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O ex-amigo americano regressa à Rússia depois de tentar torcer o braço a Putin

Secretário de Estado norte-americano, Rex Tillerson, é um velho amigo do país, mas inicia uma visita num momento de grande tensão entre os EUA e Moscovo.

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Rex Tillerson recebeu a medalha de amizade da Rússia em 2013 Max Rossi/Reuters

No dia 21 de Junho de 2013, o então presidente da gigante norte-americana Exxon Mobile foi a São Petersburgo receber uma medalha pela sua amizade com a Rússia, forjada em vários negócios no sector da energia desde os tempos de Boris Ieltsin. Quase quatro anos depois, Rex Tillerson regressa à Rússia esta terça-feira, mas desta vez vai vestido com o fato de secretário de Estado norte-americano, e nos bolsos leva uma agenda muito mais espinhosa do que se previa há apenas uma semana.

Apesar de a visita de Rex Tillerson à Rússia estar marcada há semanas, todos os assuntos vão empalidecer perante os 59 mísseis Tomahawk disparados pelos Estados Unidos contra a base síria de Shayrat, que é usada pela Força Aérea da Rússia e de onde terão levantado voo os aviões sírios que, segundo os Estados Unidos, lançaram um ataque químico na província de Idlib, matando 89 pessoas, incluindo crianças.

Mas se a ideia era confundir o inimigo com o ataque contra a base síria, a Administração Trump passou com distinção no teste, e o ministro dos Negócios Estrangeiros russo, Serguei Lavrov, deve estar entre as pessoas mais curiosas neste momento – afinal, a Casa Branca acha que o futuro de Bashar al-Assad na Síria depende apenas dos sírios, como defendia até terça-feira passada; está decidida a correr com ele do poder, como afirmou a partir de quarta-feira; ou acha que a prioridade é derrotar os extremistas do autoproclamado Estado Islâmico e depois contribuir para a realização de eleições nas quais Assad poderia participar, como indicou este fim-de-semana?

Seja qual for a estratégia a longo prazo da Administração Trump, o objectivo a curto prazo parece estar assegurado: o secretário de Estado norte-americano chega à Rússia com muito mais poder de negociação do que aquele que tinha no início da semana passada. Uma parte do mundo está agora convencida de que os Estados Unidos voltaram ao recreio para dar uma palmada nas mãos da Síria e, ao mesmo tempo, torcer o braço da Rússia, ao fim de anos de muitas palavras e pouca acção.

Descobrir o que vai na cabeça de Donald Trump e dos seus conselheiros e generais pode ser um exercício interessante, mas acabará sempre num beco sem saída, principalmente quando o que está em jogo é um quebra-cabeças do tamanho de todas as teorias da conspiração.

Para uns, basta somar a amizade entre Rex Tillerson e o todo-poderoso líder da Rosneft, Igor Sechin, às suspeitas de colaboração entre a campanha de Donald Trump e o Governo russo no ano passado para se chegar ao óbvio: isto foi tudo combinado entre eles e no fim ganha a indústria da venda de armas; para outros, Donald Trump não sabe o que anda a fazer (como nunca soube) e isto tudo foi uma birra para mostrar que sabe ser forte; e para muitos, o ataque à Síria não passa de uma manobra de diversão para distrair o público das acusações de colaboração com os russos e da historicamente baixa taxa de popularidade do Presidente norte-americano.

Há ainda outra versão, muito partilhada por vários líderes europeus e por pivôs de televisão e comentadores norte-americanos, não só da Fox News como também de canais como a MSNBC e a CNN: foi uma decisão certa e adequada, que só peca por tardia, perante os anos de atrocidades na guerra da Síria. Para o jornalista Fareed Zakaria, que até há pouco tempo não poupava críticas a Donald Trump, "há muitas razões para aplaudir a decisão de atacar o regime de Assad", e os mísseis disparados na semana passada "põem fim ao estranho flirt entre Donald Trump e Vladimir Putin".

Ataque com alcance limitado

Ninguém sabe ao certo o que irá o secretário de Estado norte-americano discutir com o ministro dos Negócios Estrangeiros russo, e ainda não se sabe se Rex Tillerson vai ser recebido por Vladimir Putin. Mas uma coisa é certa: quando Tillerson apertar a mão a Lavrov, vai fazê-lo com a mensagem de que os EUA se juntaram à multidão que larga mísseis em cima da Síria – a partir de agora, espera a Casa Branca, sírios, russos, iranianos e norte-coreanos sabem que Donald Trump não hesitará em carregar no botão.

O problema é que os ataques como o que foi lançado pelos Estados Unidos contra a Síria raramente alcançam objectivos duradouros – são uma punição, e é quase certo que o outro lado vai testar a determinação dos Estados Unidos, o que pode complicar a situação: um novo ataque limitado e contido será ineficaz, e não fazer nada será uma demonstração de fraqueza.

"Eles dizem que o objectivo foi a dissuasão – isso fica muito claro nas declarações do Departamento de Estado e do Presidente", disse ao site da revista The Atlantic o especialista em prevenção de conflitos Micah Zenko. "Mas acho que o motivo subjacente é a simples punição. É uma demonstração de força", diz Zenko, do Council on Foreign Relations.

"A consequência será um aprofundamento inevitável do envolvimento dos Estados Unidos na guerra civil", afirma. "O verdadeiro objectivo é punir Assad e, se tudo correr bem, impedi-lo de lançar mais ataques contra civis, seja com armas químicas ou não. É claro que ele fará tudo o que precisar para proteger o seu regime e os seus patronos de Teerão e de Moscovo. Nessa altura, Trump vai ser confrontado com esse cenário e vai perceber que [o ataque da semana passada] foi ineficaz como táctica de longo prazo", antecipa Micah Zenko, para quem o pior virá depois: "Ele pode, então, entender que a credibilidade dos Estados Unidos está em jogo e querer voltar a fazer qualquer coisa, e nessa altura terá de subir a parada e aumentar a ferocidade dos ataques. Será também preciso decidir se vão começar a atacar os patronos do regime de Assad – a Rússia e o Irão – ou se vão continuar a lançar ataques esporádicos."

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