Cidadãos e associação de professores levam AO a tribunal

Acção judicial popular argumenta que a aplicação do Acordo Ortográfico exigiria um acto legislativo e não poderia ter sido imposta por uma Resolução do Conselho de Ministros.

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A Associação Nacional de Professores de Português (ANPROPORT) e vários membros do grupo do Facebook Cidadãos contra o “Acordo Ortográfico” de 1990 – um grupo público que conta actualmente com mais de 29 mil seguidores – intentaram uma acção judicial popular contra a norma administrativa que mandou aplicar o Acordo Ortográfico de 1990 (AO) ao Governo e organismos dele dependentes, incluindo as escolas públicas do 1.º ao 12.º ano.

A acção deu entrada esta quarta-feira no Supremo Tribunal Administrativo e tem como objectivo conseguir a declaração de ilegalidade e consequente revogação da Resolução do Conselho de Ministros n.º 8/2011, emitida pelo Governo de José Sócrates, que ordenou a aplicação do AO no Governo e na função pública a partir do início de 2012. Um diploma que “contém ilegalidades flagrantes”, alegam os proponentes da acção.

A Resolução de 2011 “foi o passo decisivo” para que se começasse a aplicar o AO, que até aí “ninguém usava”, observou ao PÚBLICO um dos autores da acção, o jurista Artur Magalhães Mateus. Ora, “mesmo que o AO90 fosse constitucional, e não é, aquilo que foi feito mediante esta Resolução”, defende, “só podia ter sido feito por acto legislativo”, ou seja, através de uma lei ou de um decreto-lei.

Este é um dos fundamentos da acção, que contesta também a legalidade do Segundo Protocolo Modificativo do AO. “O Acordo só entraria em vigor após a ratificação de todos os países, mas como isso não foi conseguido, pretendeu-se reduzir a três o número de ratificações necessárias, o que altera os pressupostos do Acordo originário, conduzindo à invalidade, quer deste, quer do Segundo Protocolo”, resume o jurista, que considera ainda que a imposição do AO viola o artigo 43.º da Constituição, onde se estipula que o Estado não pode programar a educação e a cultura segundo directrizes políticas.

Caberá agora ao tribunal notificar os réus da acção – o Estado português, representado pelo Ministério Público, o Conselho de Ministros (CM) e a Presidência do CM – e, decorrido o prazo para contestação, avaliar as alegações de ambas as partes e tomar uma decisão. Os autores do processo esperam que este seja “apreciado com celeridade”, de modo a “evitar o agravamento de situações de facto consumado inconstitucional”, como a aplicação do AO aos funcionários administrativos e às escolas públicas, que consideram “inconstitucionalíssima”.

Seja qual for a decisão na secção do Supremo Tribunal Administrativo (STA) no qual a acção deu entrada, esta será sempre passível de recurso para o pleno do STA, e eventualmente ainda para o Tribunal Constitucional.

Se no final do processo, a Resolução n.º 8/2011 vier de facto a ser revogada, o entendimento de Magalhães Mateus é que seria reposta a situação anterior àquele diploma, e que as escolas e a administração pública deveriam voltar a usar “a ortografia costumeira, estabilizada há mais de 70 anos”.

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