Trump sai do G7 às cotoveladas, sem ceder no clima e na crise dos refugiados
EUA não se comprometem com o Acordo de Paris para a redução de emissões de dióxido de carbono e forçam parceiros a subinhar que os países têm o direito a fechar as suas fronteiras.
À primeira vista, as palavras que estão no comunicado final da cimeira do G7 podem parecer uma repetição de outros textos assinados no passado recente, mas essa sensação não resiste a uma leitura um pouco mais atenta: a Casa Branca de Donald Trump não se aproximou um milímetro dos seus parceiros nas questões do clima e dos refugiados e só chegou a meio caminho nas discussões sobre o futuro da globalização.
Ao contrário do que os anfitriões da cimeira pretendiam, o texto final da reunião foi muito breve em comparação com o do ano passado, e muito mais curto do que aquele que estava na cabeça do primeiro-ministro italiano, Paolo Gentiloni.
Reunidos na estância balnear de Taormina, na ilha italiana da Sícilia, seis dos sete líderes do G7 tiveram dois dias para convencerem o Presidente dos Estados Unidos a comprometer-se com o Acordo de Paris sobre a redução da emissão de dióxido de carbono, mas no final só havia uma palavra para descrever esses esforços: fracasso.
A chanceler alemã, Angela Merkel, confirmou isso mesmo nas declarações no final da cimeira: as discussões foram "muito difíceis, para não dizer que foram muito insatisfatórias".
"Neste caso temos uma situação de seis contra um, o que significa que ainda não há sinais de que os Estados Unidos vão permanecer no Acordo de Paris", disse Merkel.
Como tem sido habitual, Donald Trump preferiu usar o Twitter para levantar o véu sobre a posição dos Estados Unidos, mas parece que neste momento nem a própria Casa Branca sabe o que vai fazer: "Vou tomar a minha decisão final sobre o Acordo de Paris na próxima semana!"
Durante a campanha eleitoral do ano passado, Trump repetiu várias vezes que se chegasse à Casa Branca iria retirar o país do Acordo de Paris – um acordo de cumprimento voluntário que demorou anos a alcançar, foi um dos cavalos de batalha de Barack Obama e inclui a China. Para além disso, também afirmou que o aquecimento global é um embuste criado pela China.
Se os Estados Unidos se retirarem, isso não significa que os restantes países não possam manter as suas metas, mas teme-se que outros países muito poluidores, como a China, se sintam desobrigados de pôr em causa a escala do seu crescimento económico em troca de um combate mais sério contra a emissão de dióxido de carbono.
E foi mesmo esse o principal argumento de Trump durante a campanha – se os Estados Unidos se comprometerem com o acordo, será mais difícil cumprir a promessa de devolver empregos aos operários das velhas indústrias que perderam o emprego em algumas zonas do país. Desde então, houve vários sinais de que a posição de Donald Trump "evoluiu" – algo que a equipa de negociadores norte-americana se fartou de sublinhar em Taormina –, mas a verdade é que não evoluiu o suficiente para se reflectir no comunicado final da cimeira do G7.
As diferenças entre os Estados Unidos e o outro bloco formado por Canadá, Reino Unido, Alemanha, França, Itália e Japão ficaram patentes na parte do comunicado dedicada ao clima e à energia – são apenas três pontos, e um deles só tem uma linha.
"Os Estados Unidos da América estão em processo de revisão das suas políticas sobre alterações climáticas e sobre o Acordo de Paris, e por isso não estão em posição de se juntar ao consenso sobre estes tópicos", lê-se no comunicado.
Direito a fechar fronteiras
Outro dos grandes choques entre os EUA e os restantes países foi a declaração sobre as crises migratórias e os refugiados. A intenção inicial de Itália era apresentar um texto de cinco páginas dedicado ao tema, isolado do comunicado final, para sublinhar a sua importância – o Governo de Itália pretendia chamar a atenção para o facto de se sentir isolado na gestão da chegada de milhares de pessoas às suas costas todos os anos, mas também sublinhar os direitos dos migrantes económicos e refugiados e salientar o seu contributo para os países de acolhimento.
Mas o máximo que a delegação norte-americana permitiu foi o reconhecimento da existência de um problema grave que põe em causa os direitos humanos. Para além disso, só excepções: é reconhecida a necessidade de apoiar os refugiados, mas quanto mais perto dos seus países de origem, melhor; são defendidos os direitos humanos de todos os migrantes e refugiados, mas é sublinhado que cada país tem o direito a "controlar as suas próprias fronteiras e a estabelecer políticas de acordo com os seus interesses nacionais e segurança"; e admite-se que os países podem beneficiar com os movimentos migratórios e a chegada de refugiados, mas apenas se esses processos decorrerem "de forma segura e ordeira".
Por razões geográficas, os Estados Unidos não têm de lidar com a chegada de migrantes e refugiados de África e da Ásia – a preocupação de Donald Trump é com a entrada de mexicanos através das suas fronteiras, e para enfrentar esse problema o Presidente norte-americano está a tentar desbloquear orçamento para construir o prometido muro, até agora sem sucesso – durante os dois dias da cimeira em Taromina, foram muitos os protestos contra a construção desse muro, bem como a favor do Acordo de Paris, entre outros temas.
A maior concessão feita pelos Estados Unidos na cimeira do G7 foi a autorização para que pudesse ser inscrita no comunicado final a expressão "combate ao proteccionismo", mas ainda assim os pontos dedicados ao comércio internacional estão marcados pela posição norte-americana – ao mesmo tempo que reconhecem os "benefícios recíprocos" de uma economia aberta, os membros do G7 afirmam que esse tipo de mercado "nem sempre tem beneficiado toda a gente" e, por esse motivo, comprometem-se a "adoptar as medidas necessárias para que todas as empresas e cidadãos possam tirar o melhor partido das oportunidades oferecidas pela economia global".
Mais uma vez no Twitter, Donald Trump fez questão de explicar à sua base de apoio o que significava todo aquele palavreado, escolhendo salientar que os Estados Unidos saíram de Itália com a promessa de "acabar com todas as práticas que distorcem o comércio, para abrir caminho a um campo nivelado da mesma forma para todos".