Estado vende British Hospital e IMI a fundo. Preço gera polémica
Dois candidatos foram preteridos no negócio pelo Estado, apesar de terem oferecido um preço mais elevado.
O Ministério das Finanças teve conhecimento de que o veículo estatal Parvalorem (que gere os activos tóxicos do ex-BPN) vendeu os créditos sobre a Galilei Saúde, dona do British Hospital e da rede IMI (Imagens Médicas Integradas) ao fundo FPB por cerca de 16 milhões, um valor muito abaixo de outras ofertas. Em causa está a passagem para o fundo luxemburgês com um desconto de cerca de 27% face às dívidas reclamadas pelo Estado junto da Galilei Saúde.
Os alertas às Finanças de que os interesses do Estado não estavam a ser salvaguardados no dossier Galilei Saúde (que junta os activos do sector da saúde da ex-SLN/BPN, nomeadamente o BH e a rede IMI), partiram de vários interessados cujas ofertas foram rejeitadas. Um dos que se manifestaram foi a sociedade de capital risco Capital Criativo, que foi contactada pelos advogados da Parvalorem, a PLMJ, para apresentar uma proposta de compra dos créditos da Galilei Saúde nas mãos do veículo público. A outra entidade sondada foi a Associação Mutualista Montepio Geral (AMMG). E ambas entregaram, separadamente, ofertas irrevogáveis e firmes correspondentes ao preço nominal da dívida da Galilei ao Estado: 22.033.165,06 cêntimos. O objectivo era converter os créditos em capital da Galilei Saúde e passar a controlar o British Hospital e a rede IMI (que, juntos, geram um lucro anual da ordem dos 3,6 milhões, com destaque para o IMI).
No caso da Capital Criatiavo, a proposta previa o pagamento de 22 milhões, dos quais 90% seriam pagos depois de uma análise profunda ás contas, que não foi autorizada. Por parte do comprador, o investimento totalizaria 33 milhões, já que, para além do Estado, existem ainda outros credores. Um deles era o banco Montepio que, ao contrário do Estado (que não tem garantias), estava defendido por acções do IMI.
Fonte da Capital Criativo confirmou ao PÚBLICO “que informou as Finanças” que os interesses do Estado não estão a ser defendidos e pediu à tutela que garanta que os contribuintes não saiam lesados. Explicou ainda às Finanças que a proposta de aquisição que apresentou à Parvalorem previa compra dos créditos “ao valor nominal” de 22 milhões”, superior aos 16 milhões que serão pagos pelo FPB. Por seu turno, o porta-voz da AMMG disse que lhe foi comunicado que a sua oferta não era a melhor, o que “estranhou, mas aceita”.
A consulta da PLMJ decorreu já depois da Parvalorem (que representa o Estado) ter assinado com o fundo luxemburguês FPB um contrato de promessa compra e venda dos seus créditos sobre a Galilei Saúde.
Tal como o PÚBLICO revelou no passado dia 2 de Junho, o contrato de promessa de cessão (cedência) de créditos foi celebrado a 13 de Janeiro entre a Parvalorem (o credor), a Galilei Saúde (o devedor) e o fundo FPB (o comprador): o fundo vai pagar à Parvalorem os 22 milhões, com a garantia de os poder converter em capital da Galilei Saúde. Só que, ao contrário das outras ofertas, cujo pagamento ao Estado era imediato e sem redução, o FPB dispõe até 2028 para o fazer. E em caso de antecipação, e cumpridas as condições, beneficiará de um perdão de seis milhões, a reduzir à última prestação. Ou seja: o FPB pode chegar ao acto da escritura e desembolsar 16 milhões para ficar com o British Hospital e o IMI. A viabilidade do acordo entre o Estado, a Galilei e o FPB estava dependente da aprovação do plano especial de revitalização (PER) da Galilei Saúde, o que se verificou a 30 de Maio. Falta ainda um juiz do Tribunal do Comércio de Lisboa validar a sua legalidade.
Agora, polémica está instalada. Instado pelo PÚBLICO a dar detalhes sobre a natureza do FPB, cuja existência não consta de dados públicos, Francisco Nogueira Leite, presidente da Parvalorem, revelou apenas que este chegou pela mão de dois gestores da Galilei Saúde, Joaquim Esperancinha e Nuno Eduardo Moniz. Fonte da Parvalorem justifica a escolha do FPB, e o eventual perdão de seis milhões, do seguinte modo: “A venda de créditos a terceiros nunca é por concurso público. A operação é analisada naquele momento e naquele momento parece ser a melhor operação.” E diz mais: “Se qualquer dos interessados tivesse avançado com os 22 milhões, teria ficado imediatamente com os créditos, mas nenhum se chegou à frente.”
Sobre o facto de não ter sido permitido aos outros interessados fazerem uma inspecção as contas da Galilei Saúde, antes de avançarem com verbas, o mesmo responsável da Parvalorem explicou que “o objectivo do pedido de due dilligence é fazer baixar o preço do activo e esse é um risco real que não quisemos correr”. Argumentos que são contestados por fontes cujas propostas foram recusadas: “O fundo luxemburguês também não prescindiu de uma due dilligence à Galilei Saúde”. E concluiu com uma dúvida: “Dá ideia de que tudo estava acertado e não se entende porque abriram consulta” a outros interessados.