“Boas notícias sobre Dylan”: Academia vai finalmente entregar o Nobel este fim-de-semana

Dança de meses entre a Academia Sueca e o laureado com o Nobel da Literatura termina por ocasião da ida de Bob Dylan a Estocolmo para um concerto. Entrega será cerimónia "íntima" e sem jornalistas.

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Reuters

A Academia Sueca anunciou esta quarta-feira, através de uma mensagem da sua secretária perpétua, Sara Danius, que vai finalmente encontrar-se com Bob Dylan, o Nobel da Literatura que ainda não recolheu o seu prémio, neste próximo fim-de-semana. “A Academia entregará então o diploma do Nobel a Dylan e a medalha Nobel, e congratulá-lo-á pelo Prémio Nobel da Literatura” que lhe pertence desde Dezembro e em relação ao qual o cantautor tem sido esquivo. Tudo numa cerimónia "íntima" e sem jornalistas.

Num texto publicado no seu blogue, Sara Danius escreve que não haverá uma palestra Nobel, como é tradição, e que será a Academia a marcar presença num dos concertos de Bob Dylan na capital sueca – há duas actuações marcadas em Estocolmo, a 1 e 2 de Abril, e uma outra actuação, em Lund, no dia 9. “A Academia tem razões para acreditar que uma versão gravada [da palestra] será enviada posteriormente [à entrega do prémio]”, indica Danius. A referida comunicação, que pode ser um vídeo, uma canção ou uma mensagem em qualquer outro formato, é obrigatória para que o laureado receba formalmente não só o diploma e a medalha, mas também o cheque de oito milhões de coroas suecas (824 mil euros) a que corresponde o Nobel.

A mensagem da responsável, que ainda na segunda-feira tinha escrito no seu blogue oficial não ter havido “nenhuma conversa telefónica com Bob Dylan nos últimos meses”, lembra que, embora não sejam comuns, as lições do Nobel podem ser diferidas e apresentadas em formato de gravação. A mais recente palestra gravada, lembrou, foi a da escritora Alice Munro, em 2013

Sob o título “Good news about Dylan”, a Academia frisa que nada mais sabe sobre o formato da lição do cantautor norte-americano, e que “as boas notícias são que a Academia Sueca e Bob Dylan decidiram encontrar-se este fim-de-semana” num cenário "pequeno e íntimo", sem a presença dos média: "Só estarão presentes Bob Dylan e membros da Academia, tudo de acordo com os desejos de Dylan”, remata o breve post

Esta semana, a Academia tinha recordado que Dylan sabia que, segundo as regras, tinha até 10 de Junho para receber formalmente o prémio, a cuja cerimónia oficial de entrega, a 10 de Dezembro de 2016, faltou, no culminar de uma relação turbulenta com esta distinção. Anunciado a 13 de Outubro, o Nobel para o músico só foi reconhecido e agradecido pelo distinguido mais de duas semanas depois, pondo fim a uma primeira série de dúvidas sobre se Bob Dylan, nascido Robert Zimmerman, aceitaria sequer a honraria.

Meses mais tarde, e já depois de ter dito que não estaria a 10 de Dezembro em Estocolmo para a cerimónia do Nobel por ter “outros compromissos”, o autor de The times they are a-changin descreveu como demorou vários minutos a processar a notícia de que era o Nobel da Literatura. Demoraria depois mais de cinco meses a receber o próprio prémio, o primeiro entregue a um nome cuja principal actividade é a música e a escrita de canções, sucedendo a escritores como José Saramago, William Faulkner, George Bernard Shaw ou Albert Camus, ou Jean-Paul Sartre (que o rejeitou).

“Que eu agora faça parte dos nomes dessa lista é inexplicável”, disse no discurso que foi lido pela embaixadora dos Estados Unidos na Suécia, Azita Raji, durante o banquete anual do Nobel em Dezembro, quando estava ocupado com “outros compromissos”. Nessa cerimónia, Patti Smith interpretou, não sem alguns problemas causados pela emoção, A hard rain's a-gonna fall, de Bob Dylan. Os concertos de Dylan em Estocolmo, agendados antes do anúncio do prémio para o cantautor norte-americano, foram sendo apontados como potencial momento de encontro entre as partes que nunca mostraram crispação, mas, pelo menos do lado da Academia, algum desalento.

Bob Dylan, de 75 anos, criou “novas formas de expressão poéticas no quadro da grande tradição da música americana", defendeu a Academia, aprontando-se para as críticas de que foi alvo ao anunciar o prémio para um autor publicado mas ainda assim eminentemente músico, e logo da canção popular. Em Outubro, ao Telegraph, o músico fez as primeiras declarações públicas sobre a sua nova qualidade de Nobel e sobre as apreciações da Academia Sueca, admitindo que sim, "algumas das [suas] músicas — Blind Willie, The ballad of Hollis Brown, Joey, A hard rain, Hurricane, e algumas outras — definitivamente têm valor homérico". 

Entretanto, em vésperas da confirmação de que Bob Dylan sempre vai aceitar em mãos o Nobel, "abriu" em Tulsa, no estado de Oklahoma, o importante arquivo Bob Dylan, que permite a investigadores, mas também ao público autorizado, pesquisar a vida e a obra do cantautor através dos seus documentos, manuscritos, gravações e imagens. Para já trata-se de um recurso eminentemente online e consultável fisicamente sob pedido.

O arquivo foi comprado por um preço que, segundo a Rolling Stone, é estimado entre os 14 e os 18,5 milhões de euros e inclui mais de 6000 peças – os contratos, as cartas e os vídeos fazem parte também do espólio. No futuro, está prevista a exposição de peças seleccionadas no Bob Dylan Center, ainda por reabilitar em Tulsa e sem data prevista de inauguração. O arquivo servirá de base a dois livros já na forja, um sobre o período 1974-78 de Dylan e outro sobre a relação da sua música com a canção afro-americana. 

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