Michael Phelps a testar os seus limites
Foi o porta-estandarte dos EUA na cerimónia de abertura dos Jogos Rio 2016, competição onde vai tentar estender o seu recorde de 18 medalhas olímpicas de ouro na natação.
Por um momento, o campeão olímpico olha para a câmara de vigilância na esquadra de polícia para onde foi levado, de algemas, para ser registado no sistema. Está numa sala onde o agente Jerome Hamilton, da Divisão de Túneis da Autoridade de Transportes do estado do Maryland, o está a submeter a um teste do balão que indicará o nível de álcool no seu sangue. São 2h27 da manhã do dia 30 de Setembro de 2014.
Uma hora antes, o suspeito de 29 anos tinha recebido ordens para encostar o seu Range Rover branco na auto-estrada I-95 em direcção ao norte, por ter excedido o limite de velocidade no ramal de acesso, por ter ziguezagueado entre as faixas de rodagem e por não ter parado nas cabinas de portagens do Túnel Fort McHenry em Baltimore.
Quando a polícia o mandou parar, pouco depois da zona das portagens, apresentava dificuldades em se exprimir claramente. Os olhos estavam raiados de sangue. E tresandava a álcool.
O agente que o deteve percebeu imediatamente quem ele era, mas soletrou o nome para o registo através do rádio: Michael Phelps II. “Para a prisão”, acrescentou. “Condução sob efeito de álcool.”
Agora, o nadador mais medalhado da história encostava-se à parede, vestido com calças cáqui, ténis e camisa escura e lançava um olhar para a câmara colocada na parede, que captou, por um momento, o sofrimento nos seus olhos. Depois virou-se e baixou a cabeça.
Saltamos para a actualidade, e Phelps, de 30 anos, um ano e meio após aquela noite em Baltimore, irá estar presente nos seus quintos Jogos Olímpicos.
Após ser pai pela primeira vez — o seu filho, Boomer Robert Phelps, nasceu a 5 de Maio —, o nadador afirma que já ultrapassou os seus problemas, é uma pessoa diferente e tem treinado mais e melhor do que alguma vez o fizera antes.
O lendário atleta, que ganhou 18 medalhas de ouro em três edições dos Jogos Olímpicos e continua a ser a face visível da natação a nível mundial, diz que muitas das mudanças por que passou se devem a esse incidente. Afirma que estava num caminho perigoso, do qual precisava de sair urgentemente.
“Foi... algo que me ajudou”, declara. “Certamente não estaria onde estou hoje, em cada aspecto da minha vida, sem aquilo.”
Abalado pela sua segunda detenção por condução sob o efeito do álcool, Phelps submeteu-se a seis semanas de tratamento numa dispendiosa clínica de reabilitação nas colinas a noroeste de Phoenix (Arizona) no Outono de 2014. A sua recuperação revelou-se por vezes difícil. Afirma que durante a primeira semana de reabilitação não saiu do seu quarto. E houve quem pensasse que ele não conseguiria chegar ao fim do programa. Mas conseguiu.
Agora diz que está “controlado”, mais feliz do que alguma vez foi, e encantado por ser pai: “A sério, realmente. Foi a melhor coisa que já me aconteceu.”
Avança que não toca numa bebida alcoólica há mais de um ano e meio. A pena suspensa de 18 meses ordenada pelo tribunal já terminou. E se bem que admita que no passado bebeu muito, recentemente declarou à cadeia de TV NBC que acha que não tem um problema de alcoolismo.
Mudou-se para Scottsdale, no Arizona, com a sua noiva e mãe de Boomer, Nicole Johnson, de 30 anos, para treinar com Bob Bowman, o seu treinador e mentor de longa data, agora na vizinha Universidade do Estado do Arizona. (O segundo nome próprio do bebé, Robert, foi escolhido em honra de Bowman. Quanto a Boomer: “Por que não Boomer?”, responde Phelps.)
E já conseguiu aceitar os 16 anos de celebridade internacional que, para o melhor e para o pior, definiram a sua passagem de rapaz para homem.
“Pode-se olhar para o Michael como se ele fosse uma cebola”, diz Nicole, “as camadas [têm sido] retiradas.” O âmago de Michael Phelps foi alcançado e examinado. “Ele fez de mim uma pessoa melhor, devido a tudo o que lhe aconteceu.”
Phelps está em excelente condição física — magro e musculado — e diz que está na melhor forma desde que ganhou oito medalhas de ouro nos Jogos Olímpicos de 2008 em Pequim, número que se mantém como um recorde.
Está mais velho e mais forte, mas cansa-se muito mais facilmente. Num meeting num fim-de-semana recente, em Austin (Texas), Bowman retirou Phelps das finais dos 200 metros estilos no último dia, declarando que o seu nadador estava cansado.
O treinador diz que ele está bem. Psicologicamente, Phelps necessita de nadar, afirma Bowman. A modalidade a que Phelps virou as costas há quatro anos preenche-lhe uma necessidade psicológica que não consegue preencher em qualquer outro lugar.
E, agora, “ele sente-se tão bem enquanto ser humano, e como consequência enquanto atleta”, esclarece o seu treinador. “Sinceramente, nunca pensei que o voltaria a ver assim.”
A motivação Jogos Olímpicos
Numa manhã de sol na Primavera passada no Centro Aquático Mona Plummer, da Universidade do Estado do Arizona, em Tempe, Phelps pegou numa folha de papel branco, molhou-a na água e colocou-a no cimento no final da sua pista de natação. O papel tinha escrito: “Segunda-feira, 18 de Abril. Transforma as tuas impossibilidades em possibilidades, e os teus sonhos em planos. Sessenta e nove dias até Omaha.” Eram estes os incentivos diários de Bowman.
“Omaha” referia-se às provas de selecção para a equipa de natação dos Estados Unidos para os Jogos Olímpicos, que começaram naquela cidade do Nebraska a 26 de Junho e terminaram a 3 de Julho. As provas de selecção determinaram quem vai competir pela comitiva dos Estados Unidos no Rio de Janeiro neste mês de Agosto.
Phelps queria entrar para a equipa e tencionava nadar em Omaha as provas individuais de 100 e 200 metros mariposa e os 200 metros estilos.
Conseguindo, como conseguiu, entrar para a equipa, tornou-se o primeiro nadador norte-americano a competir em cinco edições dos Jogos Olímpicos — 2000, 2004, 2008, 2012 e 2016. Chegando ao Rio de Janeiro, como chegou, poderá tornar-se no mais velho nadador a obter uma medalha de ouro em provas individuais.
Mas ele essencialmente desejava dizer que, pela primeira vez, estava preparado para dar o seu máximo. “Se for ao Rio e não chegar às finais, provavelmente vou ficar um pouco [zangado]”, reconheceu. “Mas conseguirei aceitar isso. Agora estou diferente a nível mental.”
Naquela manhã, mergulhou na piscina com cerca de meia dúzia de outros nadadores. Tinha pela frente um dia recheado — treinos, o lançamento da sua nova linha de fatos de banho para competição e uma série de entrevistas com meios de comunicação social. No fim do dia, parecia estar exausto.
Os treinos na piscina exterior começaram de forma calma. As bancadas estavam vazias. O único som audível era o leve bater das braçadas dos nadadores na água. Para cima e para baixo, de um extremo para o outro. Sempre, sem parar.
Phelps estava há dois anos e meio a trabalhar no seu último regresso à competição. No Verão passado, num meeting em San Antonio (Texas), tinha espantado o mundo da natação, e ele próprio, ao nadar os 200 e os 100 metros mariposa em tempos espectaculares para quem regressava à competição — 1m52,94s e 50,56s, respectivamente.
Agora estava prestes a partir para seis semanas de trabalho no Centro de Treino Olímpico em Colorado Springs. Mas primeiro havia que tratar dos negócios, e das entrevistas.
A última ronda de entrevistas realizou-se frente a seis jornalistas numa mesa de uma pequena sala de conferências da Universidade do Estado do Arizona.
Um jornalista francês perguntou-lhe o que tinha aprendido nos últimos quatro anos. Phelps respondeu que tinha aprendido muito sobre si mesmo e que se sentia mais leve.
Um jornalista alemão questionou-o sobre a sua relação com o seu pai, de quem há muito tempo se encontrava afastado. Phelps disse que estava feliz por poder reatá-la.
Um repórter norte-americano perguntou-lhe se ele ainda considerava seriamente a possibilidade de jogar póquer a nível profissional. “Mike, há muito tempo que não jogo às cartas”, retorquiu. “Tenho coisas mais importantes para fazer do que jogar às cartas.”
Acompanhei Phelps durante oito meses em 2004, enquanto ele se preparava para brilhar nos Jogos Olímpicos de Atenas. Observei-o a treinar e a competir, vi-o a comer o pequeno--almoço no seu café favorito em Baltimore. Conheci a sua mãe, Debbie, e o seu treinador. Observá-lo era um prazer. Era competitivo, incansável e dominador. Atacava a água como se fosse um predador a perseguir o jantar. E depois, no auge da sua glória em Atenas, onde ganhou seis medalhas de ouro, teve um gesto de sublime desportivismo.
Tinha suplantado o seu colega de equipa e rival Ian Crocker, vencendo os 100 metros mariposa, garantindo assim o direito a integrar a equipa de estafeta estilos, a coroa de glória da natação olímpica. Phelps, então com 19 anos, sabia que Crocker estava a debater-se com uma infecção na garganta e sentiu que ele merecia mais uma hipótese. Anunciou que iria desistir do seu lugar na equipa de estafeta a favor de Crocker.
“Estarei na bancada e apoiarei o mais que puder”, disse Phelps naquela altura. “Chegámos a este evento como uma equipa e vamos sair daqui como uma equipa.”
Na noite seguinte, Crocker conduziu a equipa de estafeta dos Estados Unidos à vitória e a um novo recorde mundial.
A última vez que falei com Phelps nesse ano foi no mês de Novembro. Os Jogos Olímpicos há muito tinham terminado. Uma noite, telefonou-me para casa, algo que nunca antes tinha feito. Cinco dias antes, tinha sido detido pela Polícia do estado do Maryland na zona costeira de Eastern Shore e acusado de conduzir sob a influência de álcool e desrespeitar um sinal de stop.
Agora estava a contactar com os jornalistas para ler uma declaração que tinha preparado: “Na semana passada cometi um erro. Entrar para um automóvel tendo bebido é incorrecto, perigoso e inaceitável. Tenho 19 anos, mas ensinaram-me que, independentemente da nossa idade, devemos sempre assumir a responsabilidade pelos nossos actos, e eu vou fazer isso. Lamento imenso tudo isto. (...) É tudo o que tenho a dizer por agora.”
“Fiquei extremamente envergonhado”, escreveu quatro anos depois numa curta autobiografia. “Senti que tinha caído desde o topo do mundo até ao mais negro dos buracos.”
O pior de tudo era que tinha feito chorar a sua mãe. Nunca a tinha visto tão preocupada. “Jurei que isso nunca voltaria a acontecer”, escreveu Michael.
Phelps recuperou e ficou ainda mais famoso nos Jogos Olímpicos de Pequim em 2008. O presidente George W. Bush telefonou-lhe. Foi recebido em triunfo com um desfile na sua cidade natal de Baltimore, e criou a sua própria fundação de solidariedade. Parecia que toda a gente sabia quem ele era. Taxistas. Bagageiros no aeroporto. Fotógrafos. A vida era boa e corria-lhe bem. E valia milhões.
A marijuana
Mas, como explicou, já não tinha tempo para algumas das pessoas que antes lhe eram tão próximas. Os amigos começaram a perguntar-lhe o que estava a acontecer, o que se estava a passar.
Cinco meses depois dos Jogos de Pequim, a sua imagem voltou a ser abalada.
A 1 de Fevereiro de 2009, um tablóide britânico já desaparecido informou que Phelps tinha inalado várias vezes de um cachimbo de água com marijuana numa festa no mês de Novembro em Columbia (Carolina do Sul). Uma fotografia que acompanhava o texto mostrava um homem que parecia ser Phelps a usar o dito cachimbo.
Num comunicado enviado no dia seguinte, Phelps declarou que tinha tido um comportamento inaceitável e prometeu que tal não voltaria a acontecer.
A Federação de Natação dos Estados Unidos suspendeu-o da competição por um período de três meses.
Isso deu-lhe tempo para reflectir: o que estava a fazer? Iria abandonar a natação? Para onde se dirigia?
Um mês depois, Phelps acordou na sua casa perto do porto de Baltimore. Pela janela olhou para a água, e, “como se se tivesse ligado um interruptor”, percebeu o que se seguia.
Queria competir nos Jogos Olímpicos de 2012 em Londres. Desta vez, queria ser um líder, um modelo de comportamento. Iria mostrar que uma pessoa pode aprender com os seus erros.
Telefonou a Bowman e disse-lhe: “O meu entusiasmo regressou.” Na realidade, não tinha regressado.
Phelps tem falado muitas vezes nos últimos meses sobre como se preparou deficientemente para Londres. Os seus treinos eram “uma brincadeira”, diz. Às vezes aparecia nos treinos; às vezes não aparecia. A sua relação com Bowman deteriorou-se. “Nunca permitirei que algum atleta me trate da forma como o Michael me tratou nessa época”, escreveu Bowman num livro publicado em Maio deste ano.
“Acabámos por apenas nos tolerarmos um ao outro”, afirma o treinador. “Houve uma altura por volta de 2010 em que fiquei tão frustrado que simplesmente fui-me embora, para a Austrália, durante três semanas.” “Foi do género ‘Se não vais estar por aqui, eu também não vou ficar’. Deixou de me falar”, confessou Bowman, que é o treinador da equipa masculina dos EUA no Brasil.
Mas Phelps conseguiu entrar para a equipa dos Estados Unidos e ganhou mais quatro medalhas de ouro.
Após terminarem os Jogos, estava farto da natação. Não queria ter mais nada que ver com a modalidade. Estava noutra.
Sempre gostara de, entre outras coisas, jogar póquer. Admirava os jogadores profissionais de topo, e o jogador de póquer profissional Jeff Gross viveu durante algum tempo com ele em Baltimore. “Acho que actualmente me sinto mais à vontade numa mesa de póquer do que numa piscina”, avançou ao site PokerStars.com em 2013. “Quando estava na piscina, aquilo era apenas o meu trabalho”, acrescentou.
Fora das piscinas, não tinha trabalho, e não tinha identidade. “Considerava-me um nadador, e nada mais”, relembra.
A sua mãe afirma que a família tentou afastar-se da natação: “Estávamos a tentar cortar com a modalidade.”
Aos domingos, Michael, que vivia então na zona de Canton, em Baltimore, juntava-se à família no seu camarote de luxo nos jogos em casa da equipa de futebol americano dos Ravens. “Começámos a ter uma vida normal”, explica a sua mãe.
Mas ele continuava a tentar perceber qual era o seu lugar e se nele se poderia encaixar, diz Debbie Phelps. Parecia-lhe que o seu filho estava cansado e perdido.
Em Agosto de 2013, Phelps perguntou a Bowman se podiam ir jantar os dois. Tinham-se visto muito pouco desde o regresso de Londres. Durante o jantar, num hotel de luxo em Baltimore, Phelps comunicou-lhe que tencionava regressar à competição e tentar mais uma edição dos Jogos Olímpicos. Bowman ficou devastado. “Não queria voltar a passar por tudo aquilo outra vez”, conta. “Não podia. Nem pensar.”
Disse a Phelps que se ele só ia regressar por causa dos seus patrocinadores, ou porque não tinha mais nada para fazer, isso seria um grande erro.
Bowman diz que perguntou a Phelps: “Estás a dizer-me que alguém que tem todo esse dinheiro, a liberdade de fazer o que quiser, escolher o que quiser, de algum modo todas essas coisas não satisfazem uma necessidade interior que a natação satisfaz?” Phelps respondeu que sim. E Bowman replicou: “Nessas circunstâncias, se concordares em fazer as coisas como deve ser, então aceito e aprovo.”
O nadador recomeçou os treinos um mês depois.
Pouco depois da uma da manhã de 30 de Setembro de 2014 Phelps saiu do luxuoso Casino Horseshoe, em Baltimore.
Um ano após o seu regresso às piscinas, o plano não estava a ser bem sucedido. As consequências da sua longa ausência e do fraco treino para Londres estavam à vista. “Foi muito difícil para ele voltar a ficar em forma”, conta Bowman. “Acho que ele ficou desencorajado. Eu fiquei desencorajado.”
Phelps tinha faltado a algumas sessões de treino e Bowman estava preocupado. “Tinha receio de que ele estivesse a seguir por um mau caminho”, recorda o treinador. Phelps contou à NBC que estava num mau caminho e estava a segui-lo “muito rapidamente”.
Nessa noite tinha ido para o casino ao volante do seu novo Range Rover branco com espalhafatosas jantes especialmente encomendadas.
Não se sabe exactamente o que foi lá fazer, mas o casino tem uma grande sala dedicada ao póquer, e Nicole Johnson, a sua noiva, diz que ele provavelmente teria ido jogar às cartas. Também tinha bebido.
Nicole tinha-lhe telefonado de Los Angeles, exactamente quando ele estava a sair do casino. “Eu já estava na cama”, lembra a sua noiva. “Eu estava a viver na Califórnia. Tinha de ir trabalhar de manhã. Só perguntei se estava tudo bem.” Ele respondeu que estava tudo bem.
Ele e Nicole, que namoravam intermitentemente há sete anos, tinham voltado a juntar-se, mas mantinham uma relação à distância, cada um na sua costa dos Estados Unidos. “Eu ia visitá-lo de avião o máximo que podia”, diz Nicole. “Eu estava em Los Angeles. Ele estava em Baltimore.”
Nicole Johnson, uma ex-Miss Califórnia, tinha conhecido Phelps em 2007 na cerimónia de entrega dos prémios desportivos ESPY, em Hollywood. “Demo-nos logo bem”, conta Nicole. “Ele era muito divertido.”
Os dois viveram juntos quando Phelps estava a treinar na Universidade do Michigan, onde Bowman era treinador, mas depois separaram-se. “Tínhamos ambos de crescer”, explica ela. “Ele tinha o mundo a seus pés, estava no auge da sua carreira em 2008. (...) Eu não estava nessa situação.”
Nicole não se deslocou aos Jogos Olímpicos de 2008, nem aos de 2012, numa altura em que ela e Michael estavam separados. Mas em 2014 já estavam de novo juntos. (Ficaram noivos em Fevereiro de 2015 e tencionam casar-se após os Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro.)
Phelps deixou o casino e meteu pela auto-estrada 395 em direcção ao sul, que faz uma curva apertada quando se entronca com a I-95 que se dirige para norte. O limite de velocidade era de 45 milhas [72 quilómetros] por hora. De acordo com a polícia, Phelps ia a 84 milhas [135 quilómetros] por hora.
Passou velozmente pelo agente Hirbod Mirzaie, da Divisão de Túneis, que estava a operar um radar que registou a velocidade de Phelps. Mirzaie saiu em perseguição do Range Rover.
Phelps continuou em grande velocidade pelo Túnel Fort McHenry, ultrapassando outros veículos e mudando de faixa. Mirzaie alcançou-o e mandou-o encostar a seguir à praça das portagens.
Mirzaie escreveu no seu relatório que Phelps cheirava fortemente a álcool e que o seu discurso era “pastoso e arrastado”.
Phelps estava cambaleante enquanto o agente o submetia aos habituais testes de alcoolemia. Por vezes mostrou-se desorientado, noutras agressivo. Após falhar nos testes na estrada, foi algemado e levado para a esquadra de Clinton Street, nas margens do rio Patapsco.
Aí, o teste do balão revelou que Michael tinha um nível de álcool no sangue de 0,14 gramas por 210 litros de ar expirado, quase o dobro do limite legal, de acordo com a polícia. Confiscaram-lhe a carta de condução.
Phelps ligou a algumas pessoas após ser detido. Uma foi o antigo jogador de futebol americano dos Baltimore Ravens Ray Lewis, que há muito era seu grande amigo. Phelps contou-lhe o que tinha acontecido. Lewis ficou consternado, mas mostrou-se compreensivo.
Lewis conta que mais tarde se encontrou com Phelps, a mãe dele e mais algumas pessoas durante algumas horas, na casa do nadador. Phelps estava desanimado. Disse à revista Sports Illustrated que a dada altura já não sentia vontade de viver. Mas Lewis contrapôs: “Temos de ir (...) a um encontro com Jesus.”
“Disse-lhe: ‘Ok, tudo na vida tem um objectivo, e agora, vê só, está na hora de acordar’”, conta o ex-jogador de futebol americano. Deu a Phelps um exemplar do livro Uma Vida com Objectivos, do autor cristão Rick Warren.
O programa de recuperação
Cinco dias após ter sido preso, Phelps anunciou via Twitter: “[Vou tirar algum tempo para] frequentar um programa que me concederá o auxílio de que necessito para melhor me conhecer.”
Foi de avião com Nicole Johnson e a sua irmã Hilary até ao Arizona, onde iniciou um programa de 45 dias na clínica Meadows, em Wickenberg.
“Estávamos receosos”, admitiu Nicole. “Não sabíamos o que aquilo acarretaria e o que significaria para o Michael. E, do meu ponto de vista, também não sabemos o que vai acontecer ao Michael no fim do programa, e o que é que lhe vai custar.”
Nicole regressou a Los Angeles e ia de avião visitá-lo todos os domingos. “É uma viagem curta”, explica.
De início Phelps mostrou-se relutante face ao processo, mas acabou por o aceitar. “Cada dia sentia-me mais confiante e mais feliz”, explicou.
Lewis conta que ele e Phelps conversaram, de viva voz e por sms, sobre o livro de Warren.
Phelps ligou ao seu agente de longa data, Peter Carlisle, que detectou uma mudança na sua voz. “Foi uma sensação tão boa”, lembra Carlisle. “Ele tinha um tal entusiasmo na sua voz. Estava mesmo empolgado.”
Phelps também telefonou a Bowman. A princípio o treinador estava céptico: “Ele nunca me liga. Nunca.” Mas, a meio do programa, Bowman foi de avião de Baltimore até ao Arizona e passou um dia com o seu pupilo. Quando lá chegou, ficou espantado.
“Nem conseguia acreditar no que estava a ver”, diz Bowman. “Nunca pensei que ele aceitasse aquele processo tão entusiasticamente. Pensei que ele ia apenas ficar ali sentado até que o tempo do programa chegasse ao fim. (...) Quando o vi, ele tinha mudado de forma dramática.” Phelps também tinha estado a levantar pesos, a correr e a utilizar a piscina da Meadows para treinar.
“Meu Deus”, pensou Bowman enquanto se despedia e deixava a clínica. “Afinal ele pode mesmo regressar e nadar outra vez.”
Exclusivo PÚBLICO/
Washington Post
Tradução de Eurico Monchique