Matteo Renzi demite-se após derrota no referendo

O primeiro-ministro italiano defende que "quando se perde, não se finge que não aconteceu nada".

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Renzi durante o discurso em que apresentou a demissão AFP/Andreas SOLARO
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Renzi chegou à chefia do governo em 2014 Stefano Rellandini/Reuters

"Acredito na democracia. Por isso, quando se perde, não se finge que não aconteceu nada", disse Matteo Renzi, falando em directo aos italianos a partir do palácio do Governo. 

"Demos aos italianos uma oportunidade de mudança. Era uma oportunidade simples e clara", defendeu, falando sobre a reforma constitucional chumbada este domingo em referendo. "Mas não conseguimos obter a confiança dos nossos compatriotas. Todas as responsabilidades são minhas. Perdi eu."

Renzi anunciara que se demitiria caso estas mudanças à Constituição - que alteravam essencialmente os poderes das duas câmaras do Parlamento, diminuindo os do Senado e reforçando os da Câmara dos Deputados, assim como o executivo - não fossem aprovadas. "O meu Governo termina hoje e eu demito-me."

"Eu perdi", repetiu o líder do Partido Democrático, de centro-esquerda, quando eram 00h30 em Itália, hora e meia depois do encerramento das urnas. "Na política italiana nunca ninguém perde. Depois de uma eleição, pode ganhar-se ou não, mas nunca ninguém assume ter perdido." Pois Renzi diz querer ser diferente, num discurso em que não fechou a porta a um regresso.

"Chegará o dia em que voltaremos a festejar uma vitória. E nesse dia, vamos recordar as lágrimas", continuou o político de 41 anos, um líder jovem num país onde os políticos costumam manter-se no activo até uma idade bastante avançada. Silvio Berlusconi, por exemplo, que acaba de anunciar o "regresso pleno" à liderança do seu partido, a Força Itália, tem 80 anos.

Quando estavam escrutinadas 51,100 das 63,100 secções de voto, o "não" tinha 59,6% (15,5 milhões de votos), enquanto o "sim" reunia 40,4% (perto de 10,5 milhões de votos).

Numa intervenção em que explicou que segunda-feira vai apresentar a sua demissão ao Presidente, Sergio Mattarella, Renzi defendeu ainda os seus menos de três anos de governação. E disse-se orgulhoso de Itália, "o país mais belo do mundo".

Criticou ainda a oposição, que fez toda campanha pelo "não". "Fazer política contra alguém é muito fácil, fazer política por qualquer coisa é mais bonito."

O chefe de Estado vai aceitar a demissão de Renzi e em seguida consultar os partidos com grupo parlamentar, onde se inclui o Movimento 5 Estrelas, o partido anti-partidos de Beppe Grillo, que já controla câmaras como as de Roma e morde os calcanhares do Partido Democrático, de Renzi, nas sondagens.

Conhece-se a vontade de Mattarella e do PD, e sabe-se que o Força Itália irá com grande probabilidade aceitar essa solução: um governo técnico para assegurar a liderança até 2018, quando está prevista a realização de legislativas. No mandato desse governo vai incluir-se o encargo de elaborar uma nova lei eleitoral - a actual, em vigor desde Julho, está prestes a ser considerada ilegal pelo Tribunal Constitucional.

Quem se segue?

Se a derrota tivesse sido menos significativa, ou a participação tivesse sido baixa (foi de 68%), Mattarella podia reconduzir Renzi. Assim, os nomes mais referidos são o do ministro das Finanças, Pier Carlo Padoan, e o do presidente do Senado, Pietro Grasso, ex-magistrado anti-corrupção. Padoan é um economista que já foi director do Fundo Monetário Internacional para a Itália.

Recorde-se que esta solução não é inédita. Há cinco anos, Berlusconi era afastado sem eleições e substituído por Mario Monti, economista e ex-comissário europeu, à frente de um governo de tecnocratas.

Renzi, aliás, também não chegou ao poder em eleições, mas através de um voto no interior do partido, em que retirou a confiança ao então primeiro-ministro, Enrico Letta, em Fevereiro de 2014, um ano depois das últimas legislativas. 

Na abertura dos mercados asiáticos, o euro caía para 1,0506 dólares, o valor mais baixo em 20 meses ou desde Março de 2015 (quando esteve nos 1,0458). Na sexta-feira, Padoan tentou acalmar os mercados garantindo que “não há risco de terramoto financeiro” e antecipando em caso de vitória do “não” “umas 48 horas de turbulência”.

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