Homem terá matado a mulher em casa e depois abriu a porta aos bombeiros
Mulher apresentava sinais de ter sido agredida. Marido detido pela GNR foi levado para as instalações da Polícia Judiciária em Aveiro.
Um homem terá matado na tarde deste sábado a mulher, de 50 anos, com quem estava em casa, em Esmoriz, concelho de Ovar. A notícia foi avançada pelo Correio da Manhã e confirmada ao PÚBLICO pelo comandante dos Bombeiros de Esmoriz. O presumível agressor foi detido pela GNR ao início da tarde e levado para as instalações da Polícia Judiciária ao final do dia.
O filho de 20 anos não se encontrava na habitação e recebeu apoio psicólogo, segundo disse ao PÚBLICO o capitão Vítor Ribeiro, comandante do destacamento da GNR de Ovar. Momentos antes da chegada dos bombeiros, "várias testemunhas dizem ter ouvido os gritos" da mulher, que seria encontrada com sinais violência física além de golpes desferidos com uma faca, acrescenta.
Em Esmoriz, não havia denúncias por violência doméstica apresentadas pela vítima ou conhecimento de qualquer antecedente criminal do presumível agressor. “Não havia queixa nesta área de residência nem relatos de episódios de violência doméstica”, confirmou o capitão Vítor Ribeiro.
Quando o comandante e mais três elementos dos bombeiros chegaram à residência, a mulher estava em paragem cardiorrespiratória e apresentava sinais de ter sido esfaqueada. A arma, uma faca, foi apreendida. A Polícia Judiciária esteve durante a tarde na habitação a efectuar perícias, disse o comandante dos bombeiros Artur Ferreira.
Faltavam dez minutos para as 15h quando os bombeiros foram alertados via telefone para uma situação de violência doméstica numa residência em Esmoriz, distrito de Aveiro. "Não sei se eram vizinhos. Foram chamadas civis", diz Artur Ferreira, acrescentando que recebeu mais do que uma chamada.
"Eu e três colegas viemos para o local. À nossa chegada, o presumível agressor [o marido] abriu-nos a porta. A mulher estava estendida, inconsciente, em paragem cardiorespiratória e apresentava sinais de ter sido esfaqueada", disse. "O homem aparentava estar calmo. Não reagiu a nada em nenhum momento."
Os bombeiros iniciaram manobras de tentativa reanimação, durante 15 minutos, até à chegada das equipas do Instituto Nacional de Emergência Médica (INEM), que continuaram as tentativas de reanimação por mais 15 minutos. O óbito foi declarado pelas 15h30 pelo médico do INEM.
Faltam apoios para quem sobrevive
Para os filhos destes casais e os sobreviventes destas "perdas irreparáveis", como outros familiares ou a própria mulher que sobrevive a uma tentativa de homicídio, "não existe um apoio específico do Estado e devia existir", diz Elisabete Brasil, directora-executiva para a violência de género da UMAR (União de Mulheres Alternativa e Resposta), de que faz parte o Observatório das Mulheres Assassinadas, que todos os anos publica um estudo sobre a situação.
São pessoas que tentam ultrapassar a tragédia e "seguir em frente o melhor possível". Mas "seguir em frente o melhor possível" não chega a ser "seguir em frente bem", realça. "É também uma sobrevivência psicológica", diz. Por isso defende "um maior cuidado e um olhar minucioso" do Estado sobre este tipo de criminalidade "face aos impactos que um crime desta natureza tem pelas relações de grande proximidade existentes".
"Caminhou-se no sentido de perceber melhor os factores de risco e assim prevenir, mas ainda não se avançou no sentido de cuidar dos que ficam", realça. E refere o caso de "filhos que têm de se confrontar com um pai homicida" ou que ficam orfãos em situações em que o homicida se suicida. "É um tipo de crime que se distingue pelas relações envolvidas, que vai abalar toda a estrutura familiar, que vai deixar mazelas muito profundas", diz. "São actos de verdadeiro terrorismo doméstico", considera.
Elisabete Brasil recorda em particular o caso de um rapaz que procurou a UMAR já dois ou três anos depois de ter ficado orfão, quando o pai se suicidou depois de assassinar a mãe. "Ele não estava presente mas foi ele que os encontrou. Durante muito tempo andou a dormir fora, em casa de familiares. Não conseguia entrar em casa", continua Elisabete Brasil, que se lembra que este rapaz, então com 18 anos, solicitou a permuta da casa (de habitação social) para passar a residir numa outra, mas não o conseguiu. Cada vez que entrava em casa "era como uma repetição" do que vivera, mas o impacto nele tinha a mesma violência da "primeira vez".
Uma análise dos homicídios permite concluir que a maioria das mulheres assassinadas, em Portugal ou noutros países, são-no no contexto de intimidade, explica Elisabete Brasil. Só muito raramente surgem situações em que não houve queixa ou não era conhecido qualquer contexto de violência no lar. A maior parte dos casos acontece em situação de violência prolongada, acrescenta.
Este ano, com este caso de Esmoriz, já foram assassinadas quatro mulheres, diz ainda Elisabete Brasil ao PÚBLICO. Esses dados não incluem os homicídios de sexta-feira em Barcelos por não haver, nesses crimes, indícios de ligação entre o suspeito e as vítimas. A especialista refere duas mortes em Janeiro, uma em Fevereiro, e a morte deste sábado, que terão ocorrido num contexto de violência doméstica.