Comissão Europeia paga campanha contra eurocepticismo em Portugal
Iniciativa visa chamar a atenção da opinião pública para os investimentos europeus e divulgar o papel da UE no crescimento dos países e na criação de emprego.
Bruxelas não olhou para os dados como um obstáculo inultrapassável, pelo contrário: achou que havia margem para alterar a realidade que eles representam. Arregaçou as mangas e enfrentou os números revelado pelo inquérito que encomendou - estranhamente, não revela quando foi feito ao certo o trabalho de campo nem o que dizem, no caso português, 57% das respostas. Na parte relativa a Portugal, o que dizem os dados divulgados é que, se tivermos em conta o universo das pessoas com mais de 20 anos, há mais sentimentos "ambivalentes" em relação à União Europeia (UE) do que sentimentos positivos: 25% de um lado; 18% do outro. Ficamos, assim, sem saber que parte dos 57% de respostas omitidas dizem respeito a sentimentos claramente negativos face à UE ou a inquiridos que não souberam ou não quiseram responder. Apesar de "ambivalência" não significar indiferença, esta será a palavra mais próxima para traduzir a amálgama de sentimentos de um quarto daquela população face à UE. Ou indefinição. São pessoas que não têm opinião formada sobre a Europa. E é nesse vazio, ou espaço cinzento, que a Comissão Europeia quer actuar durante o próximo ano.
Perante este cenário, a Comissão Europeia decidiu que tinha de fazer algo e criou uma campanha, a InvestEU: quer fazer chegar uma mensagem às pessoas, a toda a gente, a quem anda pelas ruas todos os dias, mas também a quem se senta no Parlamento português. Quer dizer-lhes que a UE tem neste momento, e no âmbito do Plano Juncker, 500 mil milhões de euros para mobilizar e apoiar empresas em toda a Europa e que este é um dinheiro de que qualquer pessoa pode beneficiar, se tiver um projecto para candidatar.
Embora Portugal esteja abaixo da média europeia no que toca aos sentimentos ambivalentes em relação à Europa, não é novidade que há eurocépticos, eles estão aliás nos partidos que apoiam o Governo socialista. Há muito, e sobretudo com a escalada de austeridade na Grécia e com as difíceis negociações com a troika que até motivaram a realização de um referendo naquele país, que Bloco de Esquerda e PCP têm deixado bem claro o que pensam sobre a Europa e o euro. Para além de desiludidos com o projecto europeu, de desconfiados das boas intenções dos líderes europeus, mostram-se preocupados com as políticas impostas por Bruxelas e querem ver, no mínimo, Portugal preparado para sair do euro.
A mensagem que a Comissão Europeia quer espalhar por 14 países europeus, onde os sentimentos ambivalentes se destacam, não é uma resposta directa a estas vozes pouco europeístas dos partidos que apoiam o executivo socialista de António Costa, esse sim, defensor da ideia de Europa. Tem só a ver com os dados recolhidos pela empresa que elaborou este estudo, a Kantar, e que mostram que há vários países com sentimentos ambivalentes em relação à União Europeia. E foram esses países os escolhidos para serem alvo da campanha.
Quais serão, então, os países "intervencionados" a este nível? Por ordem de porevalência da ambivalência: acima da média europeia – que se situa nos 32% de sentimentos ambivalentes – estão a Finlândia (52%); a Holanda (51%); a Bélgica (47%); a França (41%); e a Letónia (36%).
Em Portugal, os sentimentos sobre Europa são menos ambivalentes do que a média e situam-se nos 25%. Acima de Portugal, estão ainda a Polónia (29%); a Grécia (28%); a Alemanha (27%) e a Espanha (26%). Abaixo estão a Bulgária (21%); a Hungria (18%); a Áustria (17) e a Itália (16%).
A campanha já arrancou em três países, durante o mês de Março: em França; na Bélgica; e na Alemanha. Nos restantes, irá para as ruas em Abril. Em Portugal, os contactos já estão a ser feitos. Estão a ser envolvidas pessoas ligadas a projectos, considerados de sucesso, que tenham sido financiados por fundos europeus. Por sucesso entende-se, por exemplo, terem contribuído para a criação de emprego. Podem ser empresas, autarquias, entre outras instituições.
São aquelas pessoas – empresários, académicos, autarcas – que, em Portugal, se pretende que se juntem à campanha e que sejam seus “embaixadores”. Na carta que lhes foi enviada a explicar a iniciativa, lia-se que a Comissão Europeia decidiu lançar uma campanha de comunicação pública em alguns Estados-membros para tentar “repor o conhecimento” acerca da contribuição da UE “na melhoria da qualidade de vida dos cidadãos europeus”. A campanha norteia-se, assim, por três grandes objectivos: “chamar a atenção da opinião pública para os investimentos europeus; divulgar o papel da UE no crescimento do país e na criação de emprego”; e “aumentar a confiança na própria Comissão Europeia”.
A estratégia que vai ser usada pela Comissão Europeia para espalhar a mensagem inclui outdoors nas ruas, gravação e difusão de vídeos com os responsáveis de projectos erguidos com fundos europeus e considerados de sucesso; e também a aposta nas redes sociais. A campanha durará até Março de 2018 e será acompanhada, durante parte do tempo, por outra, do PCP, pela saída do euro.