Júlio Machado Vaz devolveu medalha à Câmara do Porto em protesto

Psiquiatra acusa vereador Manuel Pizarro de prometer, informalmente, apoios a uma instituição, mas de não dar qualquer resposta formal aos pedidos de reunião para tentar encontrar soluções.

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O psiquiatra recebeu a medalha em Julho do ano passado Nelson Garrido

A medalha municipal de mérito grau ouro que a Câmara do Porto atribuiu, no ano passado, a Júlio Machado Vaz foi devolvida, na manhã desta quinta-feira, pelo conhecido psiquiatra portuense, em protesto pela falta de resposta institucional a um pedido de auxílio para a Comunidade de Inserção Eng. Paulo Vallada, que apoia mães adolescentes.

Num longo texto publicado no Facebook, na tarde de quarta-feira, Júlio Machado Vaz descreve a tentativa de salvar a instituição a que preside, com contactos iniciados há cerca de dois anos, e a forma como o vereador da Acção Social, Manuel Pizarro, em nome da Câmara do Porto, foi prometendo, informalmente, prestar o auxílio pedido sem que, contudo, tenha havido, depois, qualquer resposta aos pedidos formais de reunião por parte do psiquiatra.

Por isso, enquanto aproveita a publicação para agradecer a diversas instituições e pessoas ao longo do processo, à Câmara do Porto deixa uma mensagem diferente: “Aos que muito prometeram e nada cumpriram deixo o que já lhes pertence – espelhos e consciências. Com a excepção da Câmara do Porto, à qual deixarei algo meu.” No final da publicação, Machado Vaz explica que irá devolver a medalha que lhe fora atribuída pela câmara presidida por Rui Moreira. “Dir-me-ão que se trata de um mero gesto simbólico. É verdade, mas por atrás dos símbolos vivem ideias, maneiras de ver o mundo e de nele estar. E, quem sabe, talvez a próxima IPSS [instituição particular de solidariedade social] que solicitar 20 ou 30 minutos de atenção tenha mais sorte”, escreve.

Júlio Machado Vaz salvaguarda que as reuniões pedidas a Manuel Pizarro até poderiam não ter dado qualquer fruto que permitisse manter as portas abertas da instituição, mas lamenta a falta de resposta conseguida. Segundo a sua publicação, o primeiro contacto com o vereador sobre este tema foi “há quase dois anos”, altura em que terá pedido a Pizarro “auxílio para estabilizar a Paulo Vallada”. A resposta, garante, “foi afirmativa, com a legítima exigência de uma redução de custos do funcionamento”. Machado Vaz diz que cumpriu e que em três meses a instituição despediu duas pessoas e reduzia a massa salarial dos que permaneceram. “Informei o dr. Manuel Pizarro da nova realidade, fornecendo os números, como era minha obrigação. E esperei. Nada aconteceu, de um momento para o outro os canais de comunicação deixaram de funcionar; silêncio absoluto”, escreve.

O psiquiatra diz que “as promessas [de auxílio] foram renovadas” quando foi informado de que iria ser agraciado com uma medalha da cidade, mas que, apesar de aguardar até ao Outono do ano passado, não houve qualquer contacto da câmara. Nessa altura, escreve, as suas perguntas “voltavam a esbarrar no silêncio”. Já este ano, conta ainda, obteve novas promessas quando foi convidado pela câmara para apresentar um livro nos Paços do Concelho. Mas, quando tentou solicitar uma reunião ao vereador, por a sobrevivência da instituição se ter tornado um assunto ainda mais urgente, voltou a não obter resposta. “Nenhuma resposta. Um mês depois repeti a diligência, salientando a urgência da situação. Silêncio mantido”, escreve.

O PÚBLICO tentou ouvir o vereador Manuel Pizarro sobre esta matéria, mas tal não foi possível. Contudo, num esclarecimento escrito assinado pelo vereador, e enviado ao PÚBLICO, refere-se que “a Câmara do Porto reitera a disponibilidade já assumida de ajudar financeiramente a resolver” os problemas da Paulo Vallada, cujas dificuldades diz conhecer. Manuel Pizarro escreve ainda: “A Câmara do Porto é alheia ao facto de que a Comunidade se verá privada das suas instalações. Isso resulta da venda do imóvel em que está instalada desde a sua criação, que era propriedade da Fundação da Juventude. A Câmara do Porto não foi parte desse processo e não tem ao seu dispor nenhuma alternativa que permita a instalação da Comunidade.”

O esclarecimento do vereador não faz qualquer referência à falta de resposta aos pedidos de reunião solicitados por Júlio Machado Vaz e que estão no centro das queixas deste.

Na publicação colocada na quarta-feira no Facebook, o psiquiatra explica que, neste momento, a instituição a que preside já está em fase de encerramento, tendo as jovens que apoiava sido encaminhadas para outras instituições, nos casos em que tal era necessário. Entre os vários agradecimentos deixados por Machado Vaz contam-se a Fundação da Juventude e o Centro Distrital de Segurança Social do Porto, que diz ter colaborado no processo com uma “gentileza inexcedível”.

Após a venda do edifício, a Comunidade foi avisada de que teria de o abandonar até ao Verão. A Santa Casa da Misericórdia – que também merece o agradecimento do psiquiatra – ter-se-á disponibilizado para realizar obras de adaptação num outro espaço para realojar a Paulo Vallada, mas os trabalhos demorariam cerca de um ano, pelo que seria necessário encontrar uma solução intermédia. Era essa possibilidade que Machado Vaz queria estudar com Manuel Pizarro aquando dos pedidos de reunião feitos já este ano. 

Dizendo-se “atónito” com o caso mas “sempre disponível para ajudar”, Manuel Pizarro garantia, no Facebook, que a “[Santa Casa da] Misericórdia ofereceu instalações definitivas que estarão prontas daqui a um ano; a Segurança Social ofereceu instalações para o período de transição até lá; o Fundo de Socorro Social (Ministério da Seg. Social) está disponível para apoiar; a Câmara do Porto está disponível para ajudar também a financiar”.

Machado Vaz reconhece que a afirmação sobre a Santa Casa é verdadeira – e terá sido para tentar, junto da câmara, encontrar um espaço de transição que pediu, já este ano, nova reunião a Manuel Pizarro –, mas que o ponto referente à Segurança Social “é falso”. “Em nenhuma das reuniões mantidas com a Segurança Social para encaminhamento das nossas meninas/mães me foram oferecidas instalações alternativas”, escreve, acrescentando: “Não recusei absolutamente nada, não sou louco para ver as meninas partirem e uma equipa no desemprego quando o podia evitar”. Ao PÚBLICO, fonte do Instituto da Segurança Social diz que “não confirma” que tenha havido uma oferta de instalações, garantindo que o instituto “está a acompanhar o processo e a trabalhar para tentar encontrar uma solução”.

Já sobre os apoios referidos nos últimos pontos da resposta do autarca, Machado Vaz ironiza: “Folgo com os pontos 3 e 4, agradeço e aceito. Saliento apenas que a disponibilidade do Dr. Manuel Pizarro em nome da câmara nunca se traduziu em factos durante dois anos, mas para tudo há uma primeira vez.”

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