As 634 (ou mais) maneiras de tentar matar Castro
De charutos explosivos a ostras armadilhadas, a CIA e os exilados cubanos nos EUA delinearam, durante meio século, todo o tipo de planos para tirar a vida a El Comandante.
Dos famosos charutos explosivos ao veneno deitado numa taça de gelado, a CIA e os grupos de cubanos no exílio passaram 50 anos a inventar maneiras de matar Fidel Castro. Nenhum plano foi bem sucedido, mas um dos seus leais seguranças estima em 634 as tentativas de atentado – algumas ridículas, outras mortalmente sérias – feitas para tirar a vida a El Comandante.
Numa ocasião, avisada de que Castro era um entusiástico mergulhador, a CIA desenvolveu um plano astuto. Documentos revelados durante a administração Clinton comprovam que a agência norte-americana investiu num enorme volume de moluscos com vista e encontrar uma concha suficientemente grande para conter uma quantidade letal de explosivos. A ideia era pintar os moluscos de cores vivas para atrair a atenção de Castro debaixo de água.
Este plano terá sido abandonado enquanto se desenvolvia um outro que passava por preparar um fato de mergulho infectado com um fungo que iria provocar uma doença de pele debilitante.
Fabian Escalante, chefe dos serviços secretos cubanos no auge das tentativas da CIA e de uma comunidade de exilados cada vez mais desesperada para assassinar Castro reformado em 1996, relatou as tentativas no livro Acção Executiva: 634 maneiras de matar Castro. A obra deu origem a um filme da rede de televisão britânica Canal 4 em 2007, quase com o mesmo título: 638 maneiras de matar Castro.
O efeito da lua cheia sobre um lobisomem
A obsessão por parte da CIA e dos exilados seus aliados têm como paralelo moderno a perseguição a Osama Bin Laden. Como Wayne Smith, o antigo chefe da secção de interesses norte-americanos em Havana, disse há anos: “Cuba parece ter o mesmo efeito na administração norte-americana que uma lua cheia num lobisomem. Podemos não uivar nem nos crescer cabelo, mas comportamo-nos da mesma forma”.
As tentativas de homicídio começaram na presidência de Dwight Eisenhower e continuaram nas administrações de John F Kennedy e Lyndon Johnson, mas foi durante o mandato de Richard Nixon que se registaram o maior número de sempre: 184. Muitos dos atentados foram preparados sem o conhecimento dos Presidentes, mas planeados pelos exilados cubanos, muitas vezes com a ajuda da CIA.
Os planos começaram imediatamente após a revolução cubana de 1959. Em 1961, quando os exilados cubanos com o apoio do Governo dos EUA tentaram derrubá-lo na Baía dos Porcos, o plano era assassinar Fidel e Raúl Castro juntamente com Che Guevara, conta o jornal britânico The Guardian. Na altura, parecia que os serviços de segurança americanos estavam mais interessados em decepar a cabeça do estado cubano do que proteger a sua própria: no mesmo dia em que Kennedy foi assassinado, em 1963, um agente secreto a quem tinha sido dada uma seringa em forma de caneta foi enviado numa missão para matar Castro.
Os planos pareciam saídos dos enredos dos filmes de James Bond, incluindo os famosos charutos explosivos que era suposto terem sido oferecidos ao chefe da revolução cubana quando este visitou Nova Iorque. Outra ideia era contaminar um charuto com toxina botulímica, um potente veneno mortal (também conhecido como botox, usado em pequeníssimas doses para fins terapêuticos e cosméticos). Mas estes charutos nunca chegaram às mãos de Fidel até ele ter deixado de fumar, em 1985.
Outra tentativa passou por contratar uma ex-amante a quem a CIA entregou pílulas de veneno que ela deveria deitar numa taça de gelado. Os comprimidos derreteram-se e a mulher percebeu que não resultaria tentar metê-las à força na boca de Fidel enquanto ele dormia. Segundo relatou, Castro adivinhou as suas intenções e ofereceu-lhe a sua própria pistola para que ela pudesse terminar o trabalho. “Não posso fazer isto, Fidel”, respondeu-lhe.
As operações da CIA continuaram com testes com bactérias venenosas que seriam vertidas no seu chá ou café, um chafariz tóxico, um batido de chocolate envenenado com botulina que seria servido no antigo Havana Hilton. Houve até um plano não mortal que passaria por desacreditar o chefe de Estado deitando-lhe um spray com LSD durante a gravação de um programa de rádio que, supostamente, o iria expor a uma humilhação nacional quando fosse para o ar.
“Eu tenho um colete moral”
As mais sérias tentativas de assassinato aconteceram quando Fidel Castro viajava para o estrangeiro. Já no ano 2000, durante a sua visita ao Canadá, foi abortado um plano que consistia em colocar 90 quilos de explosivos debaixo do palco onde iria discursar. Mas o seu corpo de segurança pessoal fez as suas próprias verificações antes dele chegar e pôs fim ao atentado.
Quatro homens, incluindo Luis Posada, um veterano cubano no exílio e operacional da CIA, foram presos na sequência deste incidente e mais tarde perdoados e libertados. Posada retirou-se para a Florida, onde vive a maior parte da comunidade cubana exilada, e mais tarde enfrentou acusações – que rejeitou – de ter sido um dos autores do atentado que fez explodir um avião cubano em 1976 no qual morreram 78 pessoas.
Além de recorrer aos seus próprios operacionais e a resistentes ao regime cubano, a CIA também tentou recorrer a figuras do submundo da máfia americana para consumar o homicídio. Uma vez, um suposto atirador foi apanhado junto à Universidade de Havana. Outra, um ataque à granada foi abortado durante um jogo de basebol.
Oficialmente, os Estados Unidos substituiram as tentativas de homicídio pelo embargo a Cuba como esforço para destituir Castro. No entanto, a segurança cubana continuou a desconfiar de ofertas enviadas por estrangeiros “bem intencionados”, a usar duplos para confundir potenciais assassinos e a fazer circular Fidel pelo país constantemente.
Questionado uma vez sobre se usava coletes à prova de bala, o comandante respondeu: “Eu tenho um colete moral”.
A sua capacidade para sobreviver, apesar das inúmeras tentativas para o eliminar, deram origem a muitas piadas. Como aquela que conta como ele recusou a oferta que lhe fora feita de uma tartaruga das ilhas Galápagos, ao saber que elas viviam 100 anos: “É o problema dos animais, nós afeiçoamo-nos a eles e depois eles morrem”.