Abriu a caça a Marine Le Pen
François Fillon, candidato escolhido pela direita francesa na corrida ao Eliseu, tem um perfil conservador, católico e burguês, mas apresenta-se como um reformador com uma proposta liberal para reduzir o tamanho do Estado francês. Foi escolhido não por ser o melhor candidato a Presidente, mas por ser a melhor aposta para combater a candidata da Frente Nacional. Não é por acaso: Fillon vai disputar o espaço de Le Pen e para isso apresenta propostas que replicam algumas das sua bandeiras. Mas já há pouco a disfarçar: Marine é a principal figura da eleição francesa da Primavera. O candidato que a direita escolheu até pode ser agora o favorito nas sondagens — se é que elas ainda valem alguma coisa como indicadoras do voto —, mas o esforço de todos os partidos será concentrado no combate ao crescimento da plataforma de apoio da Frente Nacional.
Não, Marine Le Pen não é o bicho papão. Mas é uma política demagógica atrelada a ideias políticas que são muito perigosas. A sua campanha tem o mesmo apelo da de Trump: uma aposta no medo e na ansiedade provocados pelo terrorismo, pela imigração, pela perda da identidade e pela fragilidade económica face à globalização. Uma vitória de Le Pen será a confirmação dos nacionalismos que cruzam a Europa, e que ainda esta semana poderá dar origem a um presidente de extrema-direita na Áustria. Mas é em França que se joga aquele que poderá ser o derradeiro ponto de rotura na deriva populista europeia.
Uma França de Le Pen será mais nacionalista, com uma política securitária que ajudará a popularizar os racismos mais ou menos encapotados na sociedade francesa. Será também, de forma quase inevitável, o enterro da União Europeia. Começará pela saída do euro, que é uma promessa de campanha assumida; continuará pela tentativa de retirada do clube europeu, através de um referendo em que o medo do futuro pode ser tão decisivo como foi no Reino Unido. O fim do vínculo europeu francês seria o golpe final numa União já enfraquecida pelo “Brexit” — e Portugal seria um dos que mais perderiam neste cenário.
À direita Fillon, à esquerda Manuel Valls, François Hollande ou Emmanuel Macron: um deles deverá disputar a segunda volta das presidenciais com Marine Le Pen. Têm em comum o facto de serem um produto das democracias tradicionais e das sociedades abertas do Ocidente. Será portanto ainda uma candidatura liberal a dar a cara na luta contra o extremismo populista — mas já não há garantias de vitória.