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O ofendido e os putos

O ofendido chama-se Mário Nogueira e é secretário-geral da Fenprof. Os putos estão em bando e são membros orgulhosos da JSD

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Fenprof

Controvérsias em que nenhum dos lados possui total razão é meio caminho andado para uma situação divertida. É como dissertar sobre se o céu é cinzento ou amarelo: nenhuma das duas está certa mas, em certas alturas do dia, até podem estar, ligeiramente, em certo sentido, com alguma imaginação. "Spoiler alert": nem o ofendido nem os putos sabem que o céu é azul.

Vamos às apresentações. O ofendido chama-se Mário Nogueira e é secretário-geral da maior organização sindical de professores do país, a Fenprof. Os putos estão em bando e são membros orgulhosos da Juventude Social Democrata (JSD). O primeiro ofende-se com pouco e considera uma "ofensa grave" um cartaz que tem numa associação bacoca e num trocadilho simplista a sua essência. O quintalinho sagrado de Mário Nogueira não suporta ser associado ao ditador Joseph Estaline. Se é legítimo? É. Se é desproporcionado achar que tal imagem "fere o bom nome da federação"? Também é. Os segundos estão com a criatividade em alta e, como já nos habituaram, com a produtividade política em baixa. O cartaz é frouxo mas até pode estimular algum sentido de humor em quem se dá ao luxo de ainda o ter no seu reportório de reacções. Qual é a diferença entre a JSD e uma comissão de festas? Só mesmo o financiamento e alguns utensílios de cozinha, porque de política concretizam o mesmo. Só não digo que sabem o mesmo porque pertenci a comissões de festas onde existiam bons debates sobre a esfera pública.

Sobre o ofendido pouco mais há a comentar a não ser o facto de usufruir de um bigode semelhante ao de um professor com quem me cruzei na primária. Se Mário Nogueira algum dia soubesse quem era esse docente eu era o próximo a ser processado pela Fenprof. Sobre os putos há mais uns pormenores. Só mesmo porque as crianças são a esperança da nação.

Em comunicado oficial, a JSD afirma que o cartaz é uma resposta à decisão do Ministério da Educação de reduzir o financiamento aos colégios com contratos de associação que se encontram na vizinhança de escolas públicas. Acho bem. Quando não concordamos com uma decisão política, só há uma coisa a fazer: todos para o Photoshop. Vamos mostrar quem tem razão, ilustra aí, retoca aqui, esta medida não é boa porque falta um "blur" ali, este argumento é refutável porque esta tonalidade não está visivelmente apelativa.

Ainda de acordo com a JSD, a paródia com Estaline serve de "alusão àquilo que é a nacionalização cega do ensino em Portugal que está em curso neste momento". Relembro que, na última legislatura, o Governo PSD/CDS fechou mais de 1300 escolas públicas. Se isto não são cortes cegos — e verdadeiramente consumados — no ensino em Portugal, não sei o que será. Princípios básicos de educação: escolha livre e oferta de escola pública suficiente e com qualidade. No primeiro princípio básico está implícito que essa escolha não pode, em qualquer circunstância, ser feita em prejuízo do segundo, nem com qualquer dano ao bolso do contribuinte. O Estado deve financiar colégios privados num caso muito específico: para que os alunos de uma determinada zona onde a escola pública não exista ou onde a oferta não seja satisfatória possam frequentar uma escola privada. O problema iniciou-se quando os governos anteriores, de várias cores políticas, à esquerda e à direita, se esqueceram dessa premissa. Baixaram-se verbas para a educação pública pré-escolar, básica, secundária, mas subiram-se certos montantes para o sector privado. O objectivo perverso disto? Criar uma renda — que não é legítima — para financiar escolas privadas e, aí sim, cair numa redundância de investimento que não complementa a oferta mas sustenta uma competitividade que não pode existir.

Não vamos todos concordar com o mesmo, há posições legítimas até contra os temas mais unânimes na sociedade. Mas os putos… os putos fazem cartazes.

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