Depois dos médicos, podem ser os juízes a fazer greve

Ministério da Justiça mantém em segredo projecto de revisão do estatuto dos magistrados judiciais. Associação Sindical de Juízes não descarta paralisação de protesto.

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Ministra da Justiça nunca escondeu que era difícil conseguir dinheiro para uma revalorização salarial dos juízes Rui Gaudêncio

A Associação Sindical de Juízes Portugueses não descarta a realização de uma greve. Em causa está a revisão do estatuto profissional da classe, que está praticamente pronta mas que o Ministério da Justiça mantém em segredo em todos os seus aspectos, salarial incluído.

“Não queremos ir para a greve, mas não descartamos essa possibilidade”, declara a presidente da associação sindical, Manuela Paupério, recordando que não se trata de um protesto inédito entre estes magistrados: já sucedeu em 1988, 1993 e em 2005. A dirigente sindical explica que, apesar de serem titulares de órgãos de soberania, os juízes são uma classe profissional, razão pela qual têm direito à greve, embora exista quem ponha em causa essa prerrogativa.

O descontentamento dos magistrados judiciais radica no facto de estarem há seis anos à espera de verem ser revisto o estatuto, após sucessivas promessas nesse sentido. Mas a anterior ministra da Justiça, Paula Teixeira da Cruz, não o deixou pronto, apesar de ter nomeado um grupo de trabalho para o fazer.

Quando a substituiu, Francisca van Dunem formou um novo grupo de trabalho, liderado pelo ex-presidente do Supremo Tribunal de Justiça, Noronha Nascimento, que entregou à governante em Janeiro uma proposta que levava em linha de conta várias das reivindicações da classe. Que passam não apenas por um aumento do suplemento salarial — que vale actualmente cerca de 620 euros e se destina a compensar o facto de não poderem exercer funções remuneradas em mais lado nenhum senão nos tribunais —, como também pelo reforço dos mecanismos que garantem a independência destes magistrados. A adaptação do estatuto profissional ao mapa judiciário em vigor desde 2014 é outra questão que a proposta do Governo terá de resolver (a associação quer, por exemplo, que as inspecções aos juízes sejam feitas por magistrados especializados na área de trabalho que estão a avaliar).

Se a tutela tenciona levar em linha de conta estas reivindicações é coisa que Manuela Paupério diz ignorar. A ministra nunca escondeu, contudo, que era difícil conseguir dinheiro para uma revalorização salarial.

A Associação Sindical de Juízes Portugueses teme que a discussão pública da proposta de diploma, cuja divulgação a dirigente sindical assegura ter-lhe sido prometida para Abril, arranque demasiado tarde para acomodar um eventual impacto do aumento da despesa no Orçamento de Estado do ano que vem. “Embora se trate de um impacto diminuto”, ressalva.

“Queremos uma resposta até ao final de Maio, ou deixaremos de ter paciência. Há colegas que dizem que estamos a ser outra vez enrolados”, conta Manuela Paupério, acrescentando que a titular da pasta da Justiça justifica a delonga com o atraso na revisão do estatuto dos procuradores do Ministério Público. A governante quererá apresentar as duas propostas em simultâneo.

Os representantes dos juízes não viram com bons olhos a comparação feita recentemente pelos médicos numa carta aberta que escreveram aos portugueses antes de iniciarem a greve. Diziam que um médico pode aspirar a ganhar, no final da sua vida activa, o que um juiz ou um magistrado auferem ao fim de sete anos de exercício num tribunal de primeira instância. 

Contactado pelo PÚBLICO, o Ministério da Justiça não quis comentar a posição da Associação Sindical de Juízes Portugueses. 

As reivindicações dos juízes

  • Subida do actual suplemento salarial de 620 euros, que se destina a compensar a exclusividade obrigatória
  • Aumento das possibilidades de progressão na carreira
  • Adaptação do estatuto profissional à nova organização dos tribunais
  • Melhoria das salvaguardas de independência dos juízes, nomeadamente no que respeita às regras de redistribuição dos processos
  • Possibilidade de, em sede de recurso judicial das punições disciplinares, alterar em tribunal os factos apurados durante os processos disciplinares 
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