Ministro da Saúde tenta travar demissões “irrevogáveis” no Centro Hospitalar do Algarve

Os médicos dizem-se “derrotados” pelo cansaço de tanto esperar por reforços humanos e financeiros. O investimento de 19 milhões para quatro anos, enfatizam, “pouco mais dá do que para não fechar a porta”.

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vr Virgílio Rodrigues

A subdirectora clínica do Centro Hospitalar do Algarve (CHA), Ana Lopes, e mais três directores de departamento anunciaram, em Dezembro, a demissão “irrevogável” dos seus cargos, alegando falta de condições. Esta segunda-feira, dia em que terminaria o prazo para se manterem em funções, o ministro da Saúde, Adalberto Campos Fernandes, chamou a Lisboa o conselho de administração do Centro Hospitalar do Algarve (CHA) e todos os responsáveis clínicos para procurar apaziguar o conflito. 

O bom atendimento nos hospitais do Algarve é um valor em queda livre desde 2011. “Temos na região um Serviço Nacional de Saúde (SNS) que está decrépito”, afirmou Ana Lopes, na semana passada, na Comissão parlamentar de Saúde durante uma audição convocada pelo CDS. Os dados apresentados pela Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS) em 2016, sublinhou, mostram que o Algarve apresenta “o pior resultado dos hospitais nacionais” no que diz respeito a demora para consultas, cirurgias em atraso e tempos de internamento.

O presidente do conselho de administração do CHA, contactado com pelo PÚBLICO, confirmou que a reunião, às 15h00, no Ministério da Saúde, “não tem agenda”, pelo que haverá oportunidade para fazer o diagnóstico de um hospital que os médicos dizem estar “moribundo”, sem grande margem para que seja salvo. Embora reconheça os maus resultados, o administrador destaca que houve “uma melhoria em 2016” e tem perspectivas de investimento já no primeiro trimestre.

O director do departamento de cirurgia, João Ildefonso,quando foi ouvido pelos deputados na passada quarta-feira, corroborou as críticas de Ana Lopes no que diz respeito à falta de equipamento e à existência de aparelhos obsoletos e avariados. E sublinhou: “Sentimo-nos derrotados.” Neste momento, disse, “há 9058 doentes a aguardar cirurgias, mas o mais grave é que 20% já ultrapassaram o tempo de espera máximo garantido e cerca de 10% estão há mais de 12 meses a aguardar cirurgias”. Por isso, declarou que o pedido de demissão é mesmo “irrevogável”, justificando o termo por se encontrar em ambiente político.

No ano passado, os hospitais públicos algarvios transferiram para clínicas privadas 50.675 doentes. A lista para consultas externas – só no departamento de cirurgia – chega aos 12.197 utentes.

De resto, foi a falta de recursos que obrigou a administração do CHA a celebrar acordos com o Hospital de Santa Maria, passando a transferir doentes nas áreas clínicas e cirúrgicas “Não trouxeram benefícios”, avaliou Ana Lopes. Por seu lado, João Ildefonso lembrou as novas unidades de cirurgia vascular, máxilo-facial e cardiotorácica prometidas, a partir de Setembro, e que ficaram esquecidas. “Estamos em Janeiro e não se vislumbra”. Quanto à falta de especialistas, lembrou que a ortopedia, que devia ter 22 especialistas, tem apenas 11 e, destes, seis têm mais de 55 anos, não estando por isso obrigados a fazer urgências. A este propósito, o director do departamento das urgências, Carlos Godinho, lembrou que, recentemente, este serviço esteve três dias seguidos sem médicos, tendo sido obrigado a transferir os doentes para o sector privado. Só por isso, sublinhou, seria motivo “mais do que suficiente" para se demitir. "Mas não o fiz, porque não quis tomar uma atitude isolada – esta é uma atitude conjunta”, disse.

O responsável pelo departamento de medicina, Pedro Leão Neves, sublinhou o “subinvestimento” e a saída de quadros para o sector privado. “Um oftalmologista que opere uma catarata por semana [no privado] ganha muito mais do que ganha num mês num hospital público”, exemplificou. O investimento de 19 milhões que o Ministério da Saúde anunciou para os próximos quatro anos, enfatizou, “pouco mais dá do que para não fechar a porta das instituições”. A recente criação do Centro Biomédico, em parceria com a Universidade do Algarve, destacou Ana Lopes, não terá futuro, se não houver recursos humanos, financeiros e tecnológicos. “Como é que pode haver um centro biomédico e conhecimento, se os hospitais estão moribundos?”

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