Sindicato pede intervenção da ACT no caso dos professores sem salário
Dos três docentes que a Faculdade de Medicina Dentária da UP tinha chamado para dar aulas, só um assinou vínculo.
O Sindicato Nacional do Ensino Superior (Snesup) vai pedir a intervenção da Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT) para que seja averiguada a legalidade das contratações de docentes universitários que não recebem qualquer vencimento. Em causa estão casos como o de um docente da Faculdade de Medicina Dentária do Porto que a estrutura sindical diz ser “duplamente ilegal”. A universidade tem uma interpretação diferente.
“Vamos chamar a ACT para avaliar essa matéria”, avança ao PÚBLICO o presidente do Snesup, Gonçalo Velho, esperando que também a Inspecção-Geral da Educação e Ciência possa debruçar-se sobre alguns dos exemplos de abusos no recurso à contratação de docentes sem vencimento no ensino superior que foram registados pelo sindicato nas últimas semanas. Na terça-feira, no Parlamento, perante um pedido semelhante feito por deputados do Bloco de Esquerda, o ministro Manuel Heitor recusou haver matéria para intervenção da inspecção.
Um dos casos apontados pelo Snesup aconteceu na Faculdade de Medicina Dentária da Universidade do Porto (FMDUP). A instituição pretendia que três professores dessem aulas sem salário – como foi noticiado na semana passada pelo Jornal de Notícias. Desses, apenas um acabou por assinar o vínculo, informa agora fonte da Universidade do Porto (UP), um médico dentista contratado como assistente convidado.
Um caso na Universidade do Porto
Para o sindicato, essa contratação desrespeita o Estatuto da Carreira Docente Universitária (ECDU) e o Código do Trabalho. O primeiro documento prevê a figura dos contratos sem remuneração no âmbito de acordos de colaboração entre instituições ou para casos de professores que já têm um vínculo anterior a alguma outra universidade em Portugal ou no estrangeiro. Ora, segundo confirma a própria UP, o docente em causa não tinha nenhuma relação anterior com qualquer instituição de ensino.
Porém, a universidade defende que o facto de o professor ser um profissional da área faz com que cumpra os requisitos no Regulamento de Celebração de Contratos de Trabalho de Pessoal Docente da Universidade do Porto. Mais uma vez, a visão do Snesup é divergente. O regulamento interno da UP foi feito no âmbito do Código do Trabalho, mas essa lei não prevê contratos sem vencimento.
“Se a contratação foi feita ao abrigo do Código do Trabalho, então é irregular”, analisa o professor jubilado da Universidade de Coimbra Jorge Leite, especialista em direito laboral. “A retribuição é um elemento essencial de um contrato de trabalho”, acrescenta o mesmo catedrático, remetendo para o artigo 11.º dessa lei que define que o contrato de trabalho é sempre feito “mediante retribuição”.
A UP tem, porém, um entendimento diferente, considerando que o seu regulamento interno tem “um largo paralelismo com o ECDU, onde está também prevista a contratação sem remuneração”, afirma fonte da reitoria da instituição. O regulamento de contratação daquela universidade foi publicado em Diário da República em 2010 e revisto três anos depois. “Nem nessa altura, nem até este dia (quase quatro anos após publicação) foram levantadas quaisquer dúvidas sobre a adequação daquele artigo ao Código de Trabalho”, lê-se ainda na resposta por escrito dada às questões feitas pelo PÚBLICO.