Ameaça terrorista engoliu tudo o mais na campanha britânica

Primeira-ministra sob o fogo da oposição por causa dos cortes no número de polícias. Com os ataques de sábado em Londres ainda frescos na memória, partidos tentam mostrar que têm as chaves para a segurança do país.

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Theresa May foi confrontada com decisões que tomou quando era ministra do Interior EPA

Nenhum país fica incólume a um atentado, muito menos a dois, separados por tão pouco tempo. A campanha para as legislativas britânicas foi retomada menos de 24 horas depois dos ataques na London Bridge, mas o “Brexit” ou as polémicas proposta dos conservadores para cortes nos apoios sociais foram submergidos pelas preocupações com a segurança, num país onde há 23 mil pessoas sob o radar da polícia e estão em curso 500 investigações relacionados com terrorismo, revelou a chefe da Scotland Yard, Cressida Dick.

A primeira-ministra, Theresa May, lançou o tom quando, no domingo, anunciou planos para combater não só as células terroristas, mas também “a ideologia maligna do extremismo islâmico”, e negar “qualquer refúgio” aos que a professam. Uma resposta muito mais dura daquela que deu ao atentado de Manchester e com uma escolha de palavras que, notaram alguns comentadores, evoca ao de leve a retórica do Presidente norte-americano, Donald Trump, sobre o combate ao “islão radical”.

Em circunstâncias normais, escreveu o Politico, a dureza desta resposta cimentaria a autoridade da primeira-ministra e iria granjear-lhe os votos de que precisa para garantir a maioria que deseja nas eleições de quinta-feira. Mas esta já mostrou ser uma eleição totalmente imprevisível e, com as últimas sondagens disponíveis a manterem o Partido Conservador com uma vantagem pouco confortável sobre os trabalhistas, a oposição passou ao ataque, insistindo que nos seis anos em que May foi ministra do Interior (2010-16) a polícia britânica perdeu mais de 20 mil agentes.

“Não é possível proteger as pessoas por pouco dinheiro”, repetiu o líder do Partido Trabalhista, Jeremy Corbyn, que numa entrevista nesta terça-feira de manhã chegou a dizer que a primeira-ministra devia assumir a responsabilidade pelos cortes e demitir-se – sugestão que clarificou depois, explicando que os cortes nas forças policiais são mais uma das razões pelas quais May deve ser derrotada na quinta-feira.

May, que diz ser a única capaz de assegurar uma “liderança forte e estável” – seja nas negociações que vão começar dentro de dias para a saída da União Europeia, seja na resposta às ameaças que o país enfrenta –, passou o dia a ser confrontada com perguntas sobre os cortes nas forças policiais e a esquivar-se a elas. Garantiu, no entanto, que os sectores mais directamente envolvidos no combate ao terrorismo – as equipas de investigação e os grupos de reacção armada – “tem os recursos de que precisam”. E lembrou que, ainda em tempos recentes, Corbyn questionava o reforço dos poderes da polícia no combate ao terrorismo.

“Decisões em cima dos joelhos”

Longe da histeria dos últimos dias de campanha, os especialistas em segurança tentavam perceber até onde quer ir May para endurecer o combate aos extremistas. A imprensa não demorou a comparar as suas ideias ao plano de 12 pontos que o então primeiro-ministro, Tony Blair, divulgou no rescaldo dos atentados de Julho de 2005, quando avisou os radicais – num tom muito próximo do usado pela sua antecessora – que “as regras do jogo estão a mudar". James Landale, especialista em assuntos diplomáticos da BBC, recordava na segunda-feira que várias das propostas nunca saíram do papel – como a que dava às autoridades novos poderes para fechar as mesquitas –, outras geraram tanta discussão que acabaram por ser abandonadas, como a que previa a detenção de suspeitos durante 90 dias sem julgamento.

Para além da intenção – ainda por detalhar – de “regular o ciber-espaço” para travar a difusão da propaganda extremista e sublinhar a “superioridade dos valores pluralistas britânicos", a líder conservadora anunciou que, se vencer as eleições, pretende reforçar as penas de prisão para todos os tipos de delitos relacionados com terrorismo, incluindo os menos graves.

O Guardian escreveu que as propostas vão na mesma linha do programa que apresentou, enquanto ministra do Interior, em 2015, e onde propunha a adopção de medidas judiciais contra grupos e pessoas que promovessem o ódio ou o extremismo. Em cima da mesa chegou também a estar o encerramento de espaços (incluindo mesquitas ou escolas) usados para conferências ou discursos de radicais. O jornal sublinha que o plano não obteve o aval dos colegas de Governo, que chegaram à conclusão de que não era possível encontrar uma definição de “extremismo” capaz de sobreviver ao escrutínio dos tribunais.

A primeira-ministra está sob pressão para mostrar que está à altura da ameaça”, escreveu o Financial Times. “Mas o que importa é saber quantas das ideias em cima da mesa neste emocional rescaldo do ataque irá conseguir tornar realidade”. Landale é mais céptico, dizendo que já perdeu a conta a quantas leis antiterrorismo foram aprovadas desde 2001 e “ainda assim a ameaça continua e é real”.  E acrescenta que na quinta-feira, quando forem votar, muitos britânicos terão outras preocupações para além da ameaça terrorista. “Eles sabem que estão a eleger um governo para cinco anos e sabem também que as decisões tomadas em cima do joelho nem sempre são as melhores a longo prazo”.

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