FAO diz que é preciso adaptar a agricultura às alterações climáticas
Se nada for feito, a população a viver em pobreza pode aumentar em 122 milhões de pessoas até 2030.
A organização para a Alimentação e a Agricultura das Nações Unidas (FAO) alertou esta segunda-feira que é urgente ajudar o sector agrícola a adaptar-se às alterações climáticas, que poderão lançar até mais 122 milhões de pessoas na pobreza.
"A menos que sejam tomadas medidas agora para tornar a agricultura mais sustentável, produtiva e resiliente, os impactes das alterações climáticas irão comprometer gravemente a produção alimentar em países e regiões que já enfrentam uma alta insegurança alimentar", escreve o director-geral da organização, José Graziano da Silva, no prefácio de um relatório agora publicado.
Intitulado "O estado da alimentação e da agricultura", o relatório sublinha que, se não houvesse alterações climáticas, a maioria das regiões deveria ver reduzir o número de pessoas em risco de pobreza até 2050.
Com as mudanças no clima, e se nada for feito, estima-se que a população a viver em pobreza registe um aumento de entre 35 e 122 milhões até 2030. Isto deve-se sobretudo aos impactos negativos do aquecimento global no sector agrícola.
Os mais afectados seriam as populações nas zonas mais pobres da África subsariana, e do Sul e Sudeste Asiático, especialmente os que dependem da agricultura para viver.
Graziano da Silva diz que a fome, a pobreza e as alterações climáticas têm de ser abordadas em conjunto, quanto mais não seja "por um imperativo moral, porque aqueles que hoje mais sofrem são os que menos contribuíram para as alterações climáticas".
O relatório da FAO diz que para manter o aumento da temperatura global abaixo do tecto de 2°C, as emissões de gases com efeitos de estufa terão de diminuir 70% até 2050, o que só será possível com o contributo dos sectores agrícolas.
Estes sectores são responsáveis por, pelo menos, um quinto de todas as emissões, sobretudo devido à conversão das florestas em terra cultivada, mas também devido à pecuária e à produção agrícola.
No entanto, escrevem os autores, os sectores agrícolas enfrentam um duplo desafio: reduzir as emissões de gases com efeitos de estufa ao mesmo tempo que produzem mais alimentos para saciar uma população crescente e cada vez mais rica.
Estima-se que a procura global por alimentos em 2050 seja pelo menos 60% maior do que em 2006, mas o crescimento populacional será concentrado nas regiões que já hoje têm maior prevalência de subnutrição e maior vulnerabilidade às alterações climáticas.
O relatório reconhece que reformular a agricultura e os sistemas alimentares será um processo complexo, devido ao vasto número de partes envolvidas, à multiplicidade dos sistemas agrícolas e de produção alimentar e às diferenças nos ecossistemas.
No entanto, alerta, os esforços têm de começar agora, porque os impactos das alterações climáticas só piorarão com o tempo e, se nada for feito, os países mais pobres terão no futuro de enfrentar simultaneamente a fome, a pobreza e as mudanças climáticas.
Nas palavras de Graziano da Silva, "os benefícios da adaptação ultrapassam os custos da inacção com margens muito grandes".
Nas vésperas da 22.ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas, que começa a 7 de Novembro em Marrocos, o relatório sublinha que o sucesso da transformação da agricultura depende em grande medida da ajuda aos pequenos proprietários na adaptação às mudanças climáticas.
Estima-se que haja nos países em desenvolvimento cerca de 475 milhões de famílias de pequenos proprietários que produzem em contextos socio-económicos e condições agroecológicas muito distintas, pelo que não existe uma só resposta.
No entanto, a FAO descreve, no relatório, algumas formas "alternativas e economicamente viáveis" de ajudar os agricultores a adaptar-se e a tornar as suas formas de vida mais resilientes, nomeadamente a adopção de práticas inteligentes, como o uso de variedades de culturas nitrogénio-eficientes e tolerantes ao calor.
A adopção generalizada de práticas nitrogénio-eficientes, por exemplo, permitiria reduzir em mais de 100 milhões o número de pessoas em risco de subnutrição, estima o relatório.