Porque é que o PSD precisa de um teste ácido

Só há um rótulo que aceito para o PSD. É o rótulo de reformador.

Devia ser obrigatória, em qualquer artigo de opinião no mês de Agosto, a apresentação de um aviso legal: “Atenção Silly Season”. A verdade é que estamos quase todos de férias: o parlamento está de férias, os políticos vão a banhos e o nosso Portugal está em modo chinelo no pé. O grande tema do momento parece ser o “Liberdade”, o acampamento anual, livre e autogerido (seja lá o que isto significa) da juventude do Bloco de Esquerda – já agora, e para informação do leitor, parece que o dito não existe formalmente, sendo uma espécie de corrente de influência que não deseja ter personalidade jurídica, nem tão pouco fazer parte de qualquer órgão formal do BE. Onde é que já vimos isto? Tal pai, tal filho, visto que o Bloco dos graúdos também quer influenciar o rumo do País sem querer fazer parte do seu Governo, muito menos ser responsabilizado pelos actos do mesmo. Mas esta discussão afasta-me do que quero trazer a este espaço. E, por mais paradoxal que possa parecer, começa por um elogio rasgado ao BE. É que o Bloco de Esquerda é talvez o partido em Portugal que mais tem sido capaz de atrair os melhores talentos, as melhores cabeças, os melhores quadros para engrossar as suas fileiras.

O Bloco, por ser um partido novo, que lutou e ainda luta muitas vezes pela sobrevivência, escancarou as suas portas, atraindo os melhores talentos, ansiosos por contribuir para a transformação da sociedade à imagem doutrinária e ideológica de uma certa esquerda europeia. Do ISEG ao ISCTE, de Direito a Filosofia, das Belas Artes a Arquitectura, o BE conseguiu atrair centenas de talentos que contribuem activamente para a construção da pirâmide discursiva actual dos bloquistas. Mais importante do que isso, assimilou quadros que são motores da geração de opinião na sociedade, através dos media, da academia, das redes, das empresas e das instituições. Por oposição os partidos tradicionais fecharam-se, salvaguardando o poder interno dos que já lá moravam. Estatutos antiquados, pouco flexíveis, regras muitas vezes discricionárias, constituem ainda hoje um incentivo poderoso ao afastamento dos melhores dos melhores. Novo aviso legal: como é público, faço parte do PSD há mais de 20 anos, com responsabilidades a todos níveis. Por esta razão e por assistir ao surgimento, na sociedade portuguesa e europeia, de um populismo demagógico, sem estratégia e que pode hipotecar o nosso futuro por muitas gerações, é que acredito que é o tempo de dizer que algo tem de mudar. Os nossos melhores hoje não resistem ao apelo de carreiras meteóricas na banca ou na energia, sectores mal regulados que por isso mesmo distorcem as regras de mercado. Deixam-se seduzir pelo brilho de carreiras internacionais que garantem rendimentos nunca antes sonhados. Para captarem os melhores e mais competentes, os partidos têm de jogar neste tabuleiro, encontrando incentivos suficientemente apelativos para atrair e reter o melhor talento nacional.

Eu não acredito numa democracia autogerida ou gerida pelos mercados e empresas – esses têm de ter o seu espaço de liberdade (bem regulada) que garanta o crescimento saudável e necessário da economia. Eu sou daqueles que acreditam na democracia baseada em partidos e, como tal, são os partidos os grandes catalisadores e promotores da mudança e transformação das sociedades. Se partilharmos esta visão, então não podemos permitir que o mais valioso capital do país, o humano, não tenha voz, influência e intervenção nos mesmos. Temos de criar este espaço, sem medo egoísta de perder ou diluir os nossos poderes internos. Temos de ligar os partidos às universidades, as do ano inteiro e não as de verão. É lá que o talento é gerado e potenciado. Por isso, daqui lanço o ‘acid test’: o PSD tem dois anos para atrair mil talentos (1% dos licenciados, mestres e doutores que saem anualmente das nossas universidades), os melhores dos melhores jovens com menos de 35 anos que sejam empreendedores, profissionais, académicos e encontrar formatos de os envolver a diferentes níveis de política.

O talento tem de sentir que tem influência, de facto e não virtual, no rumo dos acontecimentos. Não quero, com isto, apresentar um novo modelo de gabinete de estudos ou de uns estafados estados gerais. Isso são relíquias, anacronismos. Iniciativas de fachada e não estruturais. Se o PSD quer ser verdadeiramente atractivo tem de oferecer incentivos claros, verdadeiros e sustentáveis. Rotularam-nos de liberais – e sim, sou liberal em muitas vertentes das nossas vidas. Todavia, só há um rótulo que aceito para o PSD. É o rótulo de reformador. Para reformar Portugal precisamos de ter ao nosso lado os melhores e os mais competentes. A geringonça é hoje o projecto político mais reaccionário e conservador de que tenho memória. É o PSD que lidera a agenda reformista, transformadora e renovadora da sociedade portuguesa. Para que essa agenda se efective, temos mesmo de dar mais um passo, curto mas precioso, no sentido de abertura à sociedade e aos seus melhores.

Gestor, vice-presidente da Câmara Municipal de Cascais

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