “Eu acredito que não se pode perder a anarquia flamenca. O que é flamenco é a maneira de estar, o gesto. A partir daí moves-te como queres. Eu não tenho uma escola.”