Gestores de empresas com trabalho temporário terão de pagar salários em atraso

Nova lei alarga a responsabilidade das empresas e dos seus gestores, mas dá mais garantias ao trabalhador em caso de incumprimento da lei.

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Trabalho temporário com regras mais rígidas Rui Gaudêncio

A partir de meados de Setembro, as empresas que subcontratam serviços e que recorrem a empresas de trabalho temporário, e os seus administradores, gerentes e directores, poderão ser responsabilizadas directamente pelo cumprimento da lei e, no caso do trabalho temporário, pelo pagamento de salários em atraso. As novas regras estão previstas no diploma que combate as formas modernas de trabalho forçado que, ao alargar o âmbito dos sujeitos responsáveis pela violação das normas laborais, poderá facilitar a vida ao trabalhador quando chegar a hora de reclamar o pagamento de salários em atraso, por exemplo.

Em causa está um diploma publicado esta semana que tem apenas cinco artigos, mas que afectam de forma generalizada o trabalho temporário e a subcontratação de serviços, obrigando as empresas que recorrem a estas formas de contratação e os seus gestores e administradores a estarem mais atentos ao cumprimento da lei. A nota dominante nas alterações é que as empresas contratantes, assim como os seus administradores, gerentes ou directores, passam a ter uma responsabilidade de primeira linha em caso de infracção laborais. Algo que até agora estava delimitado a casos pontuais.

Na lei ainda em vigor, quando uma empresa de trabalho temporário (ETT) não paga os salários aos seus trabalhadores, a entidade que recorreu aos seus serviços já é solidariamente responsável pelo pagamento desses créditos, mas apenas os que dizem respeito aos primeiros 12 meses de trabalho. Com a alteração que entra em vigor a 22 de Setembro, deixa de haver qualquer limite temporal e os gerentes, administradores ou directores da empresa que utiliza os trabalhadores da ETT são subsidiariamente responsáveis pelo pagamento dos créditos e das coimas.

No caso das subcontratações, as regras também se tornam mais rígidas. Actualmente, a lei já prevê que a empresa que contrata um serviço é responsável solidariamente pelo pagamento de coima aplicada ao subcontratante, quando estiverem em causa infracções muito graves. Essa responsabilidade solidária passa a aplicar-se, não apenas ao pagamento da coima, mas também ao cumprimento da lei e sua violação (independentemente da gravidade da infracção).

“O contratante e o dono da obra, empresa ou exploração agrícola, bem como os respectivos gerentes, administradores ou directores, assim como as sociedades que com o contratante (…) se encontrem em relação de participação recíproca de domínio ou de grupo, são solidariamente responsáveis pelo cumprimento das disposições legais e eventuais violações cometidas pelo sub-contratante que executa todo ou parte do contrato nas instalações daquele ou sob a sua responsabilidade”, lê-se na Lei 28/2016.

Esta alteração, alerta Maria da Glória Leitão, sócia responsável pelo departamento laboral da sociedade Cuatrecasas, Gonçalves Pereira, "vem alargar o âmbito de entidades responsáveis em caso de violação da lei laboral, e, nomeadamente responsabilizar pessoalmente o administrador de uma empresa pelas infracções cometidas pela empresa que ele subcontratou, independentemente da culpa”. Em última instância, esse administrador pode ser constituído arguido num processo de contra-ordenação, precisa a advogada.

Maria da Glória Leitão entende que as alterações “favorecem o trabalhador porque alargam o âmbito dos sujeitos responsáveis, o que, por exemplo do caso dos créditos laborais do trabalhador temporário, vai facilitar a sua cobrança”.<_u53a_p>

Do ponto de vista da empresa que subcontrata serviços ou que usa trabalhadores temporários, há um alargamento das responsabilidades e, por isso, a advogada recomenda que os seus administradores, gerentes e directores estabeleçam mecanismos de controlo sobre a execução dos contratos, para controlar se há ou não incumprimento das normas jurídicas que possa determinar responsabilidade. É que em caso de incumprimento, os próprios responsáveis podem ser chamados a responder perante o incumprimento da lei.

Responsabilidade excessiva?

Questionada sobre se a lei agora publicada responsabiliza de forma excessiva administradores e gerentes, Maria da Glória Leitão lembra que “pode haver situações em que é difícil aos utilizadores controlar o cumprimento da lei”. “Há violações que não são óbvias nem verificáveis [pela empresa que contrata um serviço]. Pode haver um excesso na medida em que exige um controlo a quem pode não estar em condições de o exercer”, explica.

Mas não tem dúvidas de que excessivo “é o título da lei”, quando fala em combate ao trabalho forçado, "porque a lei refere-se a modalidades de contrato de trabalho previstas e reguladas na lei, logo, legítimas".

Também o Presidente da República, quando promulgou a lei, a 10 de Agosto, manifestou “dúvidas acerca da efectiva capacidade de o diploma enfrentar os verdadeiros problemas do trabalho forçado”. Sublinhou, contudo, o objectivo “de disciplinar os abusos do trabalho temporário” com sendo importante.

A lei, negociada entre o BE e o PS e aprovada com os votos favoráveis também do PCP e do PAN, não agradou às confederações patronais.

No dia em que foi aprovada na Assembleia da República, as condeferações da Indústria, do Comércio e Serviços, da Agricultura e do Turismo uniram-se contra o texto legislativo, por considerarem que parte de “dois ou três casos muito concretos e gritantes de manifesta violação dos direitos humanos” e assume uma “atitude persecutória” a todos os que operam no sector, desde empresas de trabalho temporário, “ao utilizador deste tipo de trabalho, aos contratantes e subcontratantes, bem como os respectivos gerentes, administradores ou directores, e sociedades que, com tais empresas, se encontrem em relação de participações recíprocas, de domínio ou de grupo”.

As confederações alertavam ainda que a lei não respeitava a Constituição, por violar o princípio da presunção da inocência.

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