Partido Socialista: o que falta fazer
Apesar dos avanços realizados, a posição do PS é ainda frágil.
O PS português é uma exceção nas democracias europeias, onde se assiste a uma crise geral dos partidos socialistas e social-democratas. Não só lidera um governo estável, que diminuiu o défice e cuja ação conseguiu combinar crescimento económico, políticas públicas de inclusão e igualdade e envolvimento ativo no projeto de construção europeia, mas também aprofundou a democracia portuguesa, ao permitir pela primeira vez a influência direta na governação dos partidos da esquerda radical (PCP, BE e PEV) e dos grupos sociais que estes representam.
Há pelo menos três causas para este desenvolvimento: a liderança inovadora de António Costa, com a recusa desde a sua candidatura às primárias do “arco da governação”; um padrão de protesto durante a intervenção da troika onde foi comum a colaboração entre novos (precários, pensionistas) e velhos movimentos sociais (sindicatos); e o reconhecimento pelo PS, PCP, BE e PEV de que enfrentavam uma direita que pela primeira vez rompia com a tradição constitucional estabelecida no pós-25 de Abril. E tudo isto cimentado por uma memória coletiva da revolução, que contribuiu muito mais para unir os portugueses do que para os dividir.
Apesar dos avanços realizados, a posição do PS é ainda frágil. Desde a volatilidade dos mercados financeiros internacionais, à incerteza da evolução europeia, passando pela ameaça populista dentro e fora da Europa (Trump) e pela solidificação de regimes autoritários (Rússia, Turquia), o futuro de Portugal é incerto e até perigoso. Claro que nada disto pode ser resolvido por Portugal sozinho. Mas é preciso também não esquecer que o PS teve menos votos que a direita nas últimas eleições legislativas. Há, assim, ainda muito a fazer para o PS solidificar a sua posição política, criar alianças que o enraízem mais na sociedade portuguesa, que tornem o seu projeto progressista duradouro, qualquer que seja a evolução política, seja ela favorável ou desfavorável, e que permitam resistir a uma eventual crise da democracia gerada pela incerteza política e económica internacional.
Em suma, o PS tem que passar de uma posição defensiva, onde procura o mínimo denominador comum com os partidos à sua esquerda, para uma posição ofensiva, em que se assume como o polo aglutinador de todas as forças progressistas da sociedade portuguesa. Como realizar este projeto?
Em primeiro lugar, estabelecendo-se como uma força viva e presente na vida quotidiana dos portugueses comuns. Não basta ativar a participação através dos media sociais e da Internet, de colocar todo o esforço mobilizador na televisão e orientar a sua estratégia pelas sondagens. Eleições ganhas exclusivamente desta forma nunca permitem criar identidades políticas duradouras nos cidadãos, o que facilita a volatilidade eleitoral e contribui para a futura reconquista do eleitorado, com o normal desgaste do poder, pela direita. É preciso um partido renovado, que reforce a sua presença em todo o território e que estabeleça ligações duradouras com a sociedade civil, tanto a nível local (escolas, cooperativas, associações, paróquias, IPSS) como nacional (sindicatos, movimentos de mulheres, igrejas, associações de imigrantes, precários, pensionistas, ambientalistas).
Em segundo lugar, ter um discurso dirigido à maioria dos cidadãos, às suas aspirações e esperanças. Isso significa um modelo de desenvolvimento orientado para a satisfação das necessidades básicas da população, como o trabalho decente, acesso à educação, à saúde, à habitação e a transportes públicos a preços acessíveis e de qualidade — e não adotar causas avulsas, como a chamada legalização da prostituição, que apenas contribuem para acentuar o capitalismo mais predatório. Claro que o PS não pode alhear-se de causas minoritárias e deve ousar apresentar propostas inovadoras. Mas deve geri-las procurando que não fraturem a sua base social de apoio. Os sucessos duradouros do socialismo democrático, hoje como no passado, resultaram sempre da ação de um grande movimento de massas, onde as classes médias e trabalhadoras se juntam numa mesma luta pela igualdade, pela domesticação dos mercados e pelo combate à exploração. Por isso, só um projeto político que defina como objetivo o combate às desigualdades de todos — e não a agregação acrítica de causas — pode fazer do PS uma verdadeira força tranquila e duradoura de mudança democrática na sociedade portuguesa. Os autores escrevem segundo as normas do novo Acordo Ortográfico