Happy Diwali! Depois logo vemos como se respira

Há uma poluição que se sente na pele, nos pulmões, nos olhos, que sabe na língua e que faz muito, muito mal. Acordar assim não é para todos. Depois da maior das festas, respirar em Nova Deli é duro.

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Não há festa como esta. Há quase duas semanas que parecia que o mundo inteiro andava às compras, o trânsito sempre a piorar. Nos últimos dias, as ruas e as casas enfeitaram-se com luzes e calêndulas; no chão, surgiram pinturas e velas. Assim que a noite de domingo caiu, em Nova Deli, a capital da Índia foi invadida por fogo-de-artifício, apoiado no terreno pela infantaria dos petardos. Quem saiu à rua lançava os seus, ria e ficava a ver, ou fugia. Pelo meio, trocavam-se doces e dizia-se “Happy Diwali”. Felicidade em estado puro.

O problema é a manhã seguinte. Em Deli, vive-se com níveis de poluição atmosférica especialmente elevados, mas não há nada como o pós-Diwali, a maior festividade hindu, o festival das luzes, conhecido como o “Natal da Índia”. Bastava espreitar pela janela. A habitual neblina estava muito mais espessa, o fumo fazia comichão no nariz. Poluição assim sente-se na pele, arde nos olhos, na boca. Uma olhadela pelas redes sociais e não havia outro tema. “Visibilidade nula”, avisavam uns. “Hoje, não saio de casa”, diziam outros.

Todos os anos, há 6,5 milhões de mortes prematuras por causa da poluição atmosférica, lê-se num relatório da Agência Internacional de Energia Atómica de Julho. Destas mortes, 1,59 milhões são de indianos. Em Deli, diz ainda a agência da ONU, a tradição do uso de estrume para cozinhar e duas centrais eléctricas alimentadas a carvão são as principais fontes de emissões PM2.5.

Estas partículas são finíssimas, conseguem evadir os filtros natuais do do organismo e chegar à rede sanguínea e penetrar nos pulmões. Podem afectar as funções respiratórias e agravar condições médicas como asma ou doenças cardíacas. Ora bem, em Deli, na sexta-feira, as PM2.5 já estavam num nível perigoso, acima dos 200 microgramas por metro cúbico. Nesta segunda-feira de manhã, tinham ultrapassado os 900, muitas vezes acima das recomendações da Organização Mundial de Saúde (não mais de 25 microgramas por metro cúbico em termos diários; dez, numa contagem anual).

A pegada dos petardos

Num bairro do sul da cidade de 17 milhões, pela primeira vez foram ultrapassados brevemente os 1000 microgramas; aconteceu em RK Puram, pouco depois da meia-noite, confirmou à AFP Gufran Beig, responsável do Instituto de Previsão e Qualidade do Ar indiano. “Quase 60-70% do fumo vem dos petardos”, diz.

O risco desta poluição é muito maior para as crianças. Domingo à noite, a maioria dos petardos eram lançados por miúdos, fornecidos pelos pais, que traziam sacos cheios. As crianças respiram mais depressa e os seus cérebros e sistemas imunitários ainda estão em desenvolvimento e são, por isso, mais vulneráveis.

Happy Diwali! Ainda bem que não é Natal todos os dias, mas a “pegada química dos petardos e fogo-de-artifício é mortífera”, escreveu no site do Hindustan Times Usman Nasim, investigador do Centro para a Ciência e o Ambiente de Deli.

“Os petardos têm carbono e produzem vários gases”, continua Nasim, que estuda a qualidade do ar. “No fogo-de-artifício há químicos que actuam como agentes de coloração”, explica. “Estas cores têm sulfeto de antimónio para o efeito brilhante, alumínio para o branco, nitrato de bário para o verde, lítio para o vermelho, cobre para o azul e estrôncio para o roxo”, tudo “substâncias prejudicais”. 

É difícil voltar a olhar para tanto brilho e cor da mesma maneira? Talvez, mas não na Índia. Há semanas que as redes sociais estavam cheias de apelos pré-Diwali a sublinhar os riscos desta poluição. Mas é Natal e são mais de 1,2 mil milhões de pessoas a festejá-lo.

Segunda-feira, Twitter. “O fumo está dentro das nossas casas também. Tão contente que o meu filho recuse contribuir para isto. Mas sofre…”, diz Sakshi Nanda, escritora e crítica literária de Deli. “Governos, tribunais, todos ignoraram os petardos e a poluição por populismo”, acusa Jatin Gandhi. “Yeh, estamos a ganhar a Pequim! A qualidade do ar em Deli afunda-se”, escreve o jornalista Bobby Gosh.

O governo da cidade prepara-se para instalar purificadores de ar em cinco ruas e um vaporizador. Os purificadores domésticos custam muito dinheiro, só estão ao alcance de uma minoria. Pensando no Diwali, é pouca coisa, e, por isso, há quem sugira a proibição progressiva dos petardos, até que seu o uso seja abandonado. Será uma tarefa a muito longo prazo, isto se alguém estiver disposto a começar.

No regresso às aulas, depois de explicar o que são as PM2.5 e os seus riscos (assim como o que são purificadores de ar), uma portuguesa ouviu dos alunos: “Mas estamos felizes, professora”.

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