Em Berlim, Hong Sang-soo está igual a si próprio

Não vale a pena resmungar por On The Beach at Night Alone ser mais do mesmo que o sul-coreano Hong Sang-soo sempre fez. Mas o novo filme não convence tanto como os anteriores.

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On The Beach at Night Alone DR
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Hong Sang-soo DR

Dizíamos nós no outro dia que "Kaurismäki mais Kaurismäki não há" a propósito de The Other Side of Hope, o mais recente filme do cineasta finlandês com uma estética pessoal e intransmissível, que tudo coloca como favorito para levar de Berlim o Urso de Ouro 2017. 

Não nos estávamos a lembrar de que, na competição desta 67.ª Berlinale, havia outro cineasta de quem se pode dizer o mesmo: Hong Sang-soo, o prolífero sul-coreano que, na prática, anda há vários anos a fazer variações sobre o tema ao longo dos seus filmes, e às vezes até dentro do mesmo filme (como em Noutro País, onde punha Isabelle Huppert a viver três histórias diferente num mesmo local). Ora mais cómico, ora mais dramático, mas sempre muito sossegado, muito zen, muito modesto, feito por tuta e meia em regime de completa liberdade, o cinema de Hong é uma espécie de "evolução na continuidade" onde cada filme está em permanente diálogo com o que fez antes. 

Exemplo prático: On The Beach at Night Alone, o opus 2017. Já tinha havido, em 2006, um filme chamado Woman on The Beach; aqui temos uma mulher sozinha na praia à noite. Como em quase todos os filmes de Hong, a chave emocional das suas personagens desvenda-se através do álcool (que aqui é mais a cerveja do que o soju), tudo se passa no mundo do cinema (a heroína Younghee é actriz) e há rimas e ressonâncias constantes com filmes anteriores (sonhos, repetições, remissões), para já não falar dos tradicionais zooms rápidos que resumem por si só a estética caseirinha dos filmes.

Sendo Hong Sang-soo puro – e , para citar o outro, Hong Sang-soo mais Hong Sang-soo não há –, On The Beach at Night Alone é menos simétrico e mais descompensado do que é habitual. Está dividido em duas partes, com genéricos específicos, directores de fotografia diferentes e elencos diferentes, com a actriz principal, Kim Min-hee, como única constante. Mas a primeira parte, com apenas 30 minutos, decorre numa cidade alemã que fica por nomear, onde Younghee foi passar algum tempo para ultrapassar um caso amoroso que teve com um realizador. Os restantes 70 minutos de filme têm lugar em Gangneung, na Coreia, onde Younghee – que está sempre a queixar-se de estar com fome –  encontra velhos amigos, uma equipa de filmagens e finalmente o realizador com quem teve o affaire. Tudo o que ficara algo opaco nos primeiros minutos se torna então mais legível, sobretudo depois de um jantar alcoolizado onde Younghee acaba por dizer, e saber, mais do que queria. 

Nada disto, por si só, é razão para sentirmos alguma decepção com o novo filme do sul-coreano – seria o mesmo que protestar junto da Trindade porque o molho do bife é o mesmo de sempre. On The Beach at Night Alone alegrará certamente os aficionados e dificilmente convencerá aqueles a quem o cinema de Hong nunca nada disse. Mas a sensação do novo filme, com a sua suave melancolia outonal, é a de um realizador a rodar um pouco em seco e preso no seu próprio labirinto à procura de uma porta que aqui não conseguiu encontrar – e não há mal nisso. 

Numa competição em que mesmo cineastas estimáveis se estatelaram ao comprido (é ver a reacção catastrófica a Return to Montauk, de Volker Schlöndorff, ou a indiferença que recebeu Bright Nights, de Thomas Arslan), teríamos gostado de gostar mais de On The Beach at Night Alone, terceira presença a concurso em Berlim de Hong depois de Noite e Dia (2008) e Nobody's Daughter Haewon (2013). E se Paul Verhoeven, presidente do júri, queria filmes que o surpreendessem, não é aqui que o vai encontrar. Se isso é bom ou mau, já fica ao critério de cada um.

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