Situação acalmou. Incêndio de Pedrogão controlado e Góis a evoluir favoravelmente
Funeral de bombeiro em Castanheira de Pêra reuniu responsáveis políticos. Em Góis, populações de cinco aldeias evacuadas tiveram autorização para regressar.
Ontem foi o dia menos problemático desde sábado, quando deflagraram os incêndios de Pedrogão Grande, que causou 64 mortos, e Góis, que levou à evacuação de 27 aldeias. Ao final do dia, as chamas em Pedrogão tinham sido dadas como controladas e o incêndio de Góis, que chegou a ter cinco frentes activas, já só lavrava em duas, com as autoridades na expectativa de estas serem controladas nas últimas horas do dia.
No terreno, em Pedrogão, o comandante operacional Vítor Vaz Pinto deu o incêndio como controlado a meio da tarde. “O fogo não vai progredir mais do que já progrediu” assegurou. O responsável previa ainda “situações bastante complicadas” pela frente, mas garantia que as chamas estavam dominadas.
Para além da notícia do controlo do fogo, foi também dia do funeral de Gonçalo Conceição, o bombeiro de Castanheira de Pêra que morreu na segunda-feira. As cerimónias funebres do bombeiro ficaram marcadas pela comoção popular, entre silêncios e aplausos, mas também pela reunião de um significativo aparato político, com as mais altas figuras do Estado.
De Marcelo a António Costa, passando pelo presidente da Assembleia da República, Ferro Rodrigues. Da esquerda à direita, os líderes partidários também não faltaram: Jerónimo de Sousa, Catarina Martins, Pedro Passos Coelho e Assunção Cristas marcaram presença naquele conselho do distrito de Leiria.
Góis com melhores perspectivas
Ao final da tarde, o incêndio de Góis continuava a ser o que concentrava mais meios, apesar de ter perdido já dimensão de terça-feira para quarta-feira. De cinco frentes activas passou para duas, que se dirigiam aos concelhos de Arganil e Pampilhosa da Serra. No combate às chamas estavam 1100 operacionais (93 deles espanhóis), 350 veículos, sete máquinas arrastadoras e 16 meios aéreas, sendo um de coordenação.
A temperatura desceu em relação aos dias anteriores, mas o vento iam dando trabalho aos bombeiros, com reacendimentos esporádicos em vários pontos dos três concelhos. Isto num “perímetro muito grande que obriga a que haja muito desgaste” por parte dos operacionais que trabalham num terreno acidentado, afirmou o comandante das operações, Carlos Tavares, num dos pontos de situação que foi fazendo ao longo da tarde. No centro da vila, a evolução da situação fazia-se notar, com muito menos alvoroço em relação ao dia anterior.
O responsável apontava para o aumento da humidade no ar como um elemento positivo. “Espero que durante a noite consigamos dar a volta a estas duas frentes que têm estado a causar grande trabalho”, afirmou ao fim da tarde. No entanto, o comandante mantinha a perspectiva que anunciou de manhã: “vamos ver se vai ser possível controlar o incêndio hoje”. Carlos Tavares dizia que “o principal objectivo” é dar as duas frentes como controladas.
O incêndio de Góis fez ainda com que 37 pessoas tenham precisado de assistência. Entre eles estão dois feridos ligeiros (um bombeiro e um civil), que foram transportados para o hospital por precaução. ÀS 18h o bombeiro já tinha tido alta.
Marcelo passou também pelo centro de comando de operações em Góis, onde foi informado sobre o ponto de situação. Á saída, numa curta declaração aos jornalistas, o Presidente da República referiu que a acção dos aviões canadair estavam a produzir efeito na frente da Pampilhosa da Serra e disse esperar que, “com a descida da temperatura e o cair do vento a situação vá melhorando e consolidando”.
Os homens do Cadafaz
Ao final da manhã de quarta feira-feira, Cadafaz estava quase deserta, com excepção de alguns bombeiros e GNR no largo de entrada. A aldeia foi uma das 27 que foram evacuadas na terça-feira no concelho de Góis. Não que a quietude das ruas fosse muito diferente com a população toda lá, contam ao PÚBLICO José António e Carlos Alves ao balcão do café da União Recreativa do Cadafaz. De Inverno, a localidade tem 12 pessoas a viver.
Os dois fazem parte de um grupo de seis homens que ficaram para trás para salvar as casas, recusando-se a seguir as indicações das autoridades para abandonar a aldeia. Vão atenuando o calor com cerveja fresca, mas têm na roupa um misto de poeira com cinza e nos olhos uma expressão que mistura alívio com cansaço.
Quando por volta das 9 horas os militares da GNR retiraram a restante população, José António disse que se manteria na aldeia. Ficaram “por teimosia”, admite. “Disseram que a gente ficava por nossa conta, mas isso já a gente sabia.”.
O dia de terça-feira foi passado em sobressalto, tanto que perderam a conta às horas. Muitas foram as chamadas que receberam dos vizinhos, para saber como estavam as casas. Carlos Alves ainda foi trabalhar de manhã, mas depois fintou as autoridades para chegar ao Cadafaz e ajudar a salvaguardar as habitações. “Chegou a uma altura em que estava tudo cercado a toda a volta. Era ir ao fundo, ver como é que estava e voltar outra vez para cima”.
Não custa a acreditar. O Cadafaz podia ser um postal, com muitas das casas de xisto. Agora as ruas estão cheias de cinza, no ar há um cheiro intenso a madeira queimada, e a vegetação que cerca a aldeia está carbonizada. José António, a quem Carlos Alves chama “o comandante de operações”, conta que o combate às chamas foi feito com poucas mangueiras de rega, ramos e “alguns truques”. “À entrada da noite chegaram os bombeiros e já descansámos mais um bocadito”. Não ardeu nenhuma casa.
Cabreira e Corterredor também fazem parte do grupo de localidades evacuadas na terça-feira, mas onde também ficou gente a proteger o que é seu. Adelino Mota é do Corterredor e foi um dos que ficou. “Só saio daqui quando o lume me chegar aos calcanhares”, disse perante a ordem de saída. “A nossa sorte foi o vento e a chuva”. Um porque mudou de direcção, outro porque “amaciou” as chamas ao final da tarde.
Ao cair da noite, as populações de cinco aldeias tinham já recebido autorização para regressar a casa, afirmou o comandante Carlos Tavares. Cadafaz é uma delas. Quantos às restantes, o responsável disse que o processo estava a ser analisado em conjunto com a GNR para “conseguir colocar as pessoas em segurança”.