Álvaro Siza: "O museu da prisão é uma coisa absolutamente primária"
Autor de uma pousada nunca construída para a Fortaleza de Peniche, diz que um arquitecto não pode decidir sozinho o que fazer neste monumento.
O arquitecto Álvaro Siza explica os contornos do projecto que desenhou para a pousada de Peniche, datado de 2002-2003. Uma encomenda da Enatur, herdada pelo Grupo Pestana, que nunca chegou a ser concretizada. A conversa teve lugar antes de a Fortaleza de Peniche ter saído do Programa Revive, que vai concessionar uma série de monumentos nacionais degradados a privados tendo em vista a sua recuperação.
Para instalar o hotel no espaço dos pavilhões A e B nunca esteve em cima da mesa fazer uma reabilitação? Por exemplo, ocupar celas do espaço prisional?
Não. Há edifícios que decidi demolir, porque não tinham interesse ou porque eram acrescentos mal feitos para uma ampliação da cadeia. Havia um que era uma enorme cantina horrível.
Nunca lhe foi pedida a reabilitação dos pavilhões A e B?
Não. Discutiu-se muito o facto de haver ali a memória da prisão. Falou-se com a câmara da necessidade de não limitar para construir a pousada, mas também de encontrar [mais tarde] uma solução para o museu da prisão que está muito mal.
Porquê?
É uma coisa horrível. Tem uma simulação dos presos com manequins, é uma coisa absolutamente primária, um bocado macabra mesmo.
Os edifícios que vão abaixo não lhe põem questões de necessidade de preservação?
Isso é um problema e pu-lo logo de início. Porque a prisão de Peniche é uma memória fundamental no Portugal de hoje. Como é que se vai fazer aqui uma pousada? Responderam que a decisão era essa, mas [que se iria] manter o essencial.
Passados estes anos todos, como é que olha para o projecto? Acha que ele continua a fazer sentido?
Para mim o problema latente continua a ser o mesmo. Está bem fazer uma pousada para turismo num sítio onde está a prisão de Peniche?
Como é que esse problema deve ser abordado?
Com toda a transparência, de forma estudada, participada, debatida. Não pode o arquitecto pôr nisso apenas a sua opinião pessoal, de maneira nenhuma, porque é um assunto que implica um debate muito alargado das forças políticas.
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