A promessa de investimento na ciência e investigação tem vindo a ser cumprida por parte do actual Governo, o que é de saudar, tendo em conta o desinvestimento feito ao longo dos últimos anos. Nesse sentido, em 2016 verificou-se um acréscimo de 17% face a 2015 na atribuição de bolsas no âmbito do concurso individual para doutoramento e pós-doutoramento da Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT), sendo que as bolsas destinadas a doutoramento registaram um incremento de 44%. São números expressivos que confirmam que a aposta na investigação e desenvolvimento é uma realidade.
No entanto, nem tudo são rosas. Na passada semana, a Associação dos Bolseiros de Investigação Científica (ABIC) denunciou atrasos no pagamento das ditas bolsas e, ao que parece, há investigadores que se encontram a trabalhar desde Outubro sem terem recebido qualquer verba. A FCT nega que qualquer regulamento esteja a ser quebrado, mas assume que um atraso de dois meses na divulgação dos resultados iniciais fez derrapar todos os prazos do processo e, por isso, os pagamentos ainda não se iniciaram, segundo noticia o Público. Bem, com ou sem regulamentos, a verdade é que, sendo bolseiros, estes investigadores não podem ter outro tipo de rendimento a partir do momento em que iniciam o doutoramento/pós-doutoramento, exigência feita por parte da FCT e que, mesmo estando a par deste acontecimento, nada fez para a eliminar. Certo é que num país desenvolvido este tipo de situações não pode mesmo acontecer, mas é recorrente, basta fazer uma pesquisa no Google. Não é expectável que um bolseiro pague as despesas do seu estudo ou investigação do próprio bolso, muito menos é expectável que tenha de pensar como pagar a renda da casa, pois está impedido de obter outros rendimentos, durante meses. Não é, certamente, expectável que um governo que diz governar para as pessoas esteja a gerir tão mal este problema, refugiando-se no “aumento brutal” das candidaturas.
A boa vontade pode gerar populismos, afinal de nada serve atribuir bolsas e colocar um investimento no papel se ele não se materializar. É notório que existe um problema de gestão que vai além do volume de candidaturas, parece existir uma real escassez de recursos para assegurar que todos os bolseiros consigam realizar os seus estudos em condições aceitáveis. Por isso, que não se tenha medo de assumir que, mesmo com a tentativa de recuperação do brutal desinvestimento feito nos recentes anos (2012 foi o último ano em que foram atribuídas tantas bolsas como em 2016, sendo que em 2013 o decréscimo foi na ordem dos 50%), o Estado está, ainda, sem capacidade de reposta. Tendo em conta esta dificuldade de assumir o compromisso para com os estudantes, creio que o Estado deve colocar a hipótese de apoiar monetariamente candidaturas a universidades estrangeiras, de renome internacional, que todos os anos levam candidatos a gastar centenas e, por vezes, milhares de euros entre cauções, exames e certificados sem a garantia de receber um sim. Por isso, uma boa fatia dos potenciais estudantes portugueses destas universidades prefere não arriscar e concorrer às bolsas da FCT. Não é aceitável que, recorrentemente, exista esta quebra de confiança entre o Estado e os cidadãos que levará a que, no longo-prazo, apenas candidatos com possibilidades financeiras consigam prosseguir os seus estudos e investigações, quer seja em Portugal ou num país estrangeiro. Actualmente perdem os estudantes, perdem as investigações, perdem as universidades, perde o país, perdemos todos.