Maduro fortificou Caracas para impedir tarde de protestos da oposição
Manifestação convocada pela oposição exige rapidez no processo de marcação de referendo à revogação do mandato do Presidente.
Milhares de pessoas estão esta quarta-feira nas ruas de Caracas em protesto contra o Governo, numa altura em que a Venezuela vive uma das suas piores crises económicas da história recente. Em clima de grande tensão, a polícia fechou parte do centro para impedir a manifestação convocada pela oposição, que exige a marcação de um referendo para revogar o mandato do Presidente.
O Governo de Nicolás Maduro tentou por todos os meios à sua disposição evitar que a marcha da oposição alcançasse a Praça Venezuela, em Caracas, onde está localizada o Conselho Nacional Eleitoral (CNE). Numerosos elementos da Guarda Nacional Bolivariana fizeram um perímetro de segurança para impedir a entrada dos manifestantes nas zonas do centro da capital. Foram encerradas 14 estações de metro, segundo a AFP, e várias carreiras de autocarros foram desactivadas. Se Caracas já era uma cidade paralisada, fruto da decisão do Governo de limitar a semana laboral a apenas dois dias para poupar electricidade, esta quarta-feira essa situação intensificou-se.
A Venezuela vive tempos tensos, em que se conjuga uma crise económica profunda com um confronto quase permanente entre Governo e oposição. Nos últimos dias, multiplicaram-se as manifestações de receio de que o ambiente se extremasse ainda mais e a violência regressasse ao país — uma repetição do cenário vivido durante vários meses de 2014 em que morreram mais de 40 pessoas em confrontos em todo o país.
Sem poderem chegar ao seu objectivo, milhares de pessoas concentraram-se nas ruas próximas do local. Em algumas ocasiões, os manifestantes tentaram romper os cordões de segurança, para logo de seguida serem dispersados pela polícia que usava gás lacrimogénio. Imagens nas redes sociais mostravam algumas pessoas com ferimentos ligeiros e houve notícia de algumas detenções.
José Alirio, um manifestante de 48 anos, disse à Reuters que era apoiante de Hugo Chávez, mas admitiu estar decepcionado com Maduro. “As padarias estão vazias. Estou perto de roubar. Este homem tem de consertar as coisas ou sair”, afirmou.
“Quando te roubam em Caracas não encontras um polícia, hoje estão todos nas ruas pelo medo de Maduro que peçamos ao CNE a verificação da nossa assinatura”, escreveu o líder oposicionista Henrique Capriles na rede social Twitter.
Ao fim de poucas horas, Capriles apelou aos manifestantes para regressarem a suas casas, para evitarem confrontos com a polícia. Segundo o El País, a maioria dos manifestantes acedeu ao pedido do líder opositor e adversário de Maduro nas eleições de 2013, embora tenham permanecido alguns grupos. Em várias outras cidades do país foram convocadas acções de protesto do género. "O que estamos a ver hoje em Caracas é o medo de Maduro face ao revogatório", disse o ex-candidato presidencial.
Nenhum dos lados quis arriscar uma escalada no confronto em curso. Maduro isolou o coração da capital, fazendo uso dos poderes extraordinários conferidos pelo estado de emergência económica em vigor, e Capriles deu por terminada a marcha ao fim de algumas horas.
A plataforma de oposição Mesa da Unidade Nacional (MUD) tem organizado várias acções de protesto para pressionar o CNE a acelerar a verificação das assinaturas recolhidas para que seja marcado um referendo à destituição de Maduro. A intenção da oposição é marcar o chamado referendo convocatório antes de 7 de Janeiro para que uma potencial vitória dos apoiantes da saída do Presidente obrigue à antecipação das eleições presidenciais.
O “oficialismo”, através da influência que possui junto do CNE, tem tentado atrasar o processo, que já por si só é longo e exigente. A oposição conseguiu recolher 1,8 milhões de assinaturas — que estão agora a ser verificadas pelo órgão eleitoral — para dar início à primeira etapa da marcação do referendo. É necessária ainda a presença de pelo menos 200 mil signatários para confirmarem o seu apoio à realização da consulta.
A última etapa requer a recolha de cerca de quatro milhões de assinaturas, correspondentes a 20% do eleitorado. Só depois de tudo isto, poderá ser marcado o referendo. As sondagens mostram que a maioria dos venezuelanos quer a saída de Maduro. Ao PÚBLICO, o politólogo Andrés Malamud dizia recentemente que seria “impossível” à oposição conseguir marcar o referendo em tempo útil.
A hipótese de um regresso aos confrontos violentos não está posta de lado. A oposição teme que o estado de emergência seja usado como justificação pelo Governo para uma resposta mais dura contra futuras manifestações. Os analistas coincidem em apontar as Forças Armadas como o factor determinante para o futuro político do país. Consciente disso, Capriles lançou na terça-feira um desafio aos militares: "Está a chegar a hora da verdade, de decidir se vocês estão com a Constituição ou com Maduro."