Sem sucessor à vista, Merkel põe fim ao tabu da quarta candidatura
Chanceler fala ao país este domingo à tarde. CDU prepara estratégia eleitoral: aumentar o investimento e convencer os que "perderam com a modernização".
A chanceler alemã, Angela Merkel, vai discursar este domingo ao final da tarde, pondo finalmente fim a uma longa especulação sobre se vai recandidatar-se a um quarto mandato.
Na Alemanha, ninguém põe a hipótese de que isto não aconteça, sobretudo porque não há qualquer figura a perfilar-se como sucessora. Algo que não seja uma recandidatura será “uma fuga à responsabilidade”, considerou mesmo Werner Patzlet, professor de ciência política da Universidade Técnica de Dresden, ao diário britânico The Guardian.
Esta semana foram-se somando os sinais: o político da CDU Norbert Röttgen disse à CNN que a chanceler se recandidataria; na última viagem à Europa do Presidente dos EUA, Barack Obama, Merkel disse que “quer servir o povo da Alemanha mas também trabalhar para a coesão e sucesso da Europa”.
Nas últimas sondagens, o partido de Merkel (CDU) continua à frente para as eleições de Setembro de 2017, com 34% das intenções de voto, segundo a mais recente sondagem do Instituto Emnid, enquanto os sociais-democratas (SPD) teriam 22%, o partido populista anti-imigração AfD 12%, os Verdes 11%, a esquerda radical de Die Linke 10%, e os liberais democratas do FDP 5%. Nas últimas eleições tanto a AfD como o FDP ficaram abaixo dos 5%, o mínimo para representação parlamentar.
A grande questão para as próximas eleições é se se repetirá uma grande coligação com conservadores e socialistas, como no primeiro Governo de Merkel e no actual (no seu segundo executivo, Merkel aliou-se com os liberais-democratas, que são o parceiro natural de coligação da CDU). Para já as sondagens dão à CDU e ao SPD uma pequena maioria.
A grande coligação é vista como um mal menor. A estabilidade que proporciona abre, por outro lado, espaço para mais contestação dos partidos nos extremos, especialmente da direita já que, com Merkel, a CDU se posiciona mais ao centro.
Assim, o maior desafio a Merkel é a Alternativa para a Alemanha (AfD). Fundado em 2013 para questionar os programas de empréstimos aos países do Euro, transformou-se num partido anti-imigração, aproveitando a entrada nopaís de muitos refugiados em 2015 (890 mil) para ganhar popularidade: tem hoje representação nos parlamentos de dez dos 16 estados-federados.
Em causa não está apenas a chegada dos refugiados mas sobretudo a sua gestão. Os estados-federados foram deixados a resolver sozinhos as questões de alojamento e integração dos refugiados, e em muitos locais este processo arrastou-se: em Berlim, houve vários recintos desportivos de escolas, por exemplo, que receberam refugiados desde o Outono de 2015 até ao Verão de 2016. A sociedade civil envolveu-se, mas os obstáculos burocráticos e a falta de organização das autoridades foram um problema.
Merkel repetiu o seu mantra “nós conseguimos” (“Wir schaffen das”), mas entretanto declarou que não diria mais essas palavras. “Tornaram-se vazias.”
A missão da CDU é agora dar resposta a algumas inquietações dos alemães tentando manter os seus valores. A emissora alemã Deutsche Welle mencionava que num documento com o título “Orientação para tempos difíceis – para uma Alemanha e uma Europa de sucesso”, a CDU deverá voltar a uma matriz mais conservadora para tentar convencer os eleitores que “perderam com a modernização”.
Apesar do desemprego estar em 5,8%, o nível mais baixo desde a reunificação, as desiguldades económicas acentuaram-se.
O documento do partido, que será ainda discutido pela liderança, fala de um plano para, no ano eleitoral, aumentar o investimento em infra-estruturas, assim como em cortes fiscais e também mais contribuições para a política de segurança.
A Alemanha tem ignorado repetidos pedidos – da Comissão Europeia aos parceiros europeus, passando por centros de estudos de economia do país – para aumentar o investimento, mas parece agora haver uma janela de oportunidade para o fazer.