Teresa Bonvalot: "O surf tem uma magia… Mas só a sentimos quando a experimentamos"

A jovem surfista portuguesa, de apenas 16 anos, sagrou-se campeã europeia de surf. A próxima meta é chegar ao título mundial da categoria, já em Janeiro do próximo ano.

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Teresa Bonvalot lamenta que Portugal não tenha mais atletas no surf DR

Na praia de Sopelana, no País Basco, Teresa Bonvalot sagrou-se campeã europeia de surf, em juniores. A surfista de Cascais tem estado em grande no circuito europeu, depois de três vitórias (Caparica, Espinho e Corunha), um terceiro lugar (Biscarrosse, França) e um segundo lugar, no País Basco.

Agora, é sem pressão que Teresa Bonvalot parte para a última etapa, em Novembro, nas Ilhas Canárias, podendo também preparar o Mundial de juniores, marcado para Janeiro.

O PÚBLICO foi falar com “Teresinha”, que, aos 16 anos, se tornou a primeira portuguesa a conseguir o título europeu, depois de Tiago Pires, em 1999, e Vasco Ribeiro, em 2014, terem conseguido o mesmo, mas no sector masculino.

Começando pelo início do seu percurso no surf, pode contar-nos como e quando surgiu o interesse pela modalidade?
Comecei a surfar com nove anos, mas o gosto pelo mar e pelo desporto começaram bem cedo. Vivi sempre perto da praia e passei muito tempo na praia com a família e amigos. O meu pai praticou vela, windsurf e kitesurf durante muitos anos e eu cresci num ambiente de mar e pranchas. A partir dos seis anos, comecei a fazer bodyboard e passava horas a fio dentro do mar, até que a vontade de me por “em pé” surgiu, mais tarde, com a influência dos amigos dos meus pais.

E lembra-se da primeira competição em que participou?
Sim, claro. Foi em 2009, num campeonato do desporto escolar, em São Pedro [do Estoril]. Terminei este campeonato em segundo lugar e recebi uma medalha. Lembro-me de ter ficado “roída” e de dizer ao meu pai que, no ano seguinte, queria ficar em primeiro, para ganhar a taça, e não apenas uma medalha. Assim aconteceu.

Antes do surf, a Teresa ainda se aventurou no futebol e no atletismo, modalidades para as quais, segundo consta, até tinha algum talento. O que é que a fascinou no surf, que a levou a abdicar das outras modalidades?
Sim, praticava atletismo na escola e participava nas corridas que a escola organizava. Quanto ao futebol, sempre gostei e continuo a gostar. A minha irmã mais nova e eu treinávamos três vezes por semana, no clube da Malveira da Serra. Mas quando o mister começou a puxar-me para os jogos de futebol, o meu pai começou a desviar-me mais para o mar.

Venceu o circuito europeu de juniores, com uma boa prova no País Basco, tornando-se a primeira portuguesa campeã europeia de surf. Como é que uma jovem de 16 anos vive toda a atenção mediática que a imprensa e o público português lhe dá? Já é reconhecida na rua?
Claro que fico contente, mas não dou muita importância a isso. Desde cedo habituei-me a ser entrevistada e aparecer nos sites de surf e jornais, mas também já aprendi que, no desporto, num momento podemos estar em alta, e logo a seguir sermos esquecidos.

Quando chegou à final da prova, no País Basco, já era campeã europeia. Como é que geriu as emoções no momento em que ainda tinha uma final para disputar naquele dia?
Após os quartos-de-final, ao vencer esse heat, fiquei com o sentimento de missão cumprida, o objectivo estava alcançado. Mas o campeonato ia continuar e voltei a ligar o “modo de competição”. Passei o heat da meia-final, mas, na final, a minha adversária conseguiu apanhar uma onda melhor e venceu a etapa.

No ano passado, apesar de um bom início de temporada, acabou por ficar em segundo lugar no circuito europeu, depois de um final de época menos feliz. Em que é que essa desilusão influenciou esta nova época?
No surf, assim como em todos desportos de competição, acabamos por perder mais vezes do que ganhamos. Assim, e embora nos custe, temos que tirar partido das derrotas, para nos tornarmos mais fortes. Neste ano, encarei a competição com mais foco e determinação.

Falando do seu dia-a-dia, quais são os principais sacrifícios que uma surfista de alta competição tem de fazer?
Eu não encaro como sacrifícios coisas como o ter de levantar cedo, não fazer noitadas, não beber, entrar dentro do mar no Inverno ou ter cuidado com a alimentação, mas talvez para a maioria das pessoas seja. Mas o facto de termos uma vida e ritmo diferentes da maioria das pessoas da minha idade, leva-nos a outro tipo de sacrifícios.

O surf tem prioridade total nesta fase da carreira ou ainda consegue arranjar espaço para os estudos?
Estou numa fase mista, em que o surf e os estudos andam em guerra entre si [risos]. A minha cabeça e corpo têm estado mais no surf, mas, neste ano, ainda deu para passar para o 12.º ano.

Em 2014, com 14 anos, deu uma entrevista em que disse que costumava pedir ao seu pai para a filmar a surfar, para depois poder ver as imagens e melhorar. Continua a ter esse ritual de auto-análise, ou o nível mais profissional já não permite ter tempo para essa preparação tão minuciosa?
Sim, continuo com esse hábito. Acho que é imprescindível, se queremos evoluir mais rapidamente.

Quais são os seus principais hobbies, quando não está dentro de água?
Já tive hobbies quando era mais nova, como a flauta, o skate e o futebol. Agora, com tantos treinos, competições e viagens, não existe tempo para hobbies. Quando tenho tempo livre, gosto de cozinhar ou simplesmente relaxar a ver televisão ou gerir as redes sociais.

Muitos atletas de modalidades paralelas ao futebol queixam-se da pouca atenção dada pelas federações e pela opinião pública. A Teresa, como surfista, queixa-se do mesmo?
Não. Felizmente, o surf encontra-se em crescimento, em Portugal e no mundo. Eu beneficiei do programa de Desporto Escolar e foi assim que comecei a competir. Nós temos uma federação e uma associação que tem trabalhado muito bem no surf e tem ajudado muito os atletas. Temos programas semanais de televisão dedicados ao surf. Mas claro, nunca vamos ter as audiências que o futebol tem.

Depois do título europeu de futebol, das medalhas nos europeus de atletismo e do título europeu de hóquei, alguns atletas portugueses foram recebidos e condecorados pelo Presidente da República. Depois do título europeu de juniores, em surf, sente que merece um reconhecimento semelhante?
Não. Não comparo a importância desse títulos com o meu. Sei que o nosso Presidente da República é um apaixonado pelo mar e pelo bodyboard, por isso, quando nos encontrarmos na água, com certeza me dará os parabéns e me incentivará a continuar.

A Teresa é de Cascais, uma zona com praias e com boas condições para os surfistas. O que acha que pode ser feito para aumentar o número de praticantes em Portugal? Há pouco falou do Desporto Escolar...
Portugal tem uma costa enorme, com muito boas ondas, de Norte a Sul do país. Não temos o frio de Inglaterra ou França, nem os tubarões de países como Austrália ou África do Sul, mas o facto é que temos menos surfistas. Portugal deveria alargar o programa do Desporto Escolar e surf em todas as escolas do litoral.

Estamos a poucos dias do início dos Jogos Olímpicos, que não contarão com o surf. A proposta de incluir o surf nos Jogos Olímpicos de 2020, em Tóquio, tem gerado controvérsia e alguma divisão. É a favor da inclusão da modalidade nas Olimpíadas?
Sim, sou a favor. Actualmente, já existe um género de Olimpíadas do surf, os campeonatos mundiais da Associação Internacional de Surf.

Dado que alguns países organizadores de Olimpíadas podem não ter praias e boas ondas, o que pensa da hipótese de a prova olímpica de surf ser disputada numa piscina de ondas artificiais?
O Surf, numa piscina de ondas, será sempre diferente. Para mim, o surf é mais do que descer ou deslizar numa onda. Mas para os países organizadores sem mar, é uma alternativa. Já testei uma piscina de ondas, mas, para ser apropriada para a competição, acho que ainda tem de ser mais desenvolvida.

Olhando para o futuro, quais são as principais metas?
Treinar, evoluir, treinar, evoluir, para um dia chegar ao World Championship Tour [Circuito Mundial de Surf].

E para quando o título mundial? É uma ambição já para Janeiro, na Austrália, quando disputar o Mundial de juniores?
Para o título mundial de juniores já só tenho mais duas tentativas, depois deixo de ser júnior. Quando entro numa competição, dou sempre o máximo e vou com o objectivo de ganhar, mas sei que a concorrência é muito forte. Vamos ver…

Se tivesse de convencer, numa frase, todos os jovens a praticar surf, o que lhes diria?
O surf tem uma magia… Mas só a sentimos quando a experimentamos.

Texto editado por Jorge Miguel Matias

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