"Marcelo conseguiu recuperar a função presidencial", diz Sampaio da Nóvoa

Depois de um ano de silêncio, António Sampaio da Nóvoa faz um balanço, elogioso e crítico, do mandato de Marcelo Rebelo de Sousa, de quem foi o principal adversário.

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Sampaio da Nóvoa: "O ano que passou foi muito positivo para Portugal" Enric Vives-Rubio

Tem exactamente um ano a decisão de António Sampaio da Nóvoa de se manter afastado da ribalta. Foi na noite das eleições de 24 de Janeiro de 2016 - depois de ter visto esfumar-se a hipótese em que acreditou "até ao último minuto" de disputar uma segunda volta. No discurso da derrota que escreveu nessa noite - "fui eu que o fiz, é meu, vinha-me de dentro" - garantiu que Marcelo Rebelo de Sousa seria, a partir de então, o seu Presidente, "sem reticências". "Quem é democrata não pode deixar umas vírgulas ou umas reticiências..." Foi por isso também que, como explica na segunda parte desta entrevista, que será publicada nesta quarta-feira pelo PÚBLICO, não aceitou transformar a candidatura presidencial noutra coisa, como um novo movimento político.

O defensor do "tempo novo", onde cabia aquilo que é hoje o Governo de António Costa apoiado pela esquerda no Parlamento, dá a Marcelo o crédito de ser um factor de "estabilidade" na política interna. A principal crítica é surpreendente, por vir de alguém da esquerda: Marcelo tem sido pouco "equidistante", mas por alinhar mais com o Governo do que com os partidos que o apoiaram na campanha...

Não o surpreende esta coabitação mais ou menos idílica, este "bloco central de palácios" como lhe chamou Pedro Adão e Silva?
O ano que passou foi muito positivo para Portugal. E no plano político muito do que aconteceu deve-se à acção do Presidente. Ele teve, por exemplo, um papel junto das instâncias europeias que foi muito importante. Foi um papel que eu teria mais dificuldade em desempenhar, porque não tenho os galões da política nem os conhecimentos que nestas circunstâncias são importantes. Foi um papel que importa sublinhar.

O que lhe parece mais positivo?
A decisão de Marcelo Rebelo de Sousa, que acho que é totalmente genuína, da proximidade com as pessoas, do estar na rua e falar com as pessoas, tudo isso instaurou um clima de estabilidade política e de confiança que, a meu ver, é extraordinariamente positivo. Isso ajudou muito a revitalizar a função presidencial, que estava numa situação difícil - com muita gente a questionar o semipresidencialismo. Em muito pouco tempo, Marcelo Rebelo de Sousa conseguiu recuperar essa vertente presidencial do sistema.

Na campanha acreditava que Marcelo se iria aproximar mais das posições do PSD e do CDS, ou não?
Achei que havia esse risco. Hoje acho que se acontece nalgum momento é no sentido contrário. Um líder da oposição tem de ser tratado com a mesma dignidade de um primeiro-ministro.

E não tem visto isso?
Há momentos em que isso não se sentiu. Parece haver agora nas últimas declarações alguma correcção a esse rumo. Mas houve momentos em que essa equidistância me pareceu estar prejudicada.

O Presidente disse na entrevista à SIC que o ideal seria que tanto o Governo como as lideranças da oposição durassem o tempo da legislatura. Acha que ele o afirma por não acreditar que isso seja possível?
Não sei... Pode haver alguma correcção de rumo. E julgo que isso é positivo. A equidistância é o que verdadeiramente dá poder à função presidencial. O Presidente não tem que se misturar com os assuntos do Governo, nem da oposição. Espero que o mandato no futuro se desenvolva de uma forma mais distanciada e equidistante do que se desenvolveu neste primeiro ano. Até porque verdadeiramente o Governo não precisou de ter o Presidente a apoiá-lo. O Presidente deveria ter-se mantido mais equidistante nas suas posições.

Essa é a sua principal crítica?
Há um segundo aspecto: Da mesma maneira que sou muito favorável à ideia de proximidade, e que uma agenda muito carregada no dia-a-dia é a prova de uma grande generosidade pessoal e política, e isso é muito bom, já acho que uma  espécie de comentário permanente sobre todos os assuntos desgasta a palavra do Presidente. O Presidente não tem de ser o explicador de tudo, não tem de manhã, à tarde e à noite explicar às pessoas o que se passa na vida política, explicar as medidas do Governo. Julgo que isso não compete ao Presidente. O Presidente  deve ter a última palavra, mas para ter a última não pode ter todas...

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