Irregularidades em clínica universitária dão origem a quatro processos disciplinares
PJ está a investigar contas da Faculdade de Medicina Dentária da Universidade do Porto e suspeita de desvio de fundos.
Uma pequena pasta com perto de 77 mil euros em dinheiro, colocada em cima de uma secretária, teria desaparecido durante a hora de almoço da contabilidade da Faculdade de Medicina Dentária da Universidade do Porto, sem deixar rasto. O alerta foi dado em Abril do ano passado pela tesoureira da faculdade, que acabou por ser sujeita a um processo disciplinar e punida já este ano com oito meses de suspensão por negligência grosseira.
Na altura, a situação foi participada à PSP e, por determinação do Ministério Público, o processo-crime acabou nas mãos da Polícia Judiciária (PJ), que suspeita de um desvio de fundos. A ausência de sinais de arrombamento ou de violência fez a PJ acreditar na simulação do roubo.
Os factos são confirmados ao PÚBLICO pelo director da faculdade, Miguel Pinto, e pela Reitoria da Universidade do Porto, numa resposta enviada por e-mail. A Procuradoria-Geral da República atesta que há um inquérito a correr no Departamento de Investigação e Acção Penal do Porto, que ainda não tem arguidos.
Os 77 mil euros seriam provenientes da cobrança de serviços prestados na clínica da faculdade, uma unidade usada na formação dos estudantes, que presta atendimento ao público, a preços inferiores aos de mercado e que contabiliza receitas anuais superiores a 600 mil euros.
Uns meses mais tarde, no final do ano passado, a mesma clínica voltou à ribalta, na sequência de uma denúncia apresentada por uma funcionária da instituição. Numa carta, esta dava conta de irregularidades no funcionamento da recepção da clínica, onde os serviços são registados e cobrados. Foi então aberto um inquérito dirigido por um dos membros do conselho executivo, que culminou com três processos disciplinares que, segundo o director da faculdade, ainda “estão em curso”.
Entre as irregularidades detectadas está o facto de alguns serviços prestados e que seriam pagos em prestações só terem sido parcialmente pagos, não tendo sido sequer exigida aos pacientes o pagamento global dos tratamentos a que foram sujeitos. Há, por isso, suspeitas de que as irregularidades causaram prejuízos, ainda não contabilizados, à faculdade.
Prejuízos de 1,6 milhões
A PJ, que começou a investigar o alegado roubo em Abril de 2015, fez buscas na instituição em Outubro de 2015 e em Abril deste ano. “Levaram milhares de documentos”, comprova o director da faculdade, Miguel Pinto. Primeiro, em Outubro, a contabilidade mais recente, relativa a 2014, 2013 e 2012. E, em Abril, a mais antiga, de 2010 e 2011, indiciando que podia haver um esquema de desvio de fundos existente há vários anos, cujo montante, neste momento, não é conhecido.
A juntar a este estranho enredo, verificou-se um grave problema de tesouraria na faculdade detectado em Dezembro de 2014, três semanas depois de o actual director — que fez parte do anterior conselho executivo, com um pelouro ligado à parte académica — ter assumido as novas funções. Miguel Pinto explica que não tinha dinheiro para pagar a funcionários e fornecedores, tendo sido obrigado a pedir um empréstimo à reitoria de 250 mil euros, que foi liquidado no final do ano passado.
A reitoria confirma que nos últimos anos os resultados líquidos acumulados da faculdade foram negativos em cerca de 1,6 milhões de euros, uma situação que a universidade atribui às “amortizações quer dos edifícios, quer dos equipamentos”. Facto é que, em 2015, foi possível pagar o empréstimo à reitoria, amortizar aquelas despesas com instalações em 170 mil euros e, mesmo assim, a faculdade apresentou um resultado líquido de 256 mil euros. O único saldo positivo dos últimos quatro anos.