Um puzzle com um buraco e outro com peças sobrepostas
São dois quebra-cabeças diferentes aqueles que Rui Vitória e Jorge Jesus têm em mãos, mas ambos expuseram (mais uma vez) as suas fragilidades ao longo desta semana.
O Natal está à porta e, com ele, o tradicional momento de definição da época desportiva. No caso, não é o título decorativo de campeão de Inverno que desperta interesse, mas perceber o que se pode esperar dos grandes candidatos de agora em diante. A poucas semanas do final do ano, o derby da 13.ª jornada carrega aos ombros a possibilidade de uma mudança de líder num momento delicado para Benfica e Sporting, o momento em que se impõem correcções instantâneas.
São dois quebra-cabeças diferentes aqueles que Rui Vitória e Jorge Jesus têm em mãos, mas ambos expuseram (mais uma vez) as suas fragilidades ao longo desta semana. De um lado, uma ideia de jogo que fica por vezes refém do sistema utilizado; do outro, um conjunto de experiências, estruturais mas também de aposta em novos intérpretes, que muitas vezes ameaça uma identidade que parecia sedimentada.
Comecemos pelo Benfica, anfitrião de um jogo em que tentará, uma vez mais, contrariar a ideia de ser um campeão demasiado débil no braço-de-ferro com rivais directos. O reposicionamento de Pizzi no miolo, mudança operada pouco depois do arranque da época, parecia ter resolvido um problema bicudo, que — depois da saída de Renato Sanches — se prendia com a incapacidade para tomar as melhores decisões a partir do corredor central. O médio transmontano é inteligente com e sem bola, capaz de circular com cautela ou de explorar a profundidade com passes para as costas da defesa, e um dínamo eficaz nos jogos que o Benfica comanda. Ou seja, é uma solução adequada para mais de 90% dos jogos da Liga portuguesa.
Acontece que o Sporting se enquadra nos restantes 10% dos adversários, no lote daqueles que também gostam de dominar através da posse, daqueles que sabem pressionar alto e reagir ferozmente à perda da bola. Mais: é provavelmente a equipa que melhor trabalha o jogo interior, ofensivamente falando, o que acarreta dores de cabeça adicionais para um Benfica a precisar de um terceiro médio, em organização e transição defensivas, que raramente surge.
Não foi só frente ao Nápoles que os “encarnados” revelaram o buraco que persiste na faixa central do seu puzzle. Já com o Besiktas e com o Marítimo ele tinha sido posto a nú. Quando Fejsa se revela insuficiente para as encomendas, o esforço e a qualidade de posicionamento de Pizzi não bastam para equilibrar a balança. No 4-4-2 muito aberto em que o Benfica opera, com Salvio e Cervi sempre muito por fora, os movimentos de arrastamento de Gonçalo Guedes aos centrais deixam, amiúde, aquele que poderia funcionar como terceiro médio perdido em zonas longínquas e incapaz de recuperar rapidamente a posição, no eixo.
Este problema agudiza-se frente a rivais com executantes de qualidade extra e torna-se mais visível se o adversário se organizar num sistema em que tenha superioridade numérica na zona central. É verdade que, no papel, não tem sido o caso do Sporting, que até rompeu com a lógica e se aventurou no encontro com o Legia num inesperado 3-4-3 (para depois corrigir para 4-1-4-1 e voltar ao costumeiro 4-4-2), mas o processo ofensivo dos “leões” é especialmente capaz graças às trocas que surgem no miolo.
Nesse particular, as diagonais interiores de Gelson Martins e os apoios frequentes ao portador da bola dados por Bryan Ruiz ou Bruno César garantem, em teoria, uma supremacia numérica do Sporting nessa zona do terreno, que Rui Vitória terá de compensar de alguma forma (Samaris é uma possibilidade) se não quiser perder uma área nevrálgica.
A essa força motriz do Sporting, que tem no momento da organização ofensiva provavelmente o seu atributo mais notável, Jesus terá de acrescentar, porém, a estabilidade que tem faltado. Depois de Dortmund (onde a opção era justificada à luz do potencial ofensivo do rival e das contas do apuramento na Champions, ainda em aberto), a repetição da solução dos três centrais em Varsóvia provou trazer mais contras do que prós.
Para além da dificuldade que a equipa manifestou em formar a última linha (Ruben Semedo e Paulo Oliveira falharam algumas vezes o posicionamento), foram óbvias as lacunas na elaboração de jogo pelos corredores, especialmente quando Bruno César derivou para... ala direito. Até porque Gelson estava desaparecido em terrenos interiores e longe do seu habitat.
É neste contexto que o Sporting procurará, provavelmente, voltar à casa da partida e à fórmula original (independentemente de quem vier a ser, por exemplo, o segundo avançado), enquanto o Benfica terá o desafio de encontrar um compromisso entre as arrancadas a todo o vapor dos extremos (com Salvio à cabeça) e os equilíbrios defensivos.