Uma aposta na formação que se mede pela continuidade
Na estratégia do Benfica, está em marcha a confirmação do talento preparado no Seixal. Falta a diminuição dos gastos com transferências, outra das metas de Vieira.
Tem sido um dos alicerces do discurso de Luís Filipe Vieira ao longo dos últimos mandatos e a transformação está a acontecer gradualmente. Sim, o Benfica tem hoje, com Rui Vitória, uma presença mais regular de produtos da formação na equipa principal, mas essa integração tem sido feita num contexto de grande experiência e de investimentos avultados. Por outras palavras, os “encarnados” já aproveitam de forma mais capaz o talento da academia, mas essa aposta não tem significado uma redução visível no ataque ao mercado de transferências.
Vamos por partes. Nas duas últimas épocas de Jorge Jesus no Estádio da Luz (para termos um termo de comparação equilibrado) foi montado um campeão feito de jogadores consagrados (Maxi Pereira, Luisão, Garay, Siqueira, Lima, Gaitán) e de “compras” avultadas (Rodrigo, Markovic, Fejsa). É verdade que havia promessas do Seixal nas sessões de treino, mas André Gomes (274 minutos em 2013-14) e Ivan Cavaleiro (292) foram os únicos a ter uma utilização que ultrapassasse o mero prémio de presença.
A tendência manteve-se na temporada seguinte, com alterações pontuais no “xadrez” (os experientes Jardel, Eliseu e Salvio entraram no “onze”), a chegada de Samaris (10 milhões), a “descoberta” de Jonas e a afirmação plena de Pizzi, que viria a tornar-se num dos jogadores mais caros do Benfica (14 milhões). Da formação, Jesus aproveitou Gonçalo Guedes para rodar essencialmente na Taça da Liga, já que no campeonato o avançado coleccionou uns meros 37 minutos.
O paradigma mudou com a aposta em Rui Vitória, a quem Vieira pediu uma maior atenção e um aproveitamento mais capaz dos produtos da academia do Seixal, a menina dos olhos do presidente. Mas essa mudança tem sido operada de forma progressiva, devidamente enquadrada num plantel recheado de referências e de jogadores de milhões.
Ainda que o técnico ribatejano tenha lançado, em 2015-16, uma mão-cheia de jovens promessas, num lote que incluiu jogadores como Victor Andrade, Nuno Santos e até Clésio, a palavra continuidade só começou a fazer sentido para Nelson Semedo, Gonçalo Guedes e Renato Sanches. Mais do que a quantidade, é a confiança repetida mostrada por Rui Vitória em alguns dos elementos que fizeram escola no Benfica B que tem ajudado a alterar a percepção sobre a estratégia “encarnada”.
Este é um dos lados da moeda, o da confirmação do talento jovem como forma de capitalizar o investimento em meios técnicos e recursos humanos realizado no Seixal. O outro, o da diminuição abrupta dos gastos com transferências, continua por concretizar.
Apesar de Vieira já ter feito notar, por mais do que uma vez, que não é sustentável continuar a pagar facturas avultadas por passes de jogadores, o que é certo é que na presente temporada o Benfica desafiou essa intenção com a aquisição dos restantes 50% dos direitos de Raúl Jiménez (que custou um total de 21,8 milhões, o mais caro da história), a contratação definitiva de Mitroglou (7 milhões) e a chegada de Rafa Silva (16,4 milhões), só para citar os negócios mais sonantes.
Foi neste quadro que os “encarnados” alicerçaram a caminhada actual, que serviu também para consagrar em definitivo Ederson (ele, que teve de passar pelo Rio Ave para regressar a Lisboa com outros horizontes), Gonçalo Guedes (que rumou a Paris no mercadode Inverno) e, acima de tudo, Nelson Semedo e Victor Lindelof (45 jogos cada), dois dos mais utilizados por Rui Vitória.