Ordem tirou cédula a Quintino Aires, mas decisão está suspensa em tribunal

A Ordem dos Psicólogos tem o poder de tirar a cédula a um profissional. Mas esse poder pode ficar sem efeito durante vários anos até que tribunais decidam recursos.

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À Ordem dos Psicológicos Portugueses (OPP) já chegaram centenas de queixas contra o comentador. E nas petições online, que juntaram centenas de pessoas, há referências à TVI, estação de televisão do programa onde o psicólogo é convidado semanal. Em 2016, quando disse que a maioria dos elementos da comunidade cigana não trabalhavam e traficavam droga, os signatários consideraram que “todas as declarações de Quintino Aires são uma vergonha que deveria envergonhar o programa Você na TV e ao canal TVI”.

A TVI diz que “não tem conhecimento de qualquer processo deontológico ou judicial visando anular a inscrição do dr. Quintino Aires na Ordem dos Psicólogos” e reforça que o psicólogo “está inscrito, com inscrição em vigor” na ordem.

As queixas entregues na OPP, em vários momentos, foram analisadas pelo conselho jurisdicional da ordem, que instaurou, até agora, cinco processos a Quintino Aires. Um foi arquivado; dois resultaram em repreensões; um quarto deu origem a uma pena de suspensão por três meses, com retirada temporária da cédula profissional; e um quinto (relativo às declarações sobre a comunidade cigana) está ainda a decorrer. Contudo, até agora nenhuma das sanções se concretizou porque Quintino Aires recorreu da pena e o tribunal ainda não se pronunciou.

A ordem tem o poder de tirar a cédula a um profissional, confirma o gabinete de comunicação da OPP. E foi o que o fez, ao decretar a suspensão temporária de Quintino Aires. Este, contudo, apresentou recurso — um no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa e outro no Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra. “No fundo, a sanção está dependente da decisão do tribunal. Ainda não foi — e poderá ser ou não — decretada”, diz a mesma fonte.

Se for, será a primeira vez que uma pena deste tipo é decretada pela Ordem dos Psicólogos. E caso isso venha a acontecer, “durante o período de suspensão, o dr. Quintino Aires estará impedido de exercer psicologia e de praticar os actos próprios da profissão”, explica a mesma fonte.

Um dos processos que a ordem instaurou tem a ver com declarações de Quintino Aires em 2014, quando aconselhou duas mães a suspenderem a medicação prescrita aos filhos pelos pedopsiquiatras que os acompanhavam.

Numa entrevista à revista Sábado em Agosto de 2016, Quintino Aires justificou os processos instaurados com “outras questões relacionadas com as várias escolas de psicologia em Portugal”. E explicou: “Nós tiramos conclusões diferentes em função das escolas.” De resto, qualificou os processos de que estava a ser alvo como resultado de “um delito de opinião”.

Joaquim Quintino Aires é director clínico do Instituto Vegotsky, que tem uma clínica em Lisboa e outra no Porto, onde trabalham vários psicólogos e são oferecidos vários tipos de acompanhamento. O instituto é apresentado como um centro de referência de psicologia clínica relacional-histórica, fundamentada nas teorias de Lev Vegotsky, um psicólogo russo do final do século XIX e início do século XX. E tem, além das consultas nas clínicas, um projecto de psicoterapia nas escolas “para crianças e adolescentes com problemáticas que comprometem a sua adaptação e sucesso escolar”. Além disso, lê-se no site, o instituto “tem também como objectivo formar especialistas das áreas da Psicologia, da Psicoterapia, da Neuropsicologia, da Saúde e da Educação”.

As posições deste psicólogo “descredibilizam uma formação académica, uma profissão”, considera Carla Cruz, socióloga da Comunicação e professora no Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa. “Não validam o saber do psicólogo e deixam algumas pessoas a pensar que não devem procurar apoio psicólogo quando, na realidade, precisam dele.”

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