Solução para o BES não agrada a lesados do Banif
Entre manifestações, processos judiciais e comissões de inquérito os lesados do Banif continuam onde estavam há 12 meses: à espera de receber o dinheiro perdido nas obrigações subordinadas do banco. Confiam em António Costa, criticam Santander, e torcem o nariz à solução avançada para o BES
Um ano, duas comissões de inquérito, três acções judiciais, duas mãos cheias de reuniões e incontáveis protestos depois, os lesados do Banif continuam à espera de recuperar o dinheiro investido em obrigações subordinadas.
Esta terça-feira, para assinalar a data em que o banco foi resolvido, regressam à rua. No Funchal e em Ponta Delgada, uma missa vai lembrar os que morreram com “problemas de saúde agravados” pelo desaparecimento abrupto das poupanças de uma “vida de trabalho”. Segue-se uma vigília junto da sede local do Santander. Em Lisboa, está também prevista uma acção de protesto, mas Jacinto Silva, presidente da Associação de Defesa dos Lesados do Banif (ALBOA), não adianta o que está a ser preparado.
“Se eu disser, iam tentar impedir-nos”, justifica ao PÚBLICO, garantindo que, como tem sido sempre, o protesto será pacífico.
Mas de protesto em protesto. De uma comissão de inquérito na Assembleia da República para outra no parlamento madeirense. Da acção judicial contra a resolução do banco, que decorre no Tribunal Administrativo e Fiscal de Ponta Delgada. De uma outra apresentada no Funchal, contra o Banif Finance. Ou da queixa-crime contra o director da TVI, Sérgio Figueiredo. O que fica? Uma promessa do primeiro-ministro e uma certeza: “O Santander não pode continuar a ter uma postura de arrogância e frieza perante este problema, até porque tem uma franquia comercial a defender”.
Em António Costa reside a “esperança” da ALBOA. Jacinto Silva está “certo” que o primeiro-ministro está “empenhado” na resolução do problema, mas rejeita uma solução como a que está a ser avançada para os lesados do BES, que deverão recuperar entre 50% a 75% do capital investido em papel comercial daquele banco. “A associação dificilmente aceitaria um acordo semelhante”, sublinha, dizendo que o único paralelo que existe entre o BES e o Banif é a obrigação do governo aplicar a equidade na resolução de ambos os casos. No resto, Jacinto Silva só vê diferenças.
O BES, argumenta o responsável pela ALBOA, era um banco privado que faliu, enquanto o Banif foi alvo de uma resolução por parte do Estado, numa altura em que o próprio Estado detinha 60% do capital. “Era praticamente um banco público”, diz. “Aliás, o peso que o Estado tinha no Banif foi um dos argumentos utilizados pelos gestores para impingir obrigações subordinadas aos clientes.”
O perfil dos lesados é também diferente, já que no caso do Banif perto de 90% dos associados não têm literacia financeira para saber onde estavam a colocar o dinheiro. “As pessoas foram enganadas. Aliciadas com uma taxa de juro mais elevada e com a garantia de que como o Estado era o acionista de referência, era um investimento seguro.”
Jacinto Silva sublinha ainda que em causa estão obrigações subordinadas, não papel comercial, e lembra que a o plano de recapitalização da Caixa Geral de Depósitos prevê a emissão de mil milhões de euros através desse mesmo produto financeiro. “Se não houver uma credibilização deste processo do Banif, como é que a Caixa vai conseguir colocar essas obrigações subordinadas?”, questiona.
E, se a solução BES não vai ao encontro das expectativas da ALBOA, o que é que os 1.360 associados pretendem? Querem sentar-se à mesa de forma construtiva e negociar uma resposta justa e equilibrada. Um bom início de conversa seria a proposta que o PÚBLICO deu conta em Setembro, e que saiu da Madeira. A ideia do presidente do governo regional, Miguel Albuquerque, passa pela criação de um fundo financiado pelo Santander ou pelo Estado em conjugação com um crédito fiscal em sede de IRS, de forma a ressarcir em dez anos todos os detentores de obrigações subordinadas do Banif.
Esse fundo cobriria 75% do capital investido, que seria utilizado na forma de um empréstimo sem juros para a aquisição de obrigações do Santander. Os restantes 25% seriam assegurados por um crédito fiscal, para que, ao fim de dez anos, todo investimento fosse recuperado. “É uma solução que agrada à Associação”, esclarece Jacinto Silva, admitindo que a intenção do governo não seja cobrir a totalidade das perdas.
“No meu ponto de vista, e falo agora a título pessoal, numa negociação há sempre cedências de parte a parte. Mas não abdicamos de uma solução equilibrada.”
A ALBOA representa entre 100 a 120 milhões de euros, de um total que ronda os 300 milhões de euros em obrigações subordinadas. Jacinto Silva explica que o número de associados não para de subir, embora muitas pessoas ainda sintam vergonha em admitir que foram enganadas.
É para evitar que isto volta a acontecer, que a Associação entregou já na Assembleia da República uma petição pública, com 4.400 assinaturas, defendendo mais rigor na forma como são desenhados os perfis dos investidores financeiros. “Não queremos que isto, aconteça a mais ninguém.”