A morte de Warhol poderá ter sido menos inexplicável do que julgávamos

No dia em que passam três décadas sobre a sua morte, o New York Times divulga o estudo de um cirurgião que defende que, ao contrário do noticiado à época, Warhol não morreu surpreendentemente depois de uma cirurgia de rotina. Estaria gravemente doente há cerca de um mês.

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Andy Warhol morreu a 22 de Fevereiro de 1987, com 58 anos DR

Faz esta quarta-feira precisamente 30 anos. Três décadas desde que Andy Warhol, o nome mais célebre da Pop Art, artista de actividade multifacetada (agradeçamos-lhe Velvet Underground & Nico ou o apoio a Basquiat), morreu surpreendentemente numa cama do New York Hospital, enquanto recuperava daquilo que fora noticiada como uma cirurgia de rotina para extrair a vesícula biliar. Assim foi noticiado à época e assim se passou a pensar a morte de Warhol, aos 58 anos. Como um acidente tão evitável quanto inexplicável. A verdade, porém, pode ser outra.

“Tratou-se de uma cirurgia de risco – não de rotina – numa pessoa muito doente”, defende John Ryan num artigo que o New York Times publicou esta terça-feira. Ryan, um historiador de medicina e cirurgião reformado, director de cirurgia emérito no Hospital Virginia Mason, em Seattle, começou a estudar o caso de Warhol há quatro anos, instigado pelo genro, Hal Foster, reconhecido investigador ligado ao universo da Pop Art.

O seu estudo do caso, que apresentou este domingo num encontro da Associação de Cirurgia da Costa do Pacífico, leva-o a concluir que, quando se submeteu à cirurgia que se revelaria fatal, Warhol estaria gravemente doente já há cerca de um mês. Ainda assim, o responsável pela operação, Bjorn Thorbjarnarson, teve de usar de toda a sua persuasão para convencer o paciente a submeter-se à mesma. Warhol sobrevivera quase milagrosamente a uma tentativa de assassinato em 1968, quando Valerie Solanas crivou o seu torso de balas (chegou a ser declarado morto na mesa de cirurgia), mas nunca recuperou totalmente. Comer uma refeição tornou-se tarefa difícil e os danos nos músculos abdominais provocaram uma grande hérnia com que teve de conviver a partir de então. Para além destes problemas crónicos, na altura da sua morte Warhol sofria da vesícula biliar, sem tratamento adequado, há 15 anos – uma questão familiar, digamos: o New York Times escreve que o pai de Warhol removera a vesícula biliar em 1928, o ano em que o filho nasceu.

A conhecida fobia a hospitais levou-o a adiar o máximo de tempo possível o tratamento. O seu acelerado ritmo de vida, a alimentação deficiente e as anfetaminas que tomava diariamente levaram a que, no dia da operação, Bjorn Thorbjarnarson se deparasse com um homem muito fragilizado, desidratado e doentiamente magro. Segundo o cirurgião, hoje com 95 anos, a vesícula biliar de Warhol, gangrenada, desfez-se em pedaços quando foi extraída. Além disso, devido às sequelas resultantes da tentativa de assassinato em 1968, o médico viu-se obrigado a reconstruir a cavidade abdominal do paciente. Ainda assim, na noite da operação, Warhol, aparentemente recuperado, podia ser visto a retomar a sua actividade habitual, contactando amigos por telefone. Às seis da manhã, porém, uma enfermeira encontrou-o sem vida no seu quarto. Fibrilação ventricular foi identificada como a causa da morte.

Ao contrário do noticiado à época, a morte súbita após uma cirurgia como aquela a que Warhol foi submetido, no estado de saúde em que se encontrava, não pode ser considerada evitável ou inexplicável. Warhol teve azar, mas devemos encará-lo, lemos no New York Times, que cita um especialista em cirurgia vascular, Stewart Redmond Walsh, como o azar de ser atropelado por um carro ao atravessar a rua, não o de ser atingido por um raio durante uma trovoada.

Que Andy Warhol poderia ter sobrevivido à operação, continua a ser uma evidência mesmo após a divulgação do novo estudo. Não foi, tragicamente, o que aconteceu naquele hospital nova-iorquino há 30 anos. Hoje, o nome maior da Pop Art continua ser celebrado como um verdadeiro ícone do século XX, cuja influência se estendeu a este que agora atravessamos. Prova disso mesmo é o facto de podermos “vê-lo” em directo minuto a minuto. Basta aceder a http://www.warhol.org/figment/. Desde 2013 que o site mantém ininterruptamente uma câmara apontada à campa de Warhol, forma de o vermos a ele e àqueles que o visitam para prestar homenagem, solenes, discretos ou exuberantes, entregues a performances ou de caixa Brillo na mão para deixar como recordação. Estamos certos de que Warhol muito apreciaria o gesto artístico.

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