Portugal não aproveitou 28 milhões de euros em alimentos, mas ainda pode usá-los

O Governo de António Costa não executou o programa, deixando assim escapar a ajuda do projecto europeu.

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Instituições portuguesas já se queixaram que este ano não irão receber apoio Nuno Ferreira Santos/Arquivo

O Governo não aproveitou este ano 28 milhões de euros de fundos comunitários de ajuda à erradicação da pobreza porque não executou o Fundo Europeu de Auxílio às Pessoas Mais Carenciadas. Esta sexta-feira, o Jornal de Notícias  cita fonte de uma das instituições parceiras para notar que faltam coisas “tão simples como abrir concursos ou regulamentar os mesmos”. Contudo, o ministro da Segurança Social, Vieira da Silva, alegou esta manhã que os fundos não estão perdidos porque o programa não impõe uma regra temporal de execução, ou seja, o dinheiro continua disponível para ser usado em anos futuros. 

"Todo o montante financeiro disponível para este programa pode ser executado no quadro temporal do Portugal 2020", sustentou o ministro, questionado à margem de uma conferência sobre corrupção, em Lisboa. O governante reconheceu que Portugal não usou de facto esse montante a que tinha acesso durante 2016, por ainda estar a adaptar-se às novas regras de utilização dos fundos, mas insistiu que o país não perdeu direito ao dinheiro, que poderá usar ainda "num dia futuro". 

O Fundo Europeu de Auxílio às Pessoas mais Carenciadas foi aprovado em 2013 e publicado em 2014 para substituir o anterior Programa Comunitário de Ajuda Alimentar a Carenciados, visando apoiar instituições de solidariedade na distribuição de alimentos. A dotação prevista para cada ano é de 28 milhões de euros, incluindo comparticipação nacional.

Porém, e como explicou ao PÚBLICO o secretário-geral da Federação Portuguesa de Bancos Alimentares (FPBA), Manuel Paisana, 2014 foi para a maioria dos Estados-membros um ano de transição do anterior programa, pelo que o Governo de então conseguiu accionar 10 milhões de euros daquele fundo, mesmo não o tendo operacionalizado como previsto. No ano seguinte, em 2015, "sucedeu o mesmo ". Em 2016, porém, "já era difícil alegar que se estava em transição e acabou por não ter sido distribuída nenhuma ajuda alimentar", acrescentou Paisana.

"Em 2014 e 2015 [o programa] pôde funcionar sob regras que eram próprias e um pouco mais ligeiras do que as do modelo anterior, que durou até 2013, sendo que a partir daí, para ter acesso a esses fundos, foi necessário construir um novo modelo, mais exigente, com um sistema de informação mais exigente que pudesse acompanhar desde a compra do alimento até ao beneficiário final", explicitou, por seu turno, Vieira da Silva. 

O secretário-geral da FPBA concorda com Vieira da Silva quando este diz que o dinheiro não está perdido. "Pensamos que é possível, a exemplo de outros programas comunitários, haver mais um ano ou dois no fim do programa para recuperar o dinheiro que ficou por utilizar em cada um dos anos", anui.

O problema, porém, "é que a fome não espera" e Manuel Paisana diz temer que o país tenha de aguardar ainda largos meses por essa ajuda. "O programa operacional e a portaria foram aprovados, mas, tanto quanto sabemos, falta operacionalizar o sistema informático e alguma regulamentação. Por outro lado, um concurso internacional para aquisição de alimentos demora no mínimo três ou quatro meses. Será possível recuperar algum deste dinheiro em 2017, mas será dificil e isso não acontecerá seguramente no primeiro trimestre". 

Uma vez adquiridos ao abrigo deste programa os alimentos são distribuídos por instituições como o Banco Alimentar e a AMI (Assistência Médica Internacional). Fernando Nobre, presidente da AMI, afirmou em declarações ao JN que, no ano passado, a organização recebeu "uma pequena remessa" mas que em 2016 "não se vislumbra coisa nenhuma".

Como a AMI, as restantes instituições redistributivas tiveram este ano menos alimentos para entregar aos mais carenciados, sendo que continuaram a contar, por exemplo, com os géneros recolhidos em campanhas como a que o Banco Alimentar promove todos os anos.  

Citada pela Lusa, a presidente do CDS-PP, Assunção Cristas, disse nesta sexta-feira que as explicações do ministro Vieira da Silva sobre as verbas do Fundo "não colhem". "Para o CDS, as explicações do ministro Vieira da Silva em relação às verbas que não estão a ser aplicadas do Fundo Europeu de Auxílio às Pessoas Mais Carenciadas são explicações que não colhem. Na verdade, aquilo que mais importa às pessoas que recebem alimentos por esta via é ter a garantia de que neste ano continuarão a receber" alimentos através dessa verba, declarou a centrista em palavras aos jornalistas em Lisboa, na sede do partido.

O Fundo de Auxílio Europeu às Pessoas mais Carenciadas apoia medidas dos países da União Europeia que visem prestar assistência material às pessoas mais necessitadas. As medidas de assistência material englobam, nomeadamente, a distribuição de alimentos, roupa e outros artigos de uso pessoal, como calçado ou sabão. Mais de 3,8 mil milhões de euros foram afectados a este fundo para o período de 2014 a 2020, aos quais os Estados-membros podem candidatar-se. Além disso, os países têm de cofinanciar, pelo menos, 15% dos programas nacionais que adoptem.

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As entidades nacionais podem adquirir elas próprias os alimentos e os artigos e fornecê-los às organizações parceiras (ONG, por exemplo) ou financiar as organizações para que estas o façam. A cada mês de Junho devem apresentar à Comissão Europeia um relatório sobre a execução dos programas que levam a cabo.

Notícia actualizada às 13h47 com as declarações do secretário-geral da FPBA, Manuel Paisana 

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