Ascensão e queda de Lady Gaga
Há uns anos a cantora parecia destinada a competir com os melhores no mundo da pop. Hoje, Joanne confirma-o, parece apenas desorientada.
A americana Lady Gaga convoca posições vincadas de fascínio ou rejeição. Os que não podem com ela despacham-na com o gasto argumento de que não passa de mercadoria sem nenhum valor artístico ou através da voz que asseguram ser estridente. Quem se revê nela gaba-lhe as transfigurações, a voz moldável, a procura da individualidade e a forma perspicaz como se foi posicionando como artista capaz de impacto global.
Curiosamente parte do seu apelo – pelo menos numa fase inicial – advinha do facto de não encaixar bem no quadro estabelecido daquilo que é suposto ser uma celebridade pop. Por um lado, pela imagem projectada: não conforta, como Beyoncé, nem é tão calculista como Madonna. Mesmo quando só parece ocupar o espaço mediático pelo acumular de visuais arrojados ou declarações provocadoras, existe nela uma estranheza que está longe de ser aquilo que o mercado de massas tende a acolher.
Por outro lado, o seu posicionamento estético também não é o mais comum, para quem rivaliza por atenção com Rihanna, Miley Cyrus ou Taylor Swift, citando Andy Warhol ou Cindy Sherman como influências. A verdade é que com o primeiro álbum, The Fame (2008), e a posterior extensão, The Fame Monster (2009), muitos previram que a pop poderia vir a conhecer uma nova realeza. Mas com Born This Way (2011) e sobretudo com o malogro de ArtPop (2013) as expectativas arrefeceram.
O novo álbum confirma o declive. A ambição era grande. Mark Ronson, o homem que moldou Amy Winehouse, foi chamado para a co-produção, e Kevin Parker (Tame Impala), Josh Homme (Queens of the Stone Age), Florence Welch, Father John Misty ou Beck deram uma ajuda, distribuindo-se pela colaboração vocal, instrumental ou na composição. Sabemos que eles estão lá, mas a sua presença raramente constitui mais-valia. Em geral falta o que a maior parte das canções pedia: inspiração, alento, um sopro de vitalidade extra que as retirasse da mera mediania.
É um álbum de reacção ao anterior. Se ArtPop era extravagante, procurando apanhar a onda da música de dança opulenta à americana, o novo tenta ser moderado e genuíno, sendo apresentado como um álbum esquelético e atento às raízes americanas com alusões à country. Só que paradoxalmente acaba por soar bem mais artificioso do que o anterior. Na verdade, é quando é exagerada que ela acaba por ser mais convincente. Agora, sim, sente-se que é como se apenas se preocupasse com o cenário que envolve as emoções, sem se preocupar realmente em vivê-las.
É um álbum confuso em que a maior parte das canções parece inacabada, sem centro nevrálgico, como se procurasse uma perfeição que nunca existe. Da música de dança barroca (Perfect illusion ou Diamond heart) à balada para voz e guitarra acústica em Joanne (numa homenagem a uma tia que nunca chegou a conhecer), ou para voz, piano e arranjos em Million reasons, passando por canções imaculadas (Hey girl ou A-yo), mas que não chegam a levantar voo. Dir-se-ia indecisa em continuar a competir nos terrenos mais instantâneos da pop que pedem uma reactualização contínua ou abandonar-se às fórmulas pop-rock mais tépidas e a uma imagem domesticada, como se fosse uma espécie de Elton John.
Em 2009, em entrevista, dizia-nos que não se preocupava em ser vista como uma estrela descartável. “O futuro não tem limites”, afirmava. O novo álbum não constituirá o seu fim. Mas se há uns anos competia pelo trono das celebridades pop, hoje luta apenas por não perder o que conquistou.