Estados Unidos e Rússia chegam a acordo para cessar-fogo na Síria

John Kerry e Sergei Lavrov, os chefes das diplomacias dos dois países, assinaram em Genebra um plano que prevê a cooperação militar contra o Estado Islâmico e outros grupos armados que combatem o regime de Bashar al-Assad. As negociações demoraram 10 meses.

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O aperto de mão entre John Kerry e Serguei Lavrov Kevin Lamarque/Reuters

O primeiro passo do acordo assinado entre os EUA e Rússia, na noite de sexta-feira em Genebra, Suíça, prevê um cessar-fogo, a partir da noite de segunda-feira, que permita o acesso humanitário às zonas de Alepo cercadas pelas forças armadas da Síria e o fim dos bombardeamentos aéreos.  

Se esta trégua entre o regime, apoiado pela Rússia, e as forças rebeldes, apoiadas pelos EUA, for efectiva, ao fim de uma semana, Washington e Moscovo comprometem-se a colaborar no terreno, planeando ataques aéreos conjuntos contra as forças do autoproclamado Estado Islâmico e da frente al-Nusra.

Kerry foi cauteloso na hora de apresentar o acordo. “Ninguém está a construir nada com base na confiança. Este acordo baseia-se na verificação, no cumprimento e no interesse mútuo. É uma oportunidade, e nada mais do que isso, até que que se transforme numa realidade”, afirmou o responsável pela diplomacia da Administração Obama, ao fim de 13 horas de reunião com o seu homólogo russo.

Lavrov, que descreveu a situação na Síria como um “pântano”, afirmou que “a Rússia fará o que depende de si”, mas acrescentou de seguida que “nem tudo depende”… O ministro dos Negócios Estrangeiros de Vladimir Putin acrescentou que foram assinados cinco documentos, que devem manter-se secretos para não pôr em causa o frágil consenso alcançado entre os dois países – que tentam, sem êxito, chegar a um entendimento há vários meses e, pelo meio, chegaram a anunciar (em Fevereiro) um cessar-fogo que não foi cumprido.

Tanto a imprensa russa como a norte-americana salientam que o ponto mais difícil de chegar a acordo em Genebra foi a inclusão das forças rebeldes da frente al-Nusra entre os alvos dos futuros ataques conjuntos. Sendo uma das organizações militarizadas que combatem o regime sírio, ao lado de outros pequenos grupos apoiados pelos EUA, e tendo o apoio da Arábia Saudita, esta organização, que cortou recentemente a sua ligação com a Al-Qaeda e mudou de nome para Jabhat Fateh al-Sham, contaria ser integrada no campo das forças “moderadas”, que este acordo visa proteger dos ataques sírios e russos. Mas Moscovo foi intransigente.

John Kerry negou que a inclusão dos rebeldes da al-Nusra fosse “uma concessão”. “É profundamente do interesse dos EUA combater a al-Nusra”, afirmou, em Genebra.

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Um jornalista com garrafas de vodka oferecidas por Lavrov, que foi à sala de imprensa queixar-se da demora na decisão dos EUA Reuters

Porém, as longas ausências de Kerry das negociações, para acertar com Washington a posição final, foram sublinhadas pela diplomacia russa, com ironia. A certa altura, conta o New York Times, Sergei Lavrov foi à sala onde os jornalistas aguardavam pelo desfecho das negociações queixar-se, num tom divertido, do tempo que o Presidente americano demorava a tomar decisões. Chegou a mandar pizzas e vodka para a sala de imprensa, para sublinhar essa demora.

Em Washington, o acordo agora alcançado tem vários opositores. À Administração Obama chegam queixas de que a inclusão das forças da al-Nusra, mais bem armadas, tornará vulnerável a posição dos rebeldes anti-Assad. A possibilidade de partilha de informação sensível com a Rússia, nos comandos conjuntos que estão previstos caso o cessar-fogo resulte, também causa desconforto a sectores do Governo americano.

Também por isso, Kerry não poupou nos “ses”, em Genebra: “Acreditamos que este plano, se implementado, se seguido, pode ser um momento de viragem, de mudança.” Ao fim de cinco anos de guerra civil, com cerca de meio milhão de mortos e uma crise de refugiados sem precedentes nas últimas décadas, uma mudança parece mais do que necessária.

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