A atribuição do Prémio Pritzker de 2017 ao colectivo RCR encerra múltiplos significados.
O primeiro significado é cultural, e está explicito numa passagem do texto do júri do prémio, onde se afirma que Rafael Aranda, Carme Pigem e Ramon Vilalta "criam edifícios e lugares que são simultaneamente locais e universais". Esta capacidade de partir de um lugar específico para realizar uma arquitectura "universalista" – condição que, como se sabe, costumo ligar à arquitectura portuguesa (exposição-livro Les universalistes, Paris, 2016) – é própria de práticas arquitectónicas que, fugindo da banalização global ou da previsibilidade do star system, procuram teimosamente estabelecer uma relação crítica com vários tempos, culturas e geografias, na resposta a cada encomenda. Os RCR não têm feito outra coisa, tornando cada obra sua num momento único de arquitectura. É claro que há princípios construtivos e materiais que se repetem no seu percurso – o uso de pedras locais combinadas com superfícies em vidro e aço reciclado ou oxidado, afirmando a contemporaneidade do seu gesto –, mas, no final, cada projecto parece "pertencer" ao lugar que ajuda a consolidar. Considerando que os RCR não possuem edifícios de escala monumental, houve aqui uma clara intenção de enaltecer uma perspectiva do tipo "small is beautiful"; ou não fosse o australiano Glenn Murcutt o chairman do júri deste ano.
O segundo significado é de ordem interdisciplinar e envolve o conceito de "paisagem". Conscientes de que se trata de um termo totalmente artificial, os RCR assumem a construção da paisagem a partir da arquitectura, não sujeitando a sua prática aos estereótipos retóricos da "ecologia" ou da "sustentabilidade". Os seus edifícios assumem-se sempre como elementos artificiais em saudável tensão com os elementos naturais de suporte, "domesticando-os" ou "corrigindo-os" como só um arquitecto ousaria fazer.
O terceiro significado é metodológico. O Prémio Pritzker 2017 premeia o trabalho de um colectivo, enaltecendo uma forma organizativa que é cada vez mais comum, e que, em certo sentido, simboliza o fim de uma dinastia de galardões atribuídos a "estrelas" da arquitectura, isoladamente ou em pares, embora sempre marcadas por uma figura mais icónica.
O último significado é político. O único Prémio Pritzker espanhol era, até agora, pertencente a Rafael Moneo (1996), arquitecto navarro de enorme prestígio, mas que vem simbolizando o universo da encomenda e da prática fortemente centralizadas em/por Madrid. Ao premiar um colectivo do interior da Catalunha (Olot, Girona), o Prémio Pritzker olha para uma região ibérica profundamente ligada à história da arquitectura moderna e contemporânea europeia, de onde poderiam ter já saído muitos outros premiados. Esta é também uma forma de dizer que a Europa, hoje em crise identitária, também se faz dessas múltiplas diferenças.