Encontrado o primeiro jardim funerário do Antigo Egipto

Ilustrações em túmulos egípcios já nos tinham revelado que em tempos existiram jardins funerários, mas nunca se tinha visto nenhum. Embora sem as flores de outrora, foi agora descoberto um deles.

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Reconstituição de como seria o jardim funerário CSIC Comunicação
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Reconstituição de como seria o jardim funerário CSIC Comunicação
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O jardim funerário encontrado CSIC Comunicação

Já se sabia que existiam jardins funerários no Egipto, afinal já os tínhamos visto desenhados em túmulos. Mas nunca tinha sido encontrado nenhum. Agora uma equipa do Conselho Superior de Investigação Científica (CSIC), liderada pelo especialista sobre Mediterrâneo e Antigo Oriente José Manuel Gálan, descobriu um jardim funerário com cerca de quatro mil anos, na necrópole de Dra Abu el-Naga, perto de Luxor, cidade do Sul do país famosa pelos templos faraónicos do Nilo.

“Sabíamos da possível existência destes jardins desde que apareceram em ilustrações, tanto na entrada como nas paredes dos túmulos, onde os egípcios descreviam como gostariam que fosse o seu funeral”, começa por dizer José Manuel Gálan, num comunicado do CSIC.

Agora foi mesmo encontrado o que já havia sido visto nas ilustrações. O jardim funerário foi descoberto num átrio mesmo à entrada de um túmulo, que provavelmente pertencia ao Império Médio (que perdurou de cerca de 2060 a.C. a 1803 a.C.) e em particular à XII dinastia egípcia (cerca de 1991 a.C. a 1803 a.C.).

Este jardim de três metros de comprimento e dois metros de largura tem canteiros com 30 centímetros quadrados. Dois desses canteiros são mais altos do que os restantes e aí deveriam estar pequenas árvores ou arbustos. Os investigadores descobriram também raízes e um tronco com 30 centímetros de uma árvore pequena e, ao lado, estava ainda uma tigela que tinha restos de tâmaras e de outros frutos que podiam ter sido oferendas.

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O jardim funerário encontrado CSIC Comunicação

“Esta é a primeira vez que um jardim físico foi encontrado e, é portanto, a primeira vez que a arqueologia conseguiu confirmar o que tinha sido deduzido pela iconografia”, realça José Manuel Gálan. “A descoberta e a análise do jardim irão fornecer informação preciosa, tanto da botânica como das condições ambientais de Luxor de há 4000 anos.”

E por que eram feitos os jardins funerários no Egipto? “As plantas em crescimento tinham um significado simbólico e deveriam ter um papel nos rituais funerários”, explica José Manuel Gálan. Além disso, o jardim fazia parte das crenças e práticas religiosas da sociedade de então. “Sabemos que a palmeira, o sicómoro [uma espécie de figueira] e as árvores da Pérsia estavam associadas ao poder da ressurreição dos mortos. Similarmente, plantas como a alface tinham conotações com a fertilidade e o retorno da vida”, conta José Manuel Gálan, acrescentando que as sementes das plantas encontradas irão ser analisadas.

“É espectacular e completamente único encontrar esta abertura para múltiplos caminhos na investigação”, salienta o especialista em Antigo Oriente. “Escavar uma necrópole não nos permite apenas descobrir os pormenores do mundo fúnebre, as crenças religiosas e as práticas funerárias, mas também nos ajuda a desvendar detalhes sobre a vida quotidiana, a sociedade e o ambiente físico, tanto nas plantas como nos animais.”

Ainda bem perto deste jardim, também foi descoberta uma capela construída com areia com 46 centímetros de altura, 70 centímetros de largura e 55 centímetros de profundidade com três lápides. Os cientistas pensam que a capela data da XIII dinastia egípcia (que decorreu de 1802 a.C. a 1649 a. C.).

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Capela construída com areia CSIC Comunicação

“Estes achados sublinham a importância da área que circunda a colina da necrópole Dra Abu el-Naga como um centro sagrado para uma grande variedade de actividades durante o Império Médio”, salienta o investigador.

E as descobertas desta equipa não começaram aqui. Há 16 anos que iniciou o projecto Djehuty, em que o objectivo é escavar, reconstruir e publicar trabalhos das necrópoles na área de Tebas, uma cidade do Antigo Egipto. Hoje, nas proximidades de Tebas ergue-se Luxor, a cidade onde foi encontrado o jardim funerário.

Ao todo, já foram feitas 16 campanhas de trabalhos de campo arqueológicos e foram encontrados vários objectos – como a câmara funerária do general Djehuty, onde estavam passagens do Livro dos Mortos (rolos de papiro com orações ou litanias que eram colocados nos túmulos no Antigo Egipto) ou uma representação de Nut, a deusa do céu nocturno. Também já se encontraram um quadro escolar usado para aprender a escrever e a desenhar, um caixão de madeira de uma mulher mumificada, bouquet de flores com cerca de 3000 anos, figurinos de madeira destinados a funerais ou um caixão de uma criança que terá vivido por volta de 1550 a.C.

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