Depressão pode fazer da maternidade "um verdadeiro sofrimento"
Especialistas e famílias debatem neste sábado as dúvidas que os pais de bebés têm e as pressões que sentem. "Das mães espera-se que sejam lindas, magras e bem arranjadas logo a seguir ao parto", diz pediatra.
Cerca de um quinto das mulheres em Portugal tem depressão no período da gravidez e no pós-parto, fases que costumam ser vistas como períodos felizes na vida das mães recentes, diz a psiquiatra Carina Mendonça, uma das participantes no primeiro Congresso Nacional do Bebé, que acontece neste sábado, em Lisboa.
Médicos, enfermeiros, psicólogos, terapeutas e também pais e famílias vão juntar-se para debater temas relacionados com as necessidades dos bebés (e das suas famílias) durante os primeiros dois anos de vida.
“Muitas mulheres experienciam tristeza ou ansiedade nesta fase das suas vidas, de forma tão intensa e disfuncional que torna a vivência da maternidade um verdadeiro sofrimento”, refere Carina Mendonça em entrevista à agência Lusa.
Vários são os factores que podem contribuir para a depressão ou a ansiedade na gestação, como as dificuldades financeiras, a falta de apoio familiar, o relacionamento conjugal e, com grande influência, a existência prévia de gravidez ou ansiedade. No pós-parto, aliam-se as mudanças bruscas ao nível hormonal e a necessidade de reorganização da vida da mulher e do casal.
Carina Mendonça sublinha que os quadros patológicos depressivos ou ansiosos acabam por ser muitas vezes ignorados ou desvalorizados na gravidez e no pós-parto, “perpetuando um grande sofrimento para a mulher” com “consequências nefastas no desenvolvimento da própria gravidez, do parto ou do bebé”.
“Infelizmente ainda existem muitos profissionais de saúde que contra-indicam a consulta de especialidade e os respectivos tratamentos”, disse. “Outras vezes, quando a referenciação à consulta de saúde mental é sugerida, são as mulheres que recusam pelo estigma ou pelo medo relacionado com os tratamentos.”
A especialista lembra que os sintomas de depressão durante a gravidez constituem um factor de risco para a depressão pós-parto. “O acompanhamento psiquiátrico nestas fases é primordial.” A intervenção deverá ser feita através da associação entre a psicoterapia e a psicofarmacologia”, refere Carina Mendonça, salvaguardando que uma avaliação cuidadosa permite compatibilizar o tratamento medicamentoso com a própria amamentação.
Os medos dos pais
Ainda no capítulo sobre “cuidar dos pais”, o Congresso do Bebé contará com a perspectiva da pediatra Joana Appelton Figueira sobre “os medos dos pais”. “Mais do que chamar medrosos aos pais ou tentar classificar esta geração de pais, interessa-me conhecer os medos que trazem para lhes mostrar tudo o que são capazes de fazer”, referiu à Lusa a pediatra.
Joana Figueira reconhece que actualmente os pais têm muitas expectativas em relação aos seus filhos, muitas delas infundadas: imaginam um bebé perfeito, sempre feliz, que dorme e come bem e aprende depressa.
Além disso, os pais esperam recuperar rapidamente o estilo de vida que tinham antes do nascimento do bebé, mas há uma multiplicidade de exigências difícil de corresponder, sobretudo em relação às mulheres: “Das mães espera-se que sejam lindas, magras e bem arranjadas logo a seguir ao parto, que voltem ao trabalho, mas amamentem em exclusivo”, sem deixar de ir “a todas as festas das amigas”.
“O primeiro passo para promover a confiança dos pais é ajudá-los a pensar nas suas expectativas e nos seus valores”, defende a pediatra, considerando que os profissionais de saúde devem demonstrar as competências dos pais e dos bebés em cada interacção com as famílias, como forma de promover a autonomia e evitar o abuso do recurso aos profissionais.