Hugo Lloris, o líder discreto
Na baliza dos "bleus" está um dos seus melhores elementos e um capitão que lidera pelo exemplo.
Os duelos de guarda-redes são feitos sempre à distância de mais de uma centena de metros. Nunca se cruzam no campo, a não ser em momentos de desespero nos últimos, em que um deles vai até à outra área para tentar alguma coisa numa bola parada. Isso não aconteceu no França-Alemanha, em Marselha, na última quinta-feira, porque já estava 2-0 para a França, não apenas graças aos golos de Griezmann, mas também pelas mãos de Hugo Lloris a fazerem aquilo que Manuel Neuer não conseguiu fazer nas redes germânicas. Neste duelo à distância, Neuer mostrou-se falível. Lloris, pelo contrário, foi sobre-humano. E não foi a primeira vez.
Dependendo ainda do que acontecer na final deste domingo, é muito provável que Hugo Lloris seja eleito como o melhor guarda-redes do Euro 2016, e até já aparece referenciado na lista de compras do Real Madrid, que gosta sempre de contratar jogadores quando estes se exibem ao mais alto nível numa grande competição. Mas Lloris, de 29 anos, não chegou agora à baliza da França. Em breve será o guarda-redes francês mais internacional de sempre – está a seis jogos dos 87 de Fabien Barthez – e já é aquele com mais jogos como capitão dos “bleus” (57), tendo ultrapassado já durante o Euro, Didier Deschamps, o seleccionador.
Não foi só contra a Alemanha que Lloris foi decisivo. Fez várias grandes defesas durante os jogos da fase de grupos, em que a França ainda estava a encontrar o seu ritmo, e voltou a segurar muitas bolas de golo contra irlandeses e islandeses. Lloris lidera pelo exemplo e pelas poucas palavras. Não gosta de ser o protagonista, mas é o que ele é, de forma natural, e também no Tottenham, onde passou a ser o primeiro capitão em 2015. Já quando era um jovem a despontar no Nice, Frédéric Antonetti, o treinador, dizia que ele seria um grande capitão por “o melhor líder não é aquele que fala mais, é o que diz coisas com mais sentido”.
Foi no clube da cidade da Côte d’Azur, à beira do Mar Mediterrâneo, que Lloris se revelou. Filho de uma família de classe alta – a mãe advogada, o pai banqueiro em Monte Carlo -, Lloris cedo revelou uma habilidade natural para o desporto e chegou a ser considerado, aos 13 anos, um dos melhores tenistas da sua idade em França. Mas o futebol levou a melhor, a partir do momento em que o viram pela primeira vez num treino de captação do Nice. Em 2006, aos 19 estreia-se na primeira equipa do Nice e, em 2008, transfere-se para o Olympique de Lyon.
Não chegou a ser campeão, mas foi considerado o melhor guarda-redes francês em três das quatro épocas que passou no Stade Gerland, e beneficiou do contacto com uma lenda do futebol francês, Joel Bats, campeão europeu com os “bleus” em 1984 e treinador de guarda-redes do Lyon – pelas mãos de Bats também passou (e está ainda) Anthony Lopes, o sucessor quase directo de Lloris no clube francês. “Ele é um dos três melhores guarda-redes do mundo”, disse Bats em 2012 quando o Tottenham, então treinado por André Villas-Boas, o contratou por uma pechincha (dez milhões de euros, mais cinco milhões por objectivos) para aquilo que ele vale agora.
Lloris não teve uma relação pacífica com o treinador português, nem com o seu sucessor Tim Sherwood, o que o fez duvidar da sua opção pelo clube londrino, mas tudo mudou quando Mauricio Pochettino chegou a White Hart Lane e o convenceu a ficar. O treinador argentino reconheceu-lhe as capacidades de liderança, deu-lhe a braçadeira de capitão numa equipa com muita juventude e o Tottenham quase foi campeão da Premier League. Ser campeão, tanto por um clube como pela selecção, é mesmo o que falta no currículo de Hugo Lloris, um guarda-redes muito seguro e completo, nada exuberante, excelente entre os postes e competente no jogo aéreo e a jogar com os pés. Ele é última barreira que a selecção portuguesa terá de ultrapassar.