Ou agora ou em Janeiro. Gestores da CGD têm mesmo de entregar declarações
Parlamento forçou nesta quinta-feira o fim da polémica em torno da entrega ou não de declarações ao Tribunal Constitucional, numa aliança que meteu o BE e a direita. Costa diz que "é natural".
Das várias polémicas em que a CGD esteve envolvida nos últimos meses, uma conheceu ontem um ponto final: os administradores têm mesmo de entregar a declaração de rendimentos ao Tribunal Constitucional (TC), seja agora (até dia 9 de Dezembro) seja a partir de 1 de Janeiro. Mas a novela política que se criou em torno do banco público vai continuar noutras frentes. A oposição quer saber mais sobre possíveis conflitos de interesses de António Domingues, quando este esteve em reuniões sobre a CGD com a Comissão Europeia, e Costa acusa o PSD de "inventar" casos para evitar capitalização do banco. De Domingues, para já, nem uma palavra.
E o novo presidente da CGD será o primeiro a ter de decidir. Tem de responder ao TC sobre a entrega das declarações de rendimentos até dia 9. Até ontem, Domingues preparava-se para entregar uma justificação jurídica, elaborada com a ajuda da sociedade de advogados Campos Ferreira, Sá Carneiro & Associados, o que, no mínimo, atrasaria a entrega dos documentos. Mas o Parlamento aprovou uma alteração ao Orçamento do Estado para 2017 que acaba com todas as dúvidas e elimina a excepção criada pelo Governo, que retirava os administradores da CGD do âmbito do Estatuto do Gestor Público (EGP).
Com esta aprovação do PSD, CDS e também do BE (o PCP e o PS votaram contra), deixou de haver lugar à argumentação que estava a ser preparada: como não se aplicava o EGP, os actuais membros não podiam ser considerados legalmente gestores públicos e, como tal, não se aplicaria a lei de 1983. Resta saber se a administração da CGD manterá o braço-de-ferro depois deste volte-face. As Finanças não responderam sobre este assunto, mas durante o debate na Assembleia da República o secretário de Estado das Finanças, Ricardo Mourinho Félix, acabou por defender que era uma demagogia considerar pouco o controlo pelo BCE, afirmando que este "sempre foi muito mais rigoroso, mais apertado, do que qualquer controlo do Tribunal Constitucional".
Do "absurdo" ao "inaceitável"
Além da questão das declarações, Domingues ficou debaixo de fogo da oposição depois de a Comissão Europeia ter confirmado que o gestor esteve em reuniões com a Direcção Geral de Concorrência (DGComp) durante o período em que ainda era administrador do BPI (as reuniões foram em Abril e a carta de demissão de Domingues é de 30 de Maio). Se a oposição considerou esta situação inaceitável, do lado de António Costa, do Ministério das Finanças e até do Presidente da República houve consenso na desvalorização do facto.
António Costa considerou "natural" todo o processo de nomeção da administração, incluindo a presença em reuniões com a DGComp. Numa entrevista à Lusa, o primeiro-ministro defendeu que não fazia sentido Domingues aceitar ser presidente da CGD sem que tivess o OK para o seu plano. "É natural que o dr. António Domingues tenha discutido com o Governo aquilo que se propunha fazer e que o Governo tenha aprovado. Mas, como parte daquilo que ele pretendia dependia de autorização da Comissão Europeia, seria absurdo e uma irresponsabilidade, quer da nossa parte, quer da parte do próprio, se não tivéssemos tido o cuidado de verificar previamente junto da CE se havia ou não luz verde para a execução do plano".
Já durante a tarde, numa tentativa de colocar um ponto final na nova polémica, o Ministério das Finanças justificava a presença de Domingues nessas reuniões com o facto de o Governo só poder "nomear uma administração que apresentasse um plano com o qual concordasse e que fosse viável, desde logo junto das autoridades de concorrência europeias". Uma das condições era a de que a recapitalização não fosse considerada ajuda de Estado e esse foi um dos tópicos em cima da mesa: "Estas reuniões foram fundamentais para a definição das condições iniciais do plano de negócios, em particular dos elementos de ausência de ajuda de Estado", lia-se no comunicado que acrescentava que só estava em causa informação pública. Já de manhã, o secretário de Estado das Finanças, Ricardo Mourinho Félix, tinha dito ao PÚBLICO que nesses encontros "não havia qualquer informação confidencial (...) Quando se trabalhou no plano de negócio, fez-se com informação pública, aplicando à Caixa os rácios do BPI".
Ora esta nova ponta solta na gestão da CGD deixou o primeiro-ministro virado para a oposição. Disse Costa que o PSD se comporta na oposição "com uma irresponsabilidade total, inventando casos sobre casos, falsas polémicas sobre falsas polémicas, com um único objectivo, que é ver se evita a concretização dos programas de capitalização e de reestruturação da Caixa e a execução do novo plano de negócios".
Mas o PSD não desiste e exigiu ontem que o Governo explique “urgentemente” quem mandatou Domingues e que competências e informações lhe deu, quando este era ainda responsável por um banco privado. Luís Montenegro disse que Costa deve “tirar consequências” e “tomar diligências” e considerou que é todo o Governo, e em especial o primeiro-ministro, que está “fragilizado”. Mas recusou pedir cabeças, como fez o eurodeputado Paulo Rangel. O líder da bancada social-democrata acusou o Governo de falta de “transparência democrática”, ameaçou recorrer a todas as possibilidades para obter os esclarecimentos - sem especificar meios - e lembrou haver ainda uma comissão de inquérito a decorrer.
Já o centrista João Almeida colocou o ónus da iniciativa no Banco de Portugal, afirmando que este tem a “obrigação” de agir: “Se actuaram em nome da CGD e tiveram acesso a informação da Caixa quando representavam outra instituição financeira, isso colide com a legislação que regula as instituições financeiras e cabe ao BdP investigar e ser consequente, se se vier a verificar algum conflito de interesses.”
A estratégia socialista foi desvalorizar e atacar os sociais-democratas. Carlos César disse que a participação de Domingues em reuniões no âmbito europeu antes de integrar a CGD “já era conhecida e pública” e criticou o PSD por só “querer que todas as coisas corram mal”, para se fazer a “privatização” do banco público. “Nós garantimos: isto vai correr bem, por mais barulho que faça o PSD.” Com Sofia Rodrigues