O pó levanta-se e o silêncio do espaço para autocaravanas em Porto Covo, Sines, é quebrado pela chegada de mais um veículo. Na outra ponta do estacionamento, está um casal jovem sentado à volta de uma mesa, protegido pelo toldo. Vanessa Marcelino, 29 anos, e o marido rumaram de Lisboa na autocaravana dos pais para aproveitarem umas férias. E não trocam este modo de vida por nada.
"Não temos um destino certo, acaba por ser mais vantajoso em relação a preços de hotel, não ficamos tão presos ao mesmo sítio e viajamos. Acaba por ser compensador, conhecemos vários sítios e o alojamento é mais barato", afirma a educadora de infância.
Neste parque de terra batida e seca pelo sol, disponibilizado pela junta local, estão mais de 20 de autocaravanas ou caravanas (carro com reboque), muitas com matrícula estrangeira.na recepção e na criação de condições para os autocaravanistas, mas também ainda se sente o contrário: "Em [Vila Nova de] Mil Fontes acabámos por ser corridos ainda esta semana. Começaram a pôr grades e os autocaravanistas tiveram de vir todos embora. Aqui em Porto Covo somos bem acolhidos, acabamos por movimentar a vila e temos aqui tudo".
Autocaravanismo: uma liberdade total
Bem perto dali, João Ramos, praticante de autocaravanismo há mais de 16 anos, carrega garrafões de água para abastecer a "mini-casa" sobre rodas estacionada no mesmo parque, enquanto a mulher prepara o almoço. Equipada com quarto, casa de banho, cozinha, televisão, água quente e energia obtida através de painéis solares, a autocaravana permite a este casal de reformados de Torres Vedras viver semanas ou meses "com todas as condições", desfrutar da natureza, conhecer o país, não ter horários para cumprir, evitar hotéis e fazer amizades ao longo dos anos.
"Esta já é a segunda autocaravana que tenho. Gosto de praticar autocaravanismo porque é uma liberdade total. Como estou reformado e a minha esposa também gosta muito, optamos por andar com autocaravana e apreciar a natureza: hoje estamos aqui, amanhã vamos para o Algarve, noutro dia estamos noutro lado: é, de facto, uma liberdade total", diz à agência Lusa o antigo comerciante de fruta, de 64 anos.
João Ramos conta que no último fim-de-semana o espaço estava lotado, uma realidade cada vez mais frequente, pois o número de praticantes deste "modo de vida" está a crescer (ver dados à esquerda). "Só é pena que as nossas autoridades não olhem bem para o turismo itinerante porque deixa dinheiro em todo o lado. Uma autocaravana, normalmente, tem duas pessoas. Cem autocaravanas são mais de 200 pessoas que estão naquela localidade, e têm de gastar pão, leite, vão muito a restaurantes e tudo isso leva dinheiro às povoações. E há zonas muito pobres, mais do interior, aonde as autocaravanas dão movimento", vinca o sexagenário.
Cada vez mais portugueses jovens
A cerca de três quilómetros deste parque, junto a uma falésia, encontram-se mais autocaravanas. Uma das quais pertence a Fernando Santos, reformado, emigrante em França. Acompanhado pela mulher, aproveita a vista para o mar para pôr a leitura em dia e desfrutar da paisagem. Autocaravanista há mais de duas décadas, o antigo condutor de autocarros, de 60 anos, considera que as pessoas e as autarquias portuguesas estão mais sensibilizadas para este "fenómeno", que é praticado sobretudo por uma "classe média alta", a partir dos 60 anos.
"Comecei cedo, há pessoas que começam cedo, mas a maioria são reformados e estrangeiros. Em Portugal ainda há pouco, a maioria que se vê são franceses e alemães, mas já se começam a ver algumas autocaravanas jeitosas em Portugal, e os portugueses que vejo são de uma idade mais jovem. É agradável ver isso", refere, com um sorriso.
Ao lado está Maria Angelina, também emigrante em França e que vem habitualmente com o marido a Portugal de autocaravana. "Estávamos a pensar [comprar] cá uma casita, mas depois, para ficar sempre no mesmo sítio não dava. Assim, comprámos uma autocaravana para podermos andar a conhecer de Portugal. Faço Portugal do alto a baixo, de trás para a frente", conta a emigrante.