Morreu Helmut Kohl, o homem que uniu a Alemanha

Tinha uma visão e acreditava que só a união (de um país, de um continente) evitaria uma nova guerra. George Bush chamou-lhe o “maior líder europeu” da segunda metade do século XX.

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Helmut Kohl à frente de um poster da sua campanha, 1975 REUTERS
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Helmut Kohl após ter sido eleito chanceler da Alemanha, em 1982 BPA
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Helmut Kohl e o Presidente francês François Mitterrand dão as mãos durante uma homenagem aos mortos da Primeira Guerra Mundial, em 1984 REUTERS/Stringer
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Helmut Kohl com o antigo general alemão da Força Aérea Johannes Steinhoff no cemitério alemão para militares, em Bitburg, 1985 REUTERS/Larry Rubenstein
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O chanceler alemão Helmut Kohl acena de um tanque durante uma visita às tropas alemãs e britânicas no norte da Alemanha, em 1986 REUTERS/Michael Urban
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Helmut Kohl com a primeira-ministra britânica Margaret Thatcher durante a sua visita à Alemanha REUTERS/Stringer
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Helmut Kohl com a primeira-ministra da Grã-Bretanha, Margaret Thatcher, o Ministro dos Negócios Estrangeiros da Grã-Bretanha, Geoffrey Howe e o Presidente da França, François Mitterrand, durante uma cimeira da Comunidade Europeia em Hanover, 1988 REUTERS/Michael Urban
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1989 REUTERS/Michael Urban
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Helmut Kohl no meio de apoiantes do partido durante uma campanha, em 1990 REUTERS/Reinhard Krause
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Helmut Kohl durante uma manifestação eleitoral em Erfurt para as primeiras eleições livres na Alemanha Oriental, em 1990 REUTERS/Michael Urban
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O líder soviético Mikhail Gorbachev e Helmut Kohl trocam canetas após assinarem um contrato em Bona,1990 REUTERS/Michael Urban
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Helmut Kohl durante uma campanha em 1990 EPA
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Helmut Kohl e o político alemão do partido União Democrata-Cristã (CDU) Wolfgang Schaeuble durante um plenário do partido, em Karlsruhe, 1995 REUTERS/Wolfgang Rattay
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Bill Clinton, Jacques Chirac e Helmut Kohl durante a assinatura do acordo de Dayton para a Paz na Bósnia e Herzegovina, em Paris,1995 Charles Platiau
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Helmut Kohl durante uma visita de um dia à Grã-Bretanha, 1996 REUTERS/KEVIN LAMARQUE
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Helmut Kohl cumprimenta o Presidente da República Checa Vaclav Klaus durante a sua visita a Praga, 1997 PÚBLICO/MICHAL DOLEZAL
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Helmut Kohl dança com a sua primeira mulher, Hannelor, 1997 REUTERS/MICHAEL URBAN
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Celebração do 11.º aniversário da unificação da Alemanha, em 2001 REUTERS/Tobias Schwarz
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Helmut Kohl com o Presidente francês Jacques Chirac e o primeiro-ministro francês Alain Juppe durante um passeio de barco no final da cimeira franco-alemã REUTERS
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Retrato do chanceler alemão Helmut Kohl e do Presidente russo Boris Yeltsin na Casa central de artistas em Moscovo REUTERS/Michael Evstafiev
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O Presidente francês Jacques Chirac com o Presidente polaco Aleksander Kwasniewski e o chanceler alemão Helmut Kohl após a cerimónia oficial de boas-vindas na Praça do Mercado em Poznan, Polónia JANEK SKARZYNSKI
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Helmut Kohl durante uma campanha do partido União Democrata-Cristã (CDU) REUTERS/Jochen Eckel
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Presidente francês Jacques Chirac e Helmut Kohl durante o início da 65.ª cimeira franco-alemã REUTERS/Jean Marc Loos
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Helmut Kohl durante uma conferência para promover o seu livro "Erinnerungen 1982-1990" (Memórias 1982-1990), em Berlim, 2005 REUTERS/Tobias Schwarz
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Helmut Kohl faz um discurso durante a cerimónia do seu aniversário, 2010 REUTERS/Johannes Eisele
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Helmut Kohl com Bill Clinton, Angela Merkel e Henry Kissinger após receber o prémio Henry A. Kissinger pela Academia Americana, em Berlim, 2011 REUTERS/Clemens Bilan
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2012 REUTERS/Fabrizio Bensch
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2013 REUTERS/Michael Dalder

Diziam os entendidos nas idiossincrasias dos povos que os alemães gostavam de líderes intelectualmente brilhantes, carismáticos e com o dom da palavra. À primeira vista, Helmut Kohl não tinha o que era preciso para triunfar na política. Contra todas as expectativas, porém, não só se tornou chanceler como se manteve 16 anos no cargo, ficando claro ainda antes de sair do poder que seria o mais importante chefe de Governo desde Otto von Bismarck.

Helmut Kohl morreu nesta sexta-feira aos 87 anos.

Kohl foi o líder que reunificou a Alemanha que a guerra partira ao meio, e foi o líder europeu que uniu a Europa, dando-lhe um nó que, esperava, nunca mais pudesse ser desatado. Um legado extremamente sofisticado para um homem do campo, que não fazia voltar cabeças quando entrava numa sala e que falava com um sotaque de província, como sempre sublinharam os seus inimigos políticos e muitos dos seus próprios parceiros de partido.

Kohl era um político de estilo diferente daquele a que Bona (a capital da Alemanha Federal) estava habituada. Era persistente e afável. Em vez de diplomacia elegante, fazia diplomacia afectiva — tornou-se amigo dos líderes de um mundo que via em transformação, Mikhail Gorbachev, o último Presidente soviético, o americano George Bush, o francês François Miterrand. Acompanhou as reformas do soviético e, quando percebeu os sinais da derrocada do bloco, arquitectou a reunificação alemã, em 1990, um ano depois da queda do muro de Berlim. Por causa disso, Bush chamou-lhe “o maior líder europeu da segunda metade do século XX”.

Finda a Guerra Fria e reunificado o território, passou à segunda fase do seu plano: unir a Europa. O seu parceiro de visão foi Miterrand. Os dois homens foram os principais promotores do Tratado de Maastricht, que cria a União Europeia (desaparecendo a velha Comunidade Económica) e abre o caminho para a criação de uma moeda única.

Quando Kohl fez 85 anos, o jornal de grande circulação Bild pediu depoimentos a Angela Merkel, a actual chanceler, e ao americano Henry Kissinger. Kissinger chamou-lhe “pioneiro do pensamento europeu”. Merkel sublinhou que na sua História recente a Europa tem dois momentos felizes: o nascimento da UE e a reunificação alemã; e ambos se devem a Helmut Kohl, escreveu. “É a obra da sua vida” e é o que “permite que estejamos solidamente lado a lado”, considerou a chanceler que concluiu: “Foi esta a lição que ele tirou do Nacional Socialismo e da II Guerra Mundial. A Alemanha tem muito que lhe agradecer”.

O legado político foi, porém, manchado — saiu da vida pública em 2002, com um escândalo, quando se soube que a CDU (união dos cristãos-democratas) recebera financiamento ilícito nos anos da liderança Kohl. Foi um momento amargo para o ex-chanceler que viu a sua protegida, Merkel — que foi buscar à antiga República Democrática e levou para o Governo em 1991 —, afastar-se dele, e repudiar o “patrono”, no que muitos viram como uma facada das costas de Merkel a Kohl. No livro que escreveu em 2014, Aus Sorge um Europa (A preocupação com a Europa), Kohl não poupa os seus sucessores, que responsabiliza pela crise do euro — a Merkel reprova a abordagem aos países em dificuldade e sujeitos a resgates. Mas defende ferozmente a integração europeia.

Era uma ideia antiga, na verdade uma obsessão desde que começou a carreira política, aos 16 anos, quando se filiou no Partido Democrata Cristão e começou a construir um percurso marcado por dois acontecimentos da sua vida. O primeiro, a morte do irmão mais velho, durante a II Guerra (Kohl queria encontrar uma forma de impedir novos conflitos no continente). O segundo, a memória do padre que, no bairro modesto de Ludwigshafen onde os Kohl moravam, falava aos miúdos das maravilhas da democracia. “A paz não pode ser apenas o oposto da guerra”, considerava Kohl.

Dizem os biógrafos que, no partido, o rapaz se tornou exímio a resolver disputas e a apagar rivalidades entre os jovens democratas-cristãos. Também criou amizades, acumulou contactos, ligações, montou uma rede que lhe permitia antecipar cenários. Transpôs o método para a política mundial — só não conseguiu quebrar a frieza que a britânica Margaret Thatcher lhe votava.

Kohl foi subindo na hierarquia do partido, preferindo apostar primeiro numa carreira interna antes de avançar para os cargos públicos, o primeiro deles o de chefe do governo da Renânia-Palatinado, uma região atrasada por comparação a outras da República Federal mas que mudou com as ambiciosas e bem-sucedidas reformas de Kohl. Em 1976, chegou à liderança da CDU e a elite de Bona não gostou de se ver mandada por este político de província sobre quem se contavam anedotas. “Não menosprezem Helmut Kohl”, avisou na altura o sofisticado, social-democrata e ex-chanceler Willy Brandt.

“Durante décadas fui subestimado. Mas saí-me bem dessa maneira”, disse Kohl sobre o seu percurso. Foi chanceler durante 16 anos, o que lhe valeu o título de “chanceler eterno”. 

Nos últimos anos, depois de uma queda que lhe deixou o maxilar paralisado (e com grandes dificuldades para falar) e as ancas deficientes, Kohl andou de cadeira de rodas. No início de Maio de 2015, foi operado a uma anca, segundo divulgou a sua discreta família (os dois filhos e a segunda mulher, 35 anos mais nova). A revista Der Spiegel noticiou que, a seguir, foi submetido a uma segunda cirurgia, ao intestino, o que não foi confirmado pela família.

O fim da vida de Kohl foi ainda marcado pela publicação de uma biografia não autorizada em que se davam a conhecer os seus pensamentos supostamente sinceros e algo desdenhosos sobre uma série de líderes, de Merkel e Gorbachev.

Mas a sua herança continuou a mesma: o homem, que apesar de vir da província, se tornou o chanceler que mais tempo ocupou o cargo e uniu os alemães.

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