Um livro para desenferrujar a língua e os costumes, a partir do Porto

João Carlos Brito apresenta esta sexta-feira o seu Dicionário de Calão do Porto, em modo revisto e aumentado.

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As expressões do Porto, presentes na Rua das Flores, através da arte urbana Paulo Pimenta
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As expressões do Porto, presentes na Rua das Flores, através da arte urbana Paulo Pimenta
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As expressões do Porto, presentes na Rua das Flores, através da arte urbana Paulo Pimenta

João Carlos Brito promete que, depois desta, desampara a loja e, andor violeta, que há outros projectos para cumprir. Depois de um haquitriqui (hat-trick), com Heróis à Moda do Porto (2010), de Lugares e Palavras do Porto (2014) e do Dicionário de PORTOguês-Inglês (editado em 2015, em co-autoria com Ana Cruz e Cristina Vieira Caldas), este professor, portuense e portista, lança esta semana um revisto e aumentado Dicionário de Calão do Porto, remate para poker, de um autor que, nisto dos livros sobre o tema já deu uma abada das antigas à concorrência. 

A culpa é da cidade, e dos que nela vivem. Portugal tem duas línguas oficiais – o Português e o Mirandês – mas no Porto, e na região em volta, o uso que é dado à primeira é de tal modo inventivo que há muito se constituiu um corpus de expressões típicas, que identificam os “nativos-falantes” entre si, e perante os outros. João Carlos Brito, um “apaixonado” por estas questões da identidade socio-linguística, apercebeu-se disso quando foi estudar para Aveiro. A sessenta quilómetros, tão à beira de casa (ao pé, diriam no Sul), havia palavras e expressões desconhecidas para os seus interlocutores. Gente estranha, que nunca tinha usado uma sertã para fritar um ovo.

Estes localismos, regionalismos, expressões familiares, populares, de gírias e de algumas formas de calão têm sido a matéria de investigação de João Carlos Brito. É um trabalho sem fim, admite, confessando que logo depois de ter entregado este seu último livro à gráfica lhe apareceram mais algumas expressões “óbvias”, como ir de escantilhão (algo como rolar por uma ribanceira abaixo, segundo o Ciberdúvidas), que já não entraram neste Dicionário de Calão do Porto. O trabalho estava feito, e sexta-feira, às 21h30, no café Progresso, volta a falar-se português à moda do Porto, durante a apresentação deste livro.

Brincando um pouco, o evento é desaconselhado a lagartos (sportinguistas) e a lampiões – adeptos desse clube dos seis milhões que, depois de umas épocas a ganhar a Taça da Cerveja (Taça da Liga) tem ultimamente quilhado (lixado) a malta do FCP no campeonato. A cidade incorpora no seu falar muito dessa relação intensa com os azuis-e-brancos e respectivos adversários, e João Carlos Brito, num dos seus 30 artigos em que desenvolve a origem e as histórias em torno de algumas expressões – chega a dedicar uma página ao Papa, cognome de Pinto da Costa. Nisto dos futebóis, o Porto teve em Fernando Santos o engenheiro do Penta, mas o actual seleccionador nacional falhou a seguir o Bi-tri, que é como quem diz o Hexa-campeonato. Estávamos no início do milénio, e o Sporting de Inácio nem precisou de um Calabote (antigo árbitro, e polémico) para calar o tribunal das Antas.

Mas, nisto da bola, se uns dias estamos c’a beiça, noutros a equipa engata a quinta e vai que Gelsenkierchen se torna, graças a Mourinho – um treinador fino com’o alho – e aos seus, uma expressão local, inesquecível para os adeptos do Fêquêpê. Que guardam boa memória de outras cidades, como Dublin (liga Europa, frente ao SC Braga), Sevilha (Liga Europa, contra o Celtic de Glasgow) e claro, de Viena, onde em 1987, o clube, já então liderado pelo Papa, e sob a batuta de Artur Jorge, desunhou-se muito bem perante o Bayern de Munique e venceu a sua primeira competição europeia. Outros tempos, que cunharam a expressão golo à Madjer, gesto repetido por Ronaldo, no Euro 2016, com sucesso. Com o actual domínio dos mouros, o Porto vai ter de dar corda aos vitorinos (correr) para voltar a pôr a escrita em dia e a cidade a festejar o São João antecipado, enchendo os Aliados lá para o final de Maio.  

Graças a uma atenção quotidiana, a muitas entrevistas, leituras e, aos amigos (do Porto e de outras regiões, usados, estes, como grupo de controlo para validar os termos) ao todo, este dicionário de “calão” inclui mais de 2500 entradas e 4000 significados para essas palavras ou expressões. Quase todas carregadas de muito humor, ou não fossem este falares ditos “marginais” – porque usados nas margens da linguagem corrente – ferramentas úteis para a crítica social, em múltiplas circunstâncias. São, acima de tudo, vinca João Carlos Brito, marcas fortes de uma identidade que resistiram ao tempo, as mais antigas – e à globalização, que tudo equaliza - coligidas num trabalho levado “muito a sério”. “Esta não é uma obra académica, mas pode ser uma boa fonte para trabalhos académicos”, assume o autor, que depois destas incursões bem-sucedidas neste português do Porto, vai continuar a dar ao zingarelho (trabalhar), para lançar um dicionário dos falares marginais de todo o país. Um projecto do carago

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