China dá resposta militar à sentença sobre Mar do Sul

Marinha chinesa vai fechar parte do mar para realizar manobras militares. Aumento do tráfego militar cria mais oportunidades para “erros de cálculo”, alertam analistas.

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Exercício da Marinha chinesa na semana passada no Mar do Sul da China Reuters

A China está a realizar uma série de exercícios militares no ar e na água, que são encarados como uma resposta à recente decisão do Tribunal Arbitral Permanente de Haia, que não deu razão às pretensões territoriais chinesas no Mar do Sul da China.

A decisão do tribunal não foi surpreendente, mas a principal questão que se punha era quais os próximos passos do Governo chinês. “Se Pequim não  for cautelosa e, em vez disso, tomar decisões que aumentem os riscos, estas poderão rapidamente criar novas ameaças à ordem marítima regional que não são do interesse de ninguém”, escrevia no dia da publicação da sentença (12 de Julho) Jonathan Pollack, do Instituto Brookings.

Na terça-feira, a Marinha chinesa iniciou um conjunto de manobras que vão durar até quinta-feira numa área próxima da ilha de Hainan. Segundo o Global Times, o trânsito através da zona onde decorrem os exercícios é proibido, à semelhança do que já tinha acontecido nos dias anteriores à publicação da decisão do tribunal.

A proibição de trânsito em zonas marítimas, mesmo que integrem as zonas económicas exclusivas, contraria a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar e a inclusão desta interdição é mais um indício da postura desafiante de Pequim em relação ao tribunal. Porém, o espaço em questão está longe das zonas mais disputadas no Mar do Sul.

Esta semana a Força Aérea chinesa anunciou também a realização de patrulhas na região, algo que se irá tornar “uma prática regular”, segundo um porta-voz do Exército de Libertação do Povo, citado pela agência Xinhua. Logo após a sentença de Haia, Pequim anunciou que vai avançar para a criação de um espaço de defesa aérea sobre o Mar do Sul da China — à semelhança do que já fez em relação ao Mar Oriental, onde tem litígios territoriais com o Japão.

Em teoria, esta zona de defesa obriga os aviões civis a identificarem-se perante controladores militares chineses. Porém, os EUA já disseram que não vão respeitar nenhuma dessas zonas por não reconhecerem a soberania chinesa, aumentando as hipóteses de falhas de comunicação e o potencial de acidentes.

Segundo um estudo do Instituto Naval dos EUA, a zona de identificação aérea em vigor no Mar da China Oriental está gradualmente a deixar de ser observada por falta de coordenação entre a Força Aérea e a Marinha. O mesmo estudo conclui que, caso uma zona deste género seja realmente proclamada, as forças militares chinesas teriam menos dificuldades em fazê-la cumprir.

Ao mesmo tempo, Pequim está a tentar entrar em negociações directas com as Filipinas. A estratégia chinesa privilegiou sempre o diálogo bilateral com cada um dos estados com quem tem litígios territoriais no Mar do Sul — para além das Filipinas, o Vietname, Malásia e Brunei têm disputas na região.

Esta semana, o ministro dos Negócios Estrangeiros filipino, Perfecto Yasay, revelou que o Governo chinês sugeriu a Manila “ignorar” a deliberação do Tribunal Arbitral. “Eles disseram que se insistirmos na sentença e a discutirmos de acordo com essa linha, então poderemos estar a caminhar para um confronto”, afirmou Yasay, durante uma entrevista ao canal ABS-CBN.

Aumento da tensão

Os EUA, que encaram a região como uma prioridade estratégica, têm intensificado as missões militares de reconhecimento para defender o princípio da “liberdade de navegação”, para desagrado de Pequim. É também de Washington que vêm as maiores pressões para que a China acate a decisão do Tribunal Arbitral, apesar de os próprios EUA não serem signatários da Convenção da ONU sobre o Direito do Mar. Esta quarta-feira, o chefe das Operações Navais da Marinha dos EUA, John Richardson, garantiu que irá ser dada continuidade às missões norte-americanas, após um encontro com dirigentes militares chineses.

Com o aumento do tráfego militar no Mar do Sul da China, aumentam também os riscos de erros de cálculo. “Se um dos lados arrisca e julga que o outro lado irá recuar e está enganado, então as coisas podem ficar fora de controlo muito rapidamente”, disse à CNN Anton Alifandi, analista da consultora de segurança e defesa IHS.

Pequim recusou-se desde o início do processo a participar nos procedimentos, ao não indicar um juiz, a faltar às audiências e a não apresentar uma defesa da sua posição.

A China tem reivindicações que abarcam a quase totalidade do Mar do Sul — uma zona de grande importância estratégica por onde passa um terço do comércio marítimo mundial. As suas pretensões baseiam-se num “direito histórico” de soberania e traduzem-se na chamada “linha de nove traços”, que delimita as pretensões territoriais chinesas.

A convicção de que o Mar do Sul pertence por inteiro ao território chinês está profundamente enraizada no país. Nos livros escolares de Geografia, por exemplo, não há qualquer menção às disputas de outros países naquela zona e o ponto mais a sul da China é designado como um recife a mais de 1700 quilómetros do continente e a apenas 80 da costa da Malásia.

A sentença do Tribunal Arbitral de Haia veio derrubar a argumentação chinesa, ao não reconhecer os direitos históricos como base para reivindicações territoriais. Não há, porém, qualquer mecanismo de implementação de sanções ou penalizações para países que não cumpram as sentenças. O processo tinha sido interposto pelas Filipinas em 2013 e em causa estava o controlo sobre o recife de Scarborough, a 350 quilómetros a noroeste de Manila, onde a China começou a fazer trabalhos de construção. Segundo o tribunal, que se rege pela Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, não há fundamentos legais para as reivindicações chinesas.

 

 

 

 

 

 

 

 

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