PSD ataca Governo com a ideia de “falta de cultura democrática”

Veto aos novos elementos do Conselho de Finanças Públicas levam sociais-democratas a suspeitar que Governo quer condicionar o órgão independente.

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Rui Gaudencio

O PSD está a fazer do veto do Governo às nomeações para o Conselho de Finanças Públicas (CFP) uma manifestação de “falta de cultura democrática” do executivo socialista. A ideia, usada como arma de arremesso dos sociais-democratas contra António Costa, não é nova, mas ameaça tornar-se, nos próximos tempos, recorrente, na estratégia de Pedro Passos Coelho para atacar o Governo. Ao que o PÚBLICO apurou, o líder do PSD não tenciona deixar cair a polémica e vai explorar a ideia de que o que está em causa neste processo de nomeações é a independência de instituições cuja natureza legal é imperativamente independente do executivo.

As duas propostas para substituir o vice-presidente e o vogal-executivo do CFP – que já terminaram o mandato – estão por aprovar há meses pelo Governo, a quem cabe fazer a nomeação. Esse impasse levou Passos Coelho a confrontar o primeiro-ministro no debate quinzenal desta semana. O líder do PSD não gostou do que ouviu: António Costa só respondeu perante as insistências e assumiu que considerava que os “nomes [Teresa Ter-Minassian e Luís Vitório] não reuniam o perfil”. Uma intervenção que levou o PSD a endurecer o discurso: de uma divergência sobre a interpretação da lei passou-se à acusação da incapacidade do PS em “cumprir regras básicas da democracia”. Nem mesmo quando o Presidente da República se colocou ao lado do Governo, defendendo o diálogo entre quem propõe e quem nomeia, o PSD manteve o recato em relação ao chefe de Estado. O partido assumiu a discordância com Belém. É que, na São Caetano, suspeita-se de que a intenção do Governo é condicionar e fragilizar uma entidade independente que não tem sido favorável aos socialistas.

Depois do debate quinzenal, o tema voltou à comissão política do partido, na passada quinta-feira. Ao que o PÚBLICO apurou, o líder do PSD não vai deixar cair a polémica, tendo em conta que o que está em causa é a independência das instituições.

O primeiro-ministro veio esta sexta-feira tentar desdramatizar a situação, dizendo acreditar “não há problema nenhum” com o CFP e que, “brevemente”, o Tribunal de Contas e o Banco de Portugal – entidades a quem compete propor - apresentarão novos nomes que mereçam a aprovação do Governo. António Costa socorreu-se mesmo das palavras de Marcelo Rebelo de Sousa: “Se tivesse havido um diálogo prévio, porventura teriam sido afinados critérios uniformes.”

O PSD alega que os estatutos do CFP não dão margem para o Governo recusar os nomes propostos pelo Tribunal de Contas e Banco de Portugal. Mas foi o que aconteceu. O primeiro-ministro contrapõe que “a lei é a lei” e que o Governo é que tem o poder de decidir e nomear. No debate quinzenal, António Costa acabou por tentar desvalorizar a questão colocada pelo líder da oposição, ao centrar toda a sua intervenção em “nomeações de duas pessoas”. E recordou a “guerra” do anterior Governo com o Tribunal Constitucional, órgão também independente do poder executivo.

Manuela Ferreira Leite, no seu comentário de quinta-feira na TVI, colocou-se ao lado do Governo ao mostrar dúvidas na escolha de um dos nomes por ter estado ligado ao Fundo Monetário Internacional (FMI). “Fizemos uma festa quando saiu a troika e não arranjamos mais ninguém a não ser uma pessoa do FMI? Deve haver dezenas de portugueses com competência para o cargo”, afirmou a ex-líder social-democrata, criticando Passos Coelho por dar a entender que, se fosse primeiro-ministro, já teria aprovado os nomes propostos.

No pólo oposto, o ex-director da campanha de Marcelo nas presidenciais e candidato do PSD à Assembleia Municipal do Porto, Pedro Duarte, disse estar de acordo com o líder do PSD. "O Governo lida mal com a independência das instituições", afirmou o ex-deputado do PSD no programa Política Pura, da TSF, lembrando que o actual executivo é “apoiado por partidos que nutrem simpatia pelo governo venezuelano e que defendem a extinção do Conselho de Finanças Públicas".

Uma das declarações mais polémicas da presidente do CFP, Teodora Cardoso, foi quando atribuiu a “milagre” o défice de 2,1% alcançado em 2016. A observação valeu-lhe fortes críticas à esquerda: o socialista Eurico Brilhante Dias pôs em cima da mesa a hipótese de o Parlamento rever o modelo do organismo, ao mesmo tempo que PCP e BE aproveitaram para sugerir a sua extinção.

O líder social-democrata já há um ano que tinha apontado tiques autoritários na actuação de António Costa sobre o Banco de Portugal - entidade independente – e ainda sobre o então Presidente da República Cavaco Silva, nos meses do pós-legislativas quando se formou a aliança parlamentar à esquerda. Passos Coelho assinalou então que o Governo em funções há poucos meses precisava "de comandar tudo e ter quem lhe obedeça”  -“quem discordar, a bem ou a mal, tem de mudar”.

Nessa altura, o líder parlamentar, Luís Montenegro, recuperou até “tempos da claustrofobia, da asfixia democrática” - usada primeiro por Paulo Rangel no Parlamento e depois por Ferreira Leite na campanha das legislativas de 2009 - a propósito das fortes críticas do PS ao Banco de Portugal, a propósito dos lesados do BES, mas também sobre “substituições sem critério” no Instituto de Emprego e Formação Profissional e ainda sobre um SMS de protesto enviado, em 2015, por António Costa a um director-adjunto do semanário Expresso.

A democracia voltaria a ser colocado na agenda pelo PSD já em Janeiro deste ano: o vice-presidente da bancada, Hugo Soares, considerou que a decisão do presidente da Assembleia da República, Ferro Rodrigues, de recusar o alargamento do âmbito da comissão de inquérito da Caixa Geral de Depósitos, colocava em causa “o regular funcionamento das instituições”.

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